Política

PARTICIPAÇÃO ELEITOR ANALFABETO AINDA GERA POLÊMICA, p ROSANE SANTANA

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| 06/08/2012 às 22:24
Nas próximas eleiçoes, a maioria do eleitorado não tem 1º grau
Foto: DIV
Do total de 140.394.103 eleitores aptos a votar nas eleições municipais de outubro deste ano no Brasil, 51,35% são analfabetos ou não têm o curso fundamental. Outros 27,07% só concluíram o fundamental, 17,58% completaram o ensino médio e, apenas, 4,38% possuem curso superior. 

O maior contingente (44.834.433) é o de eleitores que não completou o ensino fundamental, seguido pelo de analfabetos e analfabetos funcionais, ou seja, que só leem e escrevem (26.549.155). Os dados foram divulgados pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Analfabetismo e baixa escolaridade entre eleitores brasileiros são fenômenos históricos. Em 1881, durante o Império, o conselheiro Antonio Saraiva foi convocado por D. Pedro II para realizar uma reforma eleitoral. A iniciativa, entre outros objetivos, visava impedir o voto dos analfabetos - maioria do eleitorado. Os ideólogos liberais e alguns conservadores da época atribuíam o caráter violento e fraudulento das eleições à participação dos iletrados.

Estes - alegavam aqueles - sofriam pressões do poder econômico dos proprietários rurais, os quais ofereciam benefícios em troca de voto. [...] O votante é por via de regra analfabeto [...] de político só sabe o seu voto, que ou pertence ao Sr. Fulano de tal por dever de dependência (algumas vezes também por gratidão), ou a quem lho paga por melhor preço, ou lhe dá um cavalo, ou roupa de ir votar à freguesia [...]", descreveu o deputado carioca Francisco Belisário, testemunha da época.

No Brasil Império, mais de 90% da população, quase toda ela analfabeta, vivia na zona rural sob o domínio dos grandes proprietários. Para garantir os votos necessários à escolha dos eleitores de segundo grau -o pleito era realizado em dois turnos- e influir na eleição de deputados e senadores, os senhores mantinham centenas de homens livres e pobres como agregados em suas fazendas.

Em troca de fidelidade eleitoral, ofereciam comida, roupa e proteção. No dia da eleição, confinados em currais e barracões, os votantes eram vigiados por capangas. Alguns proprietários dirigiam-se à igreja matriz, onde se desenrolavam as votações, acompanhados pelos "afilhados", como descreve o brasilianista Richard Graham, em "Clientelismo e Política no Brasil do Século XIX".

O alto custo dessa empreitada foi um dos motivos para a introdução do voto direto, em 1881. A reforma, que foi batizada com o nome de Lei Saraiva, após aprovação pela Câmara dos Deputados, além de introduzir o voto direto, tornou obrigatório o título de eleitor e proibiu a participação de analfabetos no pleito.

Os mais de um milhão de eleitores registrados, em 1870, foram reduzidos para 150 mil, número que chegou a 100 mil, em 1866, numa população de cerca de 14 milhões de habitantes. A medida mereceu o protesto de parlamentares como Joaquim Nabuco, mas perdurou até os anos 30 do século XX, durante todo o período da República Velha. Com as alterações introduzidas na legislação eleitoral no Brasil, na década de 30, os analfabetos voltaram a ter direito de voto.

A participação de analfabetos nas eleições brasileiras continua gerando polêmica até hoje. Num quadro onde analfabetismo e pobreza se confundem, alguns acreditam que esse grupo é mais facilmente manipulado por políticos inescrupulosos e mandatários no comando do Estado, através de programas assistenciais, como o Bolsa Família. Este chegou a ser considerado a maior máquina eleitoral de todos os tempos no Brasil pelo cientista político José Murilo de Carvalho.