Política

CARTA ABERTA DE MILITANTE EXIGE EXPLICAÇÕES DA SECRETÁRIA MURICI

Leia carta aberta de Felipe, na íntegra
| 24/12/2007 às 11:11
  Carta aberta ao Companheiro Serginho:
 
   No dia 18 de dezembro, soube, por meio de uma carta aberta, dos motivos da demissão do Superintendente Estadual do PROCON - BA, o advogado e mestre em direito Augusto Sérgio São Bernardo.

   Foi com perplexidade, tristeza e preocupação que soube da grave perda para o Governo Wagner e, sobretudo, para os movimentos sociais baianos.
 
   Segundo a Carta, assinada pelo próprio Serginho, a demissão é o ato final de um amplo processo de assédio moral, racismo institucional e autoritarismo que se estabeleceu nos interiores da Secretaria de Cidadania, Justiça e Direitos Humanos.

   O relato do Companheiro Sergio São Bernardo provocou em mim muita reflexão e, por isso, resolvi escrever essa carta de solidariedade e problematização.

   Conheci Serginho ainda quando ele, em Brasília, era Assessor de Relações Raciais do Partido dos Trabalhadores e estudante do Mestrado em Direito da UNB. Sei das suas formulações corajosas, da sua importância para a organização do Núcleo de Parlamentares Negros(as) do Partido e de sua permanente ação no sentido de fazer relacionar as demandas do movimento social com as estratégias da bancada do Partido.
   Em seguida, no ano de 2006, voltei a encontrar com o companheiro Sérgio São Bernardo quando li a sua ousada tese de mestrado discutindo a questão da identidade racial e o direito a diferença, um dos mais valorosos trabalhos sobre a questão racial e a filosofia do direito dos últimos anos na sociedade acadêmica no Brasil.

   Uma colaboração militante feita a partir de um ponto de vista negro revolucionário. No mesmo ano de 2006 estive com Serginho fazendo dois grandes processos de mobilização: 1) discutindo a questão da implantação da política de cotas na UEFS, 2) fazendo os debates da campanha do nosso candidato comum a Dep. Federal, Luiz Alberto. Nas duas oportunidades pude, mais uma vez, constatar a competência, a disciplina e a militância do Camarada Sérgio.

   Na campanha de Wagner para Governador ele era uma grande referência em várias áreas da discussão no PT, falava da questão racial, da segurança pública e dos direitos humanos.

   Em todo o tempo, Sergio era uma referência para o debate dessas questões em toda a campanha e, por isso, era natural que a sua militância, sua qualificada formação, o seu empenho na formulação da proposta do Governo e a sua aguerrida participação nas eleições proporcionais (na campanha de Luiz Alberto) e na majoritária (de Lula e de Wagner) faziam-nos crer que, certamente, ele iria ocupar um cargo no Governo. E

   m janeiro, foi anunciada a participação de Serginho como Superintendente do PROCON. O tempo passou e o que eu ouvia era sempre muito elogioso acerca do trabalho novo do PROCON Bahia. Ouvia falar da nova lógica de gestão, das viagens de Sérgio pelo estado apresentando a nova proposta, das reiteradas mudanças para ações preventivas e etc... para nós, tudo estava muito bem até o dia 11 quando fui informado (pela imprensa) da demissão.

   Durante todo esse período falei com Sérgio São Bernardo poucas vezes, no máximo trocamos uns cinco ou seis e-mails e uma ou duas ligações, não nos vimos entre janeiro e dezembro de 2007, mas, a distância acompanhava o êxito de suas ações.

   Tentei por algumas vezes convidá-lo para atividades na UEFS, mas, as tarefas do PROCON não lhe permitiram agenda e o convite ficou para outro momento. Nessa hora, em que me assusto com a notícia da demissão e com as graves denuncias que Sérgio São Bernardo enuncia não posso, como militante do movimento negro, como estudante, como militante do Partido dos Trabalhadores e mesmo como cidadão, furtar-me a algumas reflexões sobre esse famigerado episódio.

   Desde que soube do ocorrido tentei entrar em contato com inúmeras pessoas. Falei com companheiros de Partido, com parlamentares, com militantes do movimento social e mesmo com Secretários de Estado e integrantes do Governo e, de maneira unânime, ouvi falas assombradas com o ocorrido e preocupadas com o que isso representa.

   O Governo Wagner representou o sonho de muitas gerações. Foi o desejo reprimido da sociedade baiana por mudanças, por interlocução, por decência, por participação e por cidadania. Nos textos da campanha, nos sorrisos dos militantes, nas falas da propaganda de TV, enfim, na sociedade baiana, o que imperava era o desejo profundo de sepultar o carlismo e fazer nascer um novo jeito e cultura política no Estado. É para isso que o PT foi eleito e a equipe foi montada.

   Não conheço a Sr.ª Marília Muricy. Alguns amigos próximos falam muito bem dela, a vi apenas em duas ou três ocasiões e a ela fui apresentado num ato na Governadoria em certa feita, mas, nada de muito próximo.

   Recentemente a ouvi falar na abertura da Conferência Estadual de Cultura (um evento bonito mas cheio de gafes e imprecisões) e confesso que gostei da fala e da abordagem que ela fez, porém, nada mais que isso. O que sei sobre ela é que fora pinçada dos quadros da faculdade de Direito da UFBA e que tem alguma relação com o movimento de direitos humanos no Estado e, por isso, fora entendida como alguém capaz de colaborar com a luta política do Governo e construir uma política de justiça, cidadania e direitos humanos a altura dos desafios ora colocados.

   Assim, não posso sobre ela tecer grandes comentários apenas pedir-lhe esclarecimentos. Fico pensando no que pode estar acontecendo internamente no Governo para gerar essa "derrubada de lideranças por estilos diferentes".

   Sei que o PROCON vinha construindo o "estilo" que um Governo de Esquerda deveria ter. Vinha desenvolvendo ações compreendendo o sentido amplo dos direitos humanos, vinha articulando as políticas sociais de maneira intesetorial, vinha garantindo direitos e fortalecendo estratégias de emancipação. Cabe perguntar qual é o "estilo" de Governo que "destoa".

   O Movimento Negro baiano, e, em especial, os militantes negros(as) do PT e do Governo precisam pensar muito sobre esse episódio.
 
   É preciso denunciar que perdemos um parceiro no Governo, que perdemos um canal de interlocução, que perdemos um companheiro cuja visão de mundo se confunde com o acúmulo de uma juventude negra comprometida com seus valores e práticas ancestrais.
 
   Com a saída de Sérgio, o Governo da Bahia perde um militante radical, sempre coerente com as suas posições, com um promissor futuro acadêmico e com valorosa contribuição para o movimento e para o Partido.

   O que está colocado nesse momento, mais do que encontrar culpados, é refletir as conseqüência e avaliar que é preciso dar um basta nesse processo, antes que ele tome proporções maiores. Se permitirmos que, impunemente, representantes tão valorosos da nossa luta saiam do Governo, acabaremos derrotados em todos os nossos projetos de libertação.

   O Governador, o Secretário de Relações Institucionais, bem como a Secretária de Cidadania, Justiça e Direitos Humanos, precisam vir à público apresentarem a sua versão dos fatos.

  Tratam-se de denúncias graves e que atentam contra aquilo que o PT formulou historicamente. Espero, com o mais sincero e profundo do meu coração, que haja nisso tudo algum ganho profundo para o PT, o Governo e o movimento social baiano. Não posso sucumbir à descrença, à loucura ou ao ceticismo.

   Continuo a acreditar na luta, na vida, nas pessoas e nos projetos e reafirmo as minhas convicções de que é possível fazer um Governo diferente, mas tenho certeza de que é preciso mudar. É preciso rever formas e concepções e, para isso, não podemos permitir baixas tão significativas em nosso, já tão pequeno, pelotão de lutas. Temos que resguardar os que são da militância.
 
  Desejo ao companheiro Sérgio todo o axé nesse momento. Espero que o debate do PT e do Governo sejam qualificados e, desde já, anuncio a minha total disposição para fazer, se necessário for, o debate na defesa daquilo pelo qual eu, Serginho e todos nós militantes negros sempre lutamos. Sei que o companheiro Sérgio não precisa de apoio ou de abrigo.

  É competente, não está no Governo por cabide de emprego e nem tão pouco precisa de procuradores e/ou advogados, pois sabe sozinho se defender. A nós, que acreditamos na luta, resta a pressão e a espera por respostas convincentes pois só é escravo quem tem medo de morrer!    

    Atenciosamente, Felipe da Silva Freitas Militante do Núcleo de Estudantes Negras e Negros da UEFS, voluntário da Cáritas Arquidiocesana e filiado ao Diretório Municipal do PT de Feira de Santana