Colunistas / Crônicas de Copacabana
Nara Franco

PIRENÓPOLIS, CORAÇÃO DO GOIAS

Fundada em 1727 com o nome de Meia Ponte, Pirenópolis surgiu em pleno ciclo do ouro, encravada entre montanhas no coração de Goiás (ou “do Goiás”
29/07/2025 às 10:30
Ao chegar em Pirenópolis, confesso: me bateu uma ponta de decepção. A viagem foi longa, feita à noite (o que não recomendo), com direito a percalços e uma boa perdida pelo caminho (com boa parte sem sinal de internet). Na minha cabeça, havia a imagem lúdica de uma cidadezinha congelada no tempo, quase de novela. Mas ao cruzar o pórtico de entrada, me deparei com uma avenida principal comum, cheia de mercados, lojas de construção, bares e restaurantes sem muita identidade. O impacto visual destoava da fantasia.

Mas bastou chegar ao Centro Histórico para tudo mudar. Como num passe de mágica, fui transportada para um Brasil de séculos atrás. Fundada em 1727 com o nome de Meia Ponte, Pirenópolis surgiu em pleno ciclo do ouro, encravada entre montanhas no coração de Goiás (ou “do Goiás”, como dizem por aqui). Com o Centro Histórico tombado pelo IPHAN desde 1989, o conjunto de casarões coloniais, ruas de pedra e igrejas barrocas lembra Ouro Preto ou mesmo as ladeiras do Pelourinho. Um charme encantador — ainda que cheio de carros.

Dica nº 1: chegue durante o dia. À noite, você perde o impacto visual do centro. A paisagem urbana ganha vida com a luz do sol, e o cenário colonial fica ainda mais bonito.

Antes de qualquer coisa, escolha que tipo de viagem você quer fazer em Piri (para os íntimos).

Gosta de natureza? A cidade tem mais de 80 cachoeiras, trilhas e passeios ecológicos.

Curte história? A Igreja Matriz de Nossa Senhora do Rosário, construída no século XVIII, é parada obrigatória.

É fã de comida boa? A culinária goiana está por todos os cantos: arroz com pequi, carne de lata, doces em compota, pamonha, empadão e uma infinidade de cachaças artesanais.

Aventura com propósito: a trilha da Cachoeira dos Dragões
Fiquei com espírito aventureiro — e escolhi me hospedar no centro para evitar o uso do carro dentro da cidade (estacionar por ali é um desafio, especialmente aos fins de semana).

No sábado, parti cedo para a Cachoeira dos Dragões, localizada dentro do Mosteiro Zen Eisho-ji, um refúgio espiritual em meio ao cerrado, a cerca de 35 km do centro (boa parte por estrada de terra, em média 50 minutos de carro).

A trilha tem cerca de 4 km (ida e volta) e passa por oito quedas d’água de águas geladas e cristalinas. Cada cachoeira tem um nome e uma atmosfera própria: Laje, Lua, Meditação... A trilha é cercada por bromélias, orquídeas silvestres, árvores altas e o som constante da mata viva. Nada de barulho, vendedores ou estrutura turística — o silêncio e a natureza dominam.

 Dicas práticas:

Ingresso: R$ 70 (em dinheiro ou Pix).

Horário de entrada: até 14h.

O que levar: água, lanche leve, tênis confortável, roupa de banho por baixo.

Infraestrutura: banheiro simples e uma pequena lanchonete com açaí, água e sorvete.

Restrições: proibido som alto e bebidas alcoólicas.

Atenção: em dias de chuva, a trilha pode ser suspensa. Vá cedo e consulte as condições do tempo.

O percurso exige um certo preparo físico — são subidas e descidas no calor seco do cerrado —, mas a recompensa são paisagens que tiram o fôlego. Em julho, época de seca, as quedas são menores, mas continuam lindas. O contraste das pedras com as águas geladas e o silêncio do mosteiro criam uma experiência quase mística.

Dia seguinte: banho e calmaria na Usina Velha
No domingo, com o corpo ainda reclamando da trilha, optei por um passeio mais leve: a Cachoeira da Usina Velha, a apenas 4 km do centro de Pirenópolis.

O nome vem de uma usina hidrelétrica construída nos anos 1930, hoje desativada. As ruínas ainda estão lá, misturando nostalgia e natureza. O local é formado por duas quedas principais, com poços ideais para banho. Uma mais tranquila, boa para crianças e quem quer relaxar. A outra, mais forte, agrada os corajosos que gostam de se jogar na água.

 Serviço:

Acesso: estrada de terra curta e boa.

Ingresso: entre R$ 25 e R$ 30.

Trilha: curta, bem sinalizada, fácil.

Perfil: ideal para famílias, idosos e quem busca sossego.

Mesmo sendo um ponto popular, a Usina Velha ainda mantém um clima tranquilo, especialmente pela manhã. Dá para sentar numa pedra, fazer um lanche e simplesmente observar o tempo passar.

Entre o barulho dos bares e o silêncio das trilhas
À noite, as ruas do centro são fechadas para carros, e turistas circulam entre lojinhas de artesanato (lindo, mas caro), restaurantes, bares e cafeterias. Há de tudo: churrasco, bacalhau, comida japonesa, bar de jazz e sertanejo. Eu fui na culinária local e finalizei com um picolé de frutas do cerrado, refrescante e delicioso.

Um tesouro a poucas horas de Brasília
De volta a Brasília, entendi que Pirenópolis é o quintal cultural do Centro-Oeste. Uma cidade viva, com infraestrutura turística, boa gastronomia, natureza preservada e personalidade forte. Recomendo reserva antecipada em feriados ou datas festivas, pois a procura é alta.

E antes de ir embora, tire uma foto com o personagem mais emblemático da cidade: o Mascarado da Cavalhada.

Ele é a alma folclórica da Festa do Divino Espírito Santo, realizada entre maio e junho. Durante o evento, cavaleiros encenam batalhas medievais entre mouros e cristãos, enquanto o Mascarado — com sua máscara de couro e chifres — circula entre os espectadores, fazendo graça, provocando e mantendo viva uma tradição com mais de 200 anos. Não por acaso, ele virou símbolo de Pirenópolis, estampando camisetas, grafites e lembranças por toda a cidade.