Cultura

ROMANCE "A PSICÓLOGA", TF, CAP 21: BATOM SEX E O MARCENEIRO DO SÉC XXI

Retocou a minha boca com a ponta do dedo, encostou seu corpo no meu e face a face deu-me um beijo de leve na boca, se afastou um pouco olhando nos meus olhos, e perguntou se eu gostei
Tasso Franco , Salvador | 26/08/2025 às 08:59
P batom sex da madame Fonseca
Foto: Seramov
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O BATOM SEX E O MARCENEIRO DO SÉCULO XXI
  
 Passados duas noites do dia santo de Natal as meninas voltaram para Aracaju e daí seguiram para Abaís, uma praia no litoral de Estância com 20 km de extensão onde passariam o réveillon numa pousada a beira mar com direito a quinzena de férias, suponho, bancada pela intelectual, programada excursão a Mangue Seco, a famosa praia de Jandaira, na Bahia, onde foi filmada a novela “Tieta do Agreste” e nós (eu e Roque) seguimos no nosso querido e amado povoado da Serra dos Cardeais para curtir a virada do ano.

  Como não temos as queimas de fogos de artifícios que existem pelo mundo à fora, nem tio Damasceno solta aos céus os foguetões de São João, e não há bailes e furdunços de rua salvo um jogo de futebol entre veteranos cardealense mesclado com jovens promissores da pelota, seguido de uma farra em cervejas e espetinhos de carne, participamos do que nos reserva os fados, Roque atuando de beque e eu e dona Carmen integrando a turma de senhoras que prepare e serve as saladas, as coxinhas de galinha, os quibes e os espetinhos. 

  À noite, então, optamos por assistir a queima de fogos de Copacabana, Rio, que vemos pela televisão. E, claro, também brindamos a chegada do ano novo com um moscatel.

  Final de ano é sempre de muito trabalho para a contadora que sou, prática, não formada em escola de saber, para fechar o balanço da nossa empresa, escriturar o estoque, dá férias coletivas em janeiro que é um mês morto e todo mundo quer descansar ir para as praias e ou para os sítios, as vendas despencam e nós, também, nos organizamos para ir a Aracaju, brindados que fomos para uma semana paga pela Rede de Lojas Fonseca.

  Enquanto isso, fazemos um apanhado das nossas finanças, das nossas vidas do ano que passou lembrando aos leitores que somos cordeiros de Deus, acomodados, vivemos num povoado do sertão desprezados pelas autoridades e temos como nosso lema respeitar essas ditas pessoas, apoiar sempre os governos quer sejam de direita ou de esquerda, comunistas ou liberais, porque são todos iguais e tanto faz como tanto fez para nós.

  Estamos sempre ao lado do governo ainda que o governo não esteja conosco, quer seja militar ou civil, pouco importa, e o que vemos, hoje, é que temos um poder novo, dos togados, dos tribunais, e nós também apoiamos, embora nenhum desse togados tenha pisado seus pés em nosso povoado, nem o supremo em leis julgador de Pombaleiro a quem estamos subordinados perante a espada da Justiça nos visita. 

   Somos também a favor das bolsas de toda natureza à disposição dos pobres, eu e Roque não as temos porque somos classificados pelo SEBROV como pequenos empresários, micro empresários do Simples, e nós e os demais micros, médios ou macros só devemos trabalhar e pagar impostos, sempre mais impostos, sem reclamar, mas, nosso pessoal da labuta, os operários, todos têm bolsas familiares, bolsas escolares, bolsas alimentos, participam do Programa de Combate à Fome e recebem cestas básicas e nós achamos isso bom porque se assim não fosse haveria uma revolução. 

   Não que o povo fosse pegar em armas como no tempo de Antônio Conselheiro nem de Cipriano Barata, mas negar o voto, não ir às urnas no dia de teclar o voto naquela maquininha, e sem isso, sem o sufrágio universal eles não se sustentam no poder, daí que essa é uma mão dupla por isso é que o povo quanto mais bolsa tem, quando mais guarda chuva do governo em saúde, educação, em remédios na farmácia popular, as possui, quer sempre mais, e já teve no Pombaleiro uma passeata de mulheres querendo absorventes e lâminas para raspar sovacos e uma outra dos homens para que fossem fornecidas camisinhas para as rolas durante todo o ano e não somente na época do momo e dos festejos mais importantes da região como vaquejadas, torneiros de brigas de galo e canário, campeonatos de bola e outros quando as meninas ficam assanhadas e dão o xibio à larga angariando filhos que nem sempre são do desejo das famílias.

   Então, nós somos sempre a favor do regime e também contornamos as armadilhas que eles (as autoridades) impõem a nós e a gente não declara tudo em vendas com notas fiscais, isso não significa que sejamos sonegadores, nada disso, pois, a prática de vender uma mesa e quatro tamboretes na feira é esta, ninguém pede nota, e tudo aqui, em parte, funciona dessa forma, imagina se Sêo Djalma vai me fornecer uma nota fiscal de dois litros de farinho, se Dona Raquel vende uma franga ou um peru vivo na feira se vai emitir nota, se Dona Danda do beiju elabora nota, não tem nada disso e se governo quiser nos multar que rastrei os pix e as maquininhas amarelas de pagamento online ou as gavetas e bolsos dos feirantes.

  Vejam, portanto, os leitores, que nós temos o nosso mundo à parte e se um quilo de tomate orgânico na capital custa 10 reais aqui paga-se 3 reais, se um coco seco lá é 8 reais aqui é 2 reais, até a carne que o homem grande do Planalto prometeu na mesa de todos, inclusive picanha, a alcatra aqui custa 12 reais o quilo, a carne com osso é 6 reais, o milho verde é dez espigas por 5 reais, por isso que a gente vive numa boa, senão já tinha pipocado tudo. 

  Até um batizado, uma crisma, um pedido de missa é bem baratinho e o diácono, se a pessoa não tiver dinheiro pode pagar com uma galinha, um carneiro para a reforma da capela, nunca para sua pessoa, em si, então viramos o ano graça a Deus com essa fartura, com essa perspectiva de não sairmos do lugar, mas também sem morrer de fome, passando bem, porque os homens lá do poder não desejam evolução do povo, querem somente a manutenção, mas eu e Roque somos astutos e vamos crescendo sim, usando novas tecnologias e sonhando alto ainda que não desejamos mudar de local para viver.

   A gente também sabe que a vida deles é noutro mundo inatingível para nós, como o Alfa Six de Samuelina, porque esses dos tribunais, os políticos, os do governo ganham fortunas por dentro e por fora e recebem jetons e podem pagar 2 mil reais numa garrafa de vinho, 1 mil reais por pessoa numa degustação nos restaurantes chique, viajam pelo mundo, ficam nos hotéis mais caros, mas, isso não abalam suas finais e quando roubam como alguns que segundo o noticiário da TV Universo roubaram depois são soltos pelos togados e seguem no bom viver.

   Então, eu é que não vou falar mais nisso porque a gente sabe que a espada da Justiça só atinge a cabeça dos pequenos. Vou portanto arrumar minha mala para a viagem a AJU e desfrutar essa boca livre que nos ofereceram, a primeira desde que estou andando na terra e Roque, sempre desconfiado, como nossos jegues do Sertão, matreiro, diz que não existe almoço de graça sem que depois venha a conta, e ele lembra sempre do vereador Elpídio que dava uma cesta básica no Natal aos seus eleitores e colocava um cartão de “Feliz Natal e Próspero Ano Novo” e os dizeres complementares a caneta “contando sempre com seu voto” e uma assinatura só das iniciais como ferro de marcar boi EV, já conhecida do povo como Elpídio Vereador, mas que não dava margem a processo na Justiça, pois, indefinida, neutra. 

   A viagem:

   Na segunda quinzena de janeiro partimos num carro de linha que fazia a rota Terra do Sol-AJU uma cooperativa que opera também para Salvador levando passageiros em vans e tem ramificações em Senhora do Conselho, Pombaleiro, Simão Dias e outras localidades e fomos como combinado para a Pousada Brisa do Mar, na Atalaia, a merecido descanso. 

   Levei comigo coisa de pouca monta, o vestido sedutor bege, uma sandália rasteira, peças de baixo, bermuda, camisetas, tudo leve e Roque também fez o mesmo salvo engano só colocou na bagagem uma calça uma vez que iria a casa dos Fonseca e levou consigo o chapéu de pano brinde da Magu e eu aproveitei a oportunidade para levar o livro de Fernando Pessoa, um bom momento para lê-lo, distante das minhas preocupações com o trabalho o que poderia entendê-lo melhor.

   Na capital sergipana encontramos com a nossa querida Alicinha, a qual havia voltado de sua excursão a Mangue Seco e retornara a viver na pensão da senhora Alzira, na rua Belém, e fomos visita-la e conhecer essa adorável senhora, que nos recebeu muito bem e mostrou como tratava a nossa filha como se dela fosse. Ficamos encantados. 

  Daí seguimos para conhecer o shopping Mar Alto onde pretendia comprar um maiô e Roque ia adquirir uma sunga para nosso banho de mar, quiçá, também tomarmos um banho de piscina pois a pousada possuía uma com azulejos azuis e bordas com desenhos de peixes, e sem querer me intrometer na vida de Alicinha procurei saber por onde andava a Magu e ela respondeu com cara de poucos amigos que estava na casa dela e as noites de verão foram maravilhosas e ficaram na lembrança, o que entendi que não estavam mais tão juntas como pareciam estar, e mais não quis saber.

  Quero dizer que adorei o shopping, centro de compras que não conhecia, maior do que todo comércio da Serra dos Cardeais, com aquelas lojas de diferentes produtos todas reunidas num mesmo espaço onde era possível comprar uma televisão e ao mesmo tempo um secador de cabelos, um maiô como o que comprei, a sunga branca com frisos azuis para Roque, salão de beleza, restaurante, lanchonetes, lojinhas de celulares e aparelhos auditivos, sapatos, sandálias (também comprei uma de salto alto), livros, joias, uma maravilha, e fiquei pensando no Armarinho de dona Nilza que é uma espécie de nossa shopping onde há uma variedade enorme de linhas, bijuterias e outros produtos e neste dia almoçamos num restaurante de comida vendida a quilo, que já sabíamos que existia mas ainda não tínhamos oportunidade de conhecer e Roque ficou admirado e nos disse: - Vivi para comer meio quilo de comida - e caiu na risada com o prato em mãos contendo peixe frito, salada, arroz e feijão.

  Também como combinado, na sexta do final de semana, dois dias antes de retornarmos a Serra dos Cardeais e já termos visitado os pontos turísticos de AJU e adoramos demais o Mercado dos Artesãos, fomos ao jantar na casa dos Fonseca, em Atalia Nova, e um veiculo da empresa veio nos pegar e comparecemos com o melhor em traje, eu com meu vestido bege sensual, maquiagem discreta, colar de biju, a sandália alta que adquiri no shopping, e Roque com camisa social branca, calça azul, sapatos de couro, e fomos bem recebidos pelo casal numa casa de praia belíssima, grande, com jardim nos arredores, e conduzidos a uma varanda anexa a sala do jantar com mesa posta, donde se via o mar.

   A senhora Magali estava usando um vestido de alcinha com tom magenta, igualmente de scarpin caramelo, maquiagem rubra, colo à vista, e o senhor Romeu todo de branco dos pés a cabeça e com uma sandália igualmente branca que me pareceu mais adequada a uma mulher, parecendo um enfermeiro ou enfermeira e iniciamos nossa conversa falando do trivial, de negócios, das dificuldades e das alegrias do ano que passou, a essa altura uma senhora toda vestida de cozinheira com um barrete na cabeça a nos servir vinho em taças de vidro que, soube no decorrer da conversa serem de cristal, bem mais elegantes do que as nossas de plástico e fui anotando esses detalhes na minha cabeça para me civilizar.

   A conversa estava boa, animada, quando elogiei um quadro que havia na parede de um imenso cavalo e a madame convidou-me para ir vê-lo mais de perto e fomos olhar a pintura e ela disse ser obra do famoso Celsus, pintor das Alagoas, e aproveitou e foi me mostrando outras peças na sala, a mobília, os quadros menores, um jarro artesanal sobre o portal, e ia me dizendo que a casa era de praia não tinha muita coisa valiosa, era tudo simples, as mobílias dos quadros de vimes e andamos por um corredor e entramos no quarto do casal, cama forrada com colcha branca e dois imensos travesseiros, e adiante um banheiro conjugado ao quarto onde havia um imenso espelho e objetos de toucador, muitos pincéis e estojos de pintura e eu fui elogiando aquelas peças e ela disse que se eu quisesse retocar a maquiagem poderia usá-las e ela encostou de tal maneira em mim que senti seu perfume tentador e ela disse para eu não ficar acanhada e pegou um batom em tom vermelho, abriu a capsula e pediu para eu abrir a boca levemente e passou aquele batom em meus lábios e disse que eu estava linda, e eu fiquei a suspirar desconfiada, e ela veio e retocou a minha boca com a ponta do dedo, encostou seu corpo no meu e face a face deu-me um beijo de leve na boca, se afastou um pouco olhando nos meus olhos, e perguntou se eu gostei e eu fiquei calada com cara de consentimento e ela veio de novo e deu-me um beijo ardente e eu não tive outro jeito senão corresponder aquilo e enroscamos as nossas línguas, a essa altura ela me abraçando com força e eu a ela, e fomos andando agarradas até a cama onde nos jogamos, a essa altura já estamos sem os vestidos, os seios dela tocando nos meus num frenesi estonteante, e eu disse que o marido dela poderia aparecer no quarto e ela respondeu que isso não iria acontecer a porta esta fechada, e seguimos naquele idílio com muita intensidade, o gosto do vinho de seus lábios era especial, e fui cedendo os encantos e me soltando toda incorporando a serpente e quando dei conta de mim senti uma penetração no meu interior, um duro dentro de mim e ela pedindo para eu rebolar e eu peneirava como faço com Roque e foi uma loucura total e ela saiu de dentro de mim e percorreu meu corpo com sua língua e eu fiz o mesmo com ela e vi que a madame era trans como Magu e engoli aquilo formoso à minha vista com prazer, com gosto, adornando-o com minha língua de cima para baixo e vice versa.

  Depois, sublimes, tomamos uma ducha juntas no banheiro da maquiagem eu lavando a minha alma com aquela água que escorria da cabeça aos pés e ela também, juntas, nos cariciando como se já nos conhecêssemos a tempo e ela me enxugou com uma imensa toalha e eu a ela e nos vestimos, retocamos as nossas maquiagens e voltamos para a sala onde encontramos Romeu de roupão e uma sandália alta de mulher e Roque sem camisa deitado no sofá.

  Pigarreamos no corredor que dá acesso à sala e ao chegarmos na varanda-sala, Roque, calmamente vestiu sua camisa e Romeu foi trocar-se retornado com a roupa de enfermeira, creio, pois, seu sapatinho rosa não me enganava.

  Em instantes, na mesa, os dois casais a conversar o trivial, Romeu tocou uma sineta e a cozinheira apareceu numa porta lateral trazendo uma imensa travessa com salmão e nos serviu com arroz e salada. Fomos às taças e brindamos o ano novo.

  Nos despedimos com agradecimentos ao casal pela noite maravilhosa e o motorista da empresa nos levou de volta a pousada. 

  Eu e Roque, de mãos dadas no banco traseiro do veiculo a olhar as paisagens de AJU passando pelo vidro, a Atalaia, os bares que servem caranguejos, o correr da vida e suas mudanças e dei-me conta, que, finalmente, Roque era um marceneiro do século XXI.