A escritora Zélia Gattai Amado, 91, viúva do também escritor Jorge Amado, morreu na tarde deste s'abado. A informação foi divulgada pelo filho João Jorge Amado, por volta das 17h, logo depois que chegou ao Hospital da Bahia, acompanhado de dois netos de Zélia.
O filho da escritora disse que sua mãe será cremada assim que o corpo for liberado, não esperando a chegada de alguns parentes que estão fora de Salvador. "Podemos esperar os familiares que não estão aqui para o momento do depósito das cinzas de minha mãe (Zélia) com as de meu pai (Jorge Amado) na Casa do Rio Vermelho", diz João Jorge.
A família já esperava a morte de Zélia, pois os médicos tinham informado desde sexta-feira que ela estava em estado terminal. Zélia estava internada desde o dia 16 de abril na Unidade de Terapia Intensiva do Hospital da Bahia para o tratamento de uma obstrução num trecho do intestino delgado.
O quadro clínico da escritora se agravou desde a última quinta-feira, quando seus rins começaram a trabalhar com dificuldade, com piora das funções hemodinâmicas, o que causou o quadro de choque circulatório, que é caracterizado por uma perda da pressão sangüínea do paciente que não pode ser controlada por medicação nem por aparelhos. Com isso, há uma diminuição da quantidade de sangue em circulação para manter o funcionamento dos órgãos.
Internações
Zélia Gattai vinha tendo problemas de saúde recorrentes nos últimos dois anos. Em outubro de 2006, ela foi internada por dez dias com insuficiência cardíaca e edema agudo pulmonar. Em janeiro de 2007, foi novamente internada, após sofrer uma queda em seu apartamento.
Em fevereiro do ano passado, foram oito dias no hospital, devido a uma embolia pulmonar. Em junho, duas internações: a primeira, por causa de uma inflamação do nervo intercostal, e a segunda, por hemorragia no aparelho digestivo. Em agosto de 2007, outra internação por hemorragia.
Em outubro, Zélia passou por uma cirurgia para implantação de um cateter no pulmão, para evitar o surgimento de coágulos sanguíneos.
Os primeiros anos
BIOGRAFIA
Filha dos imigrantes italianos Angelina e Ernesto Gattai, é a caçula de cinco irmãos. Nasceu e morou durante toda a infância na Alameda Santos, 8, no bairro Paraíso, em São Paulo.
Zélia participava, com a família, do movimento político-operário anarquista que tinha lugar entre os imigrantes italianos, espanhóis, portugueses, no início do século XX. Aos vinte anos, casou-se com Aldo Veiga. Deste casamento, que durou oito anos, teve um filho, Luís Carlos, nascido em São Paulo, em 1942.
Leitora entusiasta de Jorge Amado, Zélia Gattai o conheceu em 1945, quando trabalharam juntos no movimento pela anistia dos presos políticos. A união do casal deu-se poucos meses depois. A partir de então, Zélia Gattai trabalhou ao lado do marido, passando a limpo, à máquina, seus originais e o auxiliando no processo de revisão.
Em 1946, com a eleição de Jorge Amado para a Câmara Federal, o casal mudou-se para o Rio de Janeiro, onde nasceu o filho João Jorge, em 1947. Um ano depois, com o Partido Comunista declarado ilegal, Jorge Amado perdeu o mandato, e a família teve que se exilar.
Viveram em Paris por três anos, período em que Zélia Gattai fez os cursos de civilização francesa, fonética e língua francesa na Sorbonne. De 1950 a 1952, a família viveu na Checoslováquia, onde nasceu a filha Paloma. Foi neste tempo de exílio que Zélia Gattai começou a fazer fotografias, tornando-se responsável pelo registro, em imagens, de cada um dos momentos importantes da vida do escritor baiano.
Em 1963, mudou-se com a família para a casa do Rio Vermelho, em Salvador, na Bahia, onde tinha um laboratório e se dedicava à fotografia, tendo lançado a fotobiografia de Jorge Amado intitulada Reportagem incompleta.
Aos 63 anos de idade, começou a escrever suas memórias. O livro de estréia, Anarquistas, graças a Deus, ao completar vinte anos da primeira edição, já contava mais de duzentos mil exemplares vendidos no Brasil. Sua obra é composta de nove livros de memórias, três livros infantis, uma fotobiografia e um romance. Alguns de seus livros foram traduzidos para o francês, o italiano, o espanhol, o alemão e o russo.
Anarquistas, graças a Deus foi adaptado para minissérie pela Rede Globo e Um chapéu para viagem foi adaptado para o teatro.
Baiana por merecimento, Zélia Gattai recebeu em 1984 o título de Cidadã da Cidade do Salvador.
Na França, recebeu o título de Cidadã de Honra da comuna de Mirabeau (1985) e a Comenda des Arts et des Lettres, do governo francês (1998). Recebeu ainda, no grau de comendadora, as ordens do Mérito da Bahia (1994) e do Infante Dom Henrique (Portugal, 1986).
A prefeitura de Taperoá, no estado da Bahia, homenageou Zélia Gattai dando o nome da escritora à sua Fundação de Cultura e Turismo, em 2001.
Em 2001, foi eleita para a Academia Brasileira de Letras, para a cadeira 23, anteriormente ocupada por Jorge Amado, que teve Machado de Assis como primeiro ocupante e José de Alencar como patrono. No mesmo ano, foi eleita para a Academia de Letras da Bahia e para a Academia Ilheense de Letras. Em 2002, tomou posse nas três. É mãe de Luis Carlos, Paloma e João Jorge. É amiga de personalidades e gente simples. No lançamento do livro 'Jorge Amado: um baiano romântico e sensual, em 2002, em uma livraria de Salvador, estavam pessoas como Antonio Carlos Magalhães, Sossó, Calasans Neto, Miguel Arcanjo Prado, Auta Rosa, Bruna Lima, Antonio Imbassahy e James Amado, entre outros.
Ao lançar seu primeiro livro, Anarquistas graças a Deus, Zélia Gattai recebeu o Prêmio Paulista de Revelação Literária de 1979. No ano seguinte, recebeu o Prêmio da Associação de Imprensa, o Prêmio McKeen e o Troféu Dante Alighieri. A Secretaria de Educação do Estado da Bahia concedeu-lhe a Medalha Castro Alves, em 1987. Em 1988, recebeu o Troféu Avon, como destaque da área cultural e o Prêmio Destaque do Ano de 1988, pelo livro Jardim de inverno. O livro de memórias Chão de meninos recebeu o Prêmio Alejandro José Cabassa, da União Brasileira de Escritores, em 1994.