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Carpinteiro Jair Souza de Freitas confeccionando "Judas" em Cachoeira
Foto: AC
(Por Alzira Costa)
A tradicional brincadeira da malhação do Judas no sábado de Aleluia é
mantida por moradores de Cachoeira, cidade histórica do Recôncavo
baiano (distante 110 km de Salvador). A festa mais antiga do Sábado de
Aleluia na cidade acontece há quase um século, no bairro dos Currais
Velhos. Este ano, a brincadeira que atrai pessoas de todas as idades
já está garantida por iniciativa de populares e da prefeitura
municipal, através da Secretaria de Cultura e Turismo. Como manda a
tradição, o boneco que simboliza Judas, o discípulo que traiu Jesus
Cristo, após a Santa Ceia, será queimado à meia noite em ponto, após
apresentação de bandas e de grupos de manifestações populares.
Para manter a tradição, o carpinteiro Jair Souza de Freitas (38),
semanas antes da festa, deixa os seus afazeres para se dedicar
exclusivamente à confecção dos bonecos que serão malhados também em
outros bairros e na zona rural. Jair é, atualmente, o único artesão
que se dedica à confecção de Judas em Cachoeira. Arte que aprendeu
ainda na adolescência, "por curiosidade" como ele mesmo conta. "Eu
ficava olhando o Judas que era queimado nas festas promovidas por um
velho conhecido pelo apelido de Poporrô. Quem confeccionava os bonecos
era o falecido Zute Fogueteiro". Jair lembra que o dono da festa não
queria que ele se aproximasse dos bonecos por causa dos perigos de
explosão dos fogos que são o recheio do corpo dos Judas.
Morador do bairro dos Currais Velhos e influenciado pela animação dos
vizinhos, não demorou, para o carpinteiro assumir a função de
confeccionar os bonecos simbolizando Judas para não deixar a tradição
morrer. "Eu costumo de dizer que, nos dias que antecedem a Semana
Santa, eu deixo de ser carpinteiro para virar fogueteiro", brinca
Jair, enquanto trabalha na confecção de um dos bonecos que terá que
entregar até sábado á tarde. O local de trabalho do artesão é um
velho depósito, a poucos metros da casa da família. É ali que constrói
os bonecos que vão provocar gargalhadas, suscitar pilhérias e explodir
em poucos segundos. Com o auxílio de um amigo mais velho pouco a
pouco os bonecos vão sendo montados.
Bonecos prontos
Quem ver os bonecos todos prontos, vestidos com calça comprida, camisa
de manga de tecido multicolorido e, às vezes até, com chapéu na
cabeça, nem imagina o trabalho que dá. Tudo é feito com muita precisão
e dedicação. A estrutura que sustenta os bonecos é feita de ripas de
madeira. Na parte do tronco é feita uma cavidade com tiras de papelão
entrelaçadas como se fossem as costelas. É nessa cavidade, que o
artesão coloca a maior parte dos fogos que vão explodir na hora da
festa. Tiras de caixotes utilizados para o transporte de maçãs também
são utilizados para formar a estrutura interna dos bonecos, que ganham
pés e mãos também de madeira. A cabeça, que é a última parte a
explodir, é confeccionada com pedaços de jornal e a técnica de papel
machê, depois é cuidadosamente pintada com cores vibrantes. "A cabeça
é oca para receber o artefato com maior potencial de detonação",
explica Jair.
O corpo de cada boneco é recheado em média com três quilos de fogos.
São traques, bombas, espadas, rojões, chuvinha e até apito gaiato. As
roupas são confeccionadas por uma costureira profissional. Depois de
pronto para ser queimado, os bonecos medem 1.70m de altura. Jair só
confecciona Judas por encomenda e os preços variam de R$ 350,00 até R$
650,00. "Os mais caros, geralmente são encomendados para festas
particulares e as pessoas que podem pagar e recomendam que bonecos
sejam recheados com uma grande quantidade de fogos e vestidos roupas
mais caras".
Os bonecos que surgem das mãos habilidosas de Jair Souza de Freitas
para alegrar as festas do Sábado de Aleluia, não explodem de uma única
vez. Os fogos da base dos bonecos, são em forma de círculo feito
com madeira e talos de bambu e, depois de acesos, fazem o boneco
girar.Aos poucos todos os artefatos vão explodindo para finalizar com
a queima da cabeça do Judas.