Política

PROJETOS urbanos municipais são criticados por vereadores de oposição

Os oposicionistas alegam que há pouco debate e há setores sem serem ouvidos nas audiências públicas
Limiro Besnosik , da redação em Salvador | 26/10/2015 às 22:30
Planos objetivam projetar Salvador para os próximos anos
Foto: LB

O Centro de Cultura da Câmara Municipal foi palco para a 14ª e última audiência pública para debater os planos Salvador 500, Diretor de Desenvolvimento Urbano (PDDU) e Lei de Ordenamento do Uso e da Ocupação do Solo (Louos), na manhã desta segunda-feira, 26. Os vereadores Sílvio Humberto (PSB), Kiki Bispo (PDT) e Hilton Coelho (PSOL) participaram do debate.

A expectativa é que o texto do Executivo seja enviado para apreciação da Casa Legislativa ainda este ano. Na opinião do pedetista Kiki o processo foi construído de forma correta: “Desde o início vi uma preocupação em vencer todas as formalidades desse debate. Houve uma ampla discussão e um cuidado de incorporar as sugestões que surgiram ao longo do caminho. A Câmara Municipal também se prepara, quando receber o projeto de lei, para iniciar uma nova série de audiências públicas e novos debates. Do jeito que o processo está sendo conduzido, no dia da votação, ele estará devidamente instruído”.

Mais debate

Hilton Coelho questionou o tempo de discussão do projeto e se opôs ao encerramento das audiências públicas: “Está muito evidente que ainda há uma necessidade grande de aprofundamento de debate. As audiências precisam continuar, pois existe muita polêmica em torno da minuta do projeto de lei. Nas cidades em que se elaborou o PDDU, o processo levou dois anos para ser finalizado. Em Salvador, iniciamos as discussões no final de 2014 e já se quer concluir”.

Sílvio Humberto destacou que a sua escuta é dos movimentos sociais e que estes têm reclamado muito do processo de construção do PDDU que julgam ser apressado. O movimento negro também tem afirmado que o Plano é segregacionista: “Enquanto os gestores não vislumbrarem os problemas, não vão resolvê-los. Essa é uma visão equivocada quando se discute ações afirmativas. Em outras palavras, para quê a prefeitura mantém uma Secretaria de Reparação Racial se ela acha que num momento como este não deve discutir a cidade levando em consideração a raça?”.

O socialista citou o estudo da professora Inaiá Carvalho, “Como anda Salvador”, cuja conclusão é que na capital baiana os brancos ocupam a orla e os negros o miolo da cidade. “Devemos desconsiderar isso quando pensamos no PDDU?”, perguntou.

Carta de princípios

O secretário municipal de Urbanismo, Sílvio Pinheiro, saiu em defesa do Município. Segundo ele a prefeitura não divide a cidade e a trata como um todo buscando pensá-la na totalidade. Ele rebateu ainda críticas sobre a pouca que estaria sendo dada ao Centro Histórico, pois na etapa Visão do Futuro existem capítulos sobre a área.

Ele destacou também que quando a prefeitura considera criar um centro administrativo no local, pensa em “levar vida” para o Centro: “O Plano Diretor é uma carta de princípios onde vamos definir metas e diretrizes de como será tratada a ocupação do Centro Histórico como um todo e não casos específicos”.

Participaram também da audiência os vereadores Cláudio Tinoco (DEM) e Gilmar Santiago (PT) e representantes de bairros, estudantes e cidadãos. Fizeram parte da mesa, o secretário Sílvio; o subsecretário da Sucom, Sérgio Guanabara; o subsecretário da Cidade Sustentável (Secis), José Saraiva; os urbanistas da Sucom, Fernando Teixeira e Juliana Paes; e a presidente da Fundação Mário Leal Ferreira (FMLF), Tânia Scofield.

Segregacionista e racista

Para os edis petistas a proposta da Prefeitura para o PDDU é segregadora e racista. “Este Plano incide nos mesmos erros do anterior, que foi objeto de investigação, não dialoga com as camadas mais pobres da cidade, preocupando-se muito mais com áreas em crescente ocupação imobiliária como a região da Paralela e não toca no quesito raça e cor”, acusa Gilmar.

Em sua opinião a audiência pública realizada sábado, 24, na sede da Federação das Indústrias (FIEB), foi “totalmente despropositada”, pois aconteceu na mesma data do Enem inviabilizando a participação de muita gente.

“Se o objetivo era ampliar os debates em torno da questão, não sei se conseguiram. As famílias estavam acompanhando os filhos nas provas e até mesmo muitos pais e mães estavam participando. É o atestado de que a gestão ACM Neto montou um grande teatro para dizer que está cumprindo a legislação. É a prova cabal de que o prefeito de Salvador não tem o mínimo interesse na participação da população e nem em aprofundar a discussão sobre a cidade que a maioria dos soteropolitanos quer”, disse.

Os encontros estão sendo feitos, aponta, apenas “para cumprir tabela”, pois os anteriores já foram esvaziadas, mesmo contando com a presença majoritária de ocupantes de cargos comissionados das secretarias municipais.

Para Vânia Galvão (PT) é impossível analisar um Plano Diretor que não trata de questões raciais e exclui segmentos sociais do processo de crescimento econômico: “Esses aspectos são indicadores de desenvolvimento, sem a inclusão desses segmentos continuamos reproduzindo modelos segregativos de organização que até hoje predominam em nossa cidade e que inviabilizam a consolidação de uma dinâmica urbana mais justa”.

Sem voz

Na análise da socióloga Vilma Reis, militante do Movimento das Mulheres Negras, das quase 600 páginas que compõem o Plano, apenas três parágrafos tocam na questão racial: “Em uma cidade que tem 80% da população de negros, com maioria concentrada nas regiões periféricas, merecemos mais atenção, principalmente ações que promovam o crescimento econômico dessa camada populacional”.

De acordo com a ativista as inserções de movimentos negro e sociais não foram contempladas nas atas das audiências: “Tentamos intervir em todas as discussões propostas, mas nunca víamos nossas considerações nas atas”, frisa. “Aliás, constam nas atas apenas as inserções dos grupos sociais que compactuam com a mesma ideia do Município”.

Na visão de Maura Cristina da Silva, integrante do Movimento dos Sem-Teto da Bahia (MSTB), o Plano não considera as necessidades dessa população. Somente no Centro Histórico há um levantamento de cerca de 1500 imóveis desocupados, mas não se define quantos deles são destinados a projetos habitacionais para os sem-teto.

“Pior que isso, há projetos no PDDU para retirada de moradores de locais como o Dois de Julho e das ladeiras da Conceição e da Preguiça, onde recentemente guardas municipais agrediram cidadãos”, observa. Ela afirma que o MSTB entregou documento ao Município contendo carta de indignação e 18 itens que expressam as demandas do grupo, incluindo aspectos paisagísticos e culturais: “As mudanças são fundamentais ao desenvolvimento, e nós queremos também estar inseridos nesse processo, e não continuarmos à margem”.