Colunistas / Causos & Lendas
Lobisomem de Serrinha

LOBI DE SERRINHA organiza fábrica de jegues para exportar aos chineses

Tarefa é árdua porque os chineses querem importar 1 milhão de jegues ao ano
06/09/2016 às 19:49
Fico chateado porque ainda tem quem zombe de nossa familia dos lobis achando uma coisa do outro mundo quando, na realidade, se não somos humanos por completo, e sim um misto de lobos com homens, daí o termo lobisomem, estamos completamente aculturados, aclimados no Brasil e em outras partes do mundo, e não sei porque essa surpresa com um ser visto em Portugal, num deserto (eu nem sabia que Portugal tem deserto) e disseram que era um lobi português e/ou que era um extraterrestre.

   Ora, não deveria ser assim, porque aqui na Serra eu mesmo sou querido de todos, morro no Pontilhão da Bomba, recentemente minha residência foi fotografada pelo Sr Uziel Lopes, as crianças têm o maior carinho comigo, quando vou a Barbearia de Soté aparar meus pelos distribuo balas para os meninos, compro minha farinha numa boa lá em Sêo Anselmo no Mercado Municipal, frequento a missa do bispo Assolari e na atual campanha política houve sugestões para que me candidatasse a prefeito entendendo que eu seria o novo, apesar dos meus 281 anos de idade, isso porque os nomes que disputam a gloriosa Prefeitura são antigos, um já foi prefeito duas vezes e o outro é filho de um ex-prefeito.

   Preferi ficar distante do pleito de forma direta embora meu voto será para o futuro vereador Chicão de Dona Dina porque como sou uma pessoa ligada a cultura, acho que ele tem boa proposta para a cidade e merece meu voto. Dona EsterLoura, minha esposa, creio que votará no Reizinho ou no Lailson, não vou me meter nessa história, ainda mais sabendo que Ícaro de Sêo Tolentino já teria pedido o seu voto.

   De forma que a vida segue, chove na Serra, o que é uma maravilha, e no último domingo fui homenageado com uma placa oferecida pela Associação Desportiva Sucatão, por meu apoio ao esporte.

   Nós, os lobi, estamos integrados as nossas comunidades, quer aqui na Serra, assim como os Lapões do Quijingue; os Colberzões da Feira; os Araujões do Coité; os Pinhões do Araci; os Valdemarzões da Pedra; os Cedrazões do Valente.

   Agora mesmo deveria ter ido a China na comitiva do Brasil Central, porém declinei o convite do nosso chanceler que apelidaram injustamente de Vampiro Montanha, uma vez que os chineses estão interessados numa importação de jegues e eu seria o empresário capaz de organizar a compra desses jericos por acá.

   Mas como não tinha ainda um lote de muitos muares e os chinas querem comprar 1 milhão de jegues/ano, releguei o convite para me preparar melhor, me organizar melhor, e aí, sim, com o beneplácito do nosso chanceler vampiresco, irei a Xangai para resolver essa parada.

   Agora mesmo arregimentei alguns farejadores de jegues na região para podermos comprar um lote de 100 mil jegues e está bastante dificil a empreitada porque jegue a gente até encontra, mais barato do que uma bicicleta velha, mas, não nessa quantidade que os chinas querem tá dificil.

   Os homens dos olhinhos puxados têm milhões de bocas pra comer e topam qualquer parada, comem cachorros, formigas, lagartos e jegue é um prato lá pra eles saborossisimo, daí a necessidade dessa importação.

   Então, estou arregimentando minhas forças empresariais aqui na Serra e com as associações dos empresários do Coité, da Pedra, do Ichu, do Lamarão, com esse objetivo e já tenho até uma área para armazenagem e embarque dos animais, desde que assim consiga tantos muares, certo de que o saudoso Benedito do Jegue já tinha dado fim a muitos deles com venda a Valter do Jegue lá de Itaobim, mas, tô lutando, tô me estruturando.

   ​Nesse interim, passo no Boteco do Teco para tomar uma gelada e por lá encontro com o velho amigo Pinguinha e comento a possibilidade dele ser o intermediário desse grande negócio, atuando nas terras da Barrocas e adjacências, e estabeleci uma cota inicial de 10 mil jegues para ele conseguir.

   - V.Exa. miou. Onde vou conseguir dez mil jegues na Barrocas se lá não tem 10 mil almas humanas, quando mais essa quantidade de jericos - advertiu.

   ​- Se vire meu caro. Se queres entrar no negócio, ganhar muito dinheiro, essa é a sua oportunidade.

   A essa altura a conversa estava sendo apreciada pelo empresário Alirio Vermelho, o qual ponderou: - Se V. Exa, com sua força política, conseguir um financimento no Desenbahia, coisa gorda, a gente pode montar uma fábrica de fazer jegues com inseminação artificial e se resolve a parada.

   Teco, que também apreciava a conversa, cochicou no meu ouvido: - O 'home' quer mamá no governo tomar um empréstimo alto e pagar pelo baixo, frisou.

   - Ou não pagar como fazem muitos - aquiesci.

   - Nada disso. Se assumo o compromisso de pagar eu pago, penhoro minhas terras no Cantinho como aval e pago - esclareceu Alirio, salientando, ainda, que melhor seria um capilé do BNDES, "que pode ser uma coisa mais volumosa".

   - Nesse caso - alertei - v quer exportar jegues usando dinheiro do governo com essa sua fábrica de jegues que ninguém sabe se dará certo.

   - O governo está aí pra isso. Para ajudar os empreendedores e se consigo implantar uma Fábrica de Produzir Jegues, a Faprojegue, e exportar 500.000 jericos anos, quiça 1 milhão como querem os chineses, a Serrinha vira notica mundial e ficaremos ricos.

   Conversa vai, conversa vem, a gelada correndo solta, a essa altura Pinguinha assando um pedaço de alcatra numa trempe, passa Sêo Dãozinho morador dos bairro dos Treze, depois da linha do trem, montando em sua carroça puxada por um jeguinho cor de areia, para em frente ao boteco pra comprar um litrão e o elemento estira sua ferramenta de uns 40 centimetros ou mais e verte água no meio-fio.

   - Ô Sêo Dãozinho, issso é lá lugar pra esse cara fazer xici, vai empestiar a nossa alcatra - reclamou Pinguinha.

   - Cê qué que faça o quê? Ah! peça a São Pedro pra chover que lava a rua. Tenho mais o que fazer. Vamos 'Alegria" deu partida na carroça.

   Alirio caiu foi na risada e disparou: - com uns 10 ou 20 'Alegrias" tesudos desses a gente conseguia rapidinho um bom lote de jeguinhos pros chinas.