Cultura

A MORTE LENTA DA CEPLAC E AS LEMBRANÇAS DO PASSADO, por WALMIR ROSÁRIO

Walmir Rosário é radialista, jornalista e advogado
Walmir Rosário , Bahia | 18/09/2025 às 10:42
Escritório da Ceplac em Canavieiras
Foto: Walmir Rosário
  A tradição brasileira não recomenda a longevidade das instituições nacionais, mesmo que tenham uma gama de serviços prestados, devidamente comprovados, a exemplo da vetusta Ceplac. Convenhamos
que comemorar 68 anos de existência é um feito um tanto, se ainda dispusesse do vigor de tempos pretéritos, quando exibia suas qualidades na área científica – pesquisa, extensão e ensino –, notadamente da cultura cacaueira.

  O peso de anos é visto a olhos nus. Sua sede regional no sul da Bahia ainda ostenta as enormes construções de concreto aparente, um pouco carcomidas, é claro, mas com muitas histórias para contar. Ali está sediado o outrora maior centro de pesquisas de cacau do mundo, repleto de cientistas, pesquisadores de especialidades variadas, extensionistas, educadores, administradores, biólogos, engenheiros florestais,
economistas, sociólogos, a elite regional.

  A cada ano, em 20 de fevereiro, o aniversário era comemorado com festejos mil para exaltar o cumprimento das metas e o planejamento das próximas. A velha e decadente lavoura se tornou sadia, produtiva e batia seguidamente recordes de produção e produtividade. Neste período, a cacauicultura ganhou novas tecnologias e a região cacaueira da Bahia viveu a transição para o desenvolvimento.

  Em cada cidade um escritório local, com engenheiros agrônomos e técnicos agrícolas estimulando e transferindo tecnologia, uma revenda de insumos agrícolas, enfim, toda uma estrutura administrativa. Em
determinados pontos estratégicos foram implantadas as Emarcs (Escola Média de Agricultura da Região Cacaueira), além de estações experimentais, que cuidavam do acompanhamento das pesquisas.

  Em seguida, o pujante órgão do cacau (como era chamado), assumiu parte do desenvolvimento regional, construindo o porto de Ilhéus, melhorando estradas vicinais, ampliando e implantação energia elétrica, telefonia, construindo escolas. Tornou-se um Estado dentro do Estado, este, o ente federativo, proporcionando uma visível melhoria na qualidade de vida da população como um todo e não apenas dos proprietários e trabalhadores da atividade cacaueira.

  Até então a Ceplac – por incrível que pareça – era um órgão do Ministério da Fazenda. Com o passar dos anos e dos governos, a instituição cacaueira foi atrelada ao Ministério da Agricultura e teve que se adequar à nova realidade. Já deixara a condição de um órgão criado para a recomposição de dívidas dos cacauicultores e recuperação da lavoura para gerir apenas a pesquisa, extensão rural e ensino técnico.

Semanas atrás, numa crônica, publiquei a ação de grupos sem-terra que invadiram a Estação Experimental Lemos Maia, em Una, e outras duas (Joaquim Baiana, em Itajuípe, e a do Extremo Sul, em Itabela) já tinham sofrido esse dano. De quando em vez recebo telefonemas e mensagens de ceplaqueanos e pessoas de várias cidades reclamando do abandono do patrimônio da Ceplac.

  As mais recentes foram do Escritório Local de Santa Luzia (Bahia) e de Jaru (Rondônia). Num vídeo à disposição na internet, o vereador de Jaru, Chiquinho do Cacau, mostra o prédio abandonado, cheio de lixo e mato, totalmente abandonado. E ele conclama a sociedade para que defenda a instituição, que foi e ainda pode ser muito importante para a economia de Rondônia.

  Na publicação o vereador Chiquinho do Cacau, pergunta: “O que queremos para a Ceplac?”. E Ele mesmo cita a grande riqueza gerada pela Ceplac na área de pesquisa e extensão, ressaltando o seu patrimônio humano. “A Ceplac precisa de ajuda para continuar trabalhando, apresentando resultados, mas o que vemos é uma falta de respeito ao produtor rural”, reclama.

Um dos exemplos do abandono dos escritórios locais – fechados por falta de pessoal – podia ser visto em Itabuna. O prédio que abrigava a divisão regional e a extensão local, uma verdadeira obra de arte da arquitetura, ficou abandonado por muitos anos. Agora passa por obras, e pelo que soube, será cedido à Prefeitura de Itabuna. Antes estava sendo ocupado por viciados.

  O de Canavieiras, há mais de 10 anos teria o mesmo destino, repassado à Prefeitura. Não sei o motivo dos empecilhos, o certo é que a cessão deu errado. Atendendo ao pedido do prefeito Almir Melo, elaborei um
memorial sobre a péssima situação do prédio, relatando a situação com testemunho fotográfico, mas a Superintendência de Patrimônio da União não chegou a concretizar a transferência.

  Agora, em setembro deste ano da graça de 2025, o prédio tem outro pretendente. Desta vez o candidato é o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), mas que até agora não recebeu
as chaves, apesar de ser, também, uma instituição do governo federal. Quais os empecilhos apresentados não se tem o menor conhecimento. E a situação do prédio se agrava ainda mais.

A realidade é que não existem mais no antigo prédio da Divisão Regional e scritório Local da Ceplac, em Canavieiras, sequer um engenheiro agrônomo, um técnico em agropecuária, um escriturário para atender aos agricultores. O prédio só não se encontra com as portas fechadas, pois um único remanescente da área operacional aguarda apenas o dia da tão sonhada aposentadoria para entregar as chaves.

Esses prédios se apresentam como fortes candidatos à destruição física pelo envelhecimento e à invasão, devido à atávica imobilidade dos órgãos do governo federal. Como diz o velho e corriqueiro ditado: “Faça por ti que eu te ajudarei”. Antes de pedir Deus na causa é preciso uma forcinha por parte dos órgãos e administradores da União.