Um desastre ambiental resultante do despejo, na madrugada de 22 de junho de 2006, de um composto de produtos químicos de alto poder tóxico nas proximidades da Estrada das Cascalheiras (BA-522), no município de Camaçari, que provocou a contaminação do meio ambiente e a intoxicação de diversas pessoas, foi finalmente esclarecido.
Em uma ação civil pública ambiental ajuizada na última segunda-feira, dia 28, pelo promotor de Justiça Luciano Pitta, o Ministério Público do Estado da Bahia aponta as empresas Nufarm Indústria Química e Farmacêutica, Cetrel S/A e Litoral Limpeza Industrial Ltda. como responsáveis pelo dano ambiental. A conclusão se deu após quatro anos de investigação e baseia-se em farta documentação constante do Inquérito Civil nº 027/2006, instaurado pelo promotor de Justiça para apurar a extensão dos danos ambientais provocados pelo descarte ilegal e descobrir a autoria do crime, até então desconhecida.
Tendo por base a análise das substâncias encontradas, apontadas pela própria Cetrel S/A em um relatório técnico, dentre as quais compostos orgânicos voláteis e principalmente pesticidas, a investigação ministerial teve por alvo primordial tanto as empresas de transporte de resíduos químicos, quanto as prestadoras de serviço de lavagem de caminhões-tanque, informa o promotor de Justiça.
Em um documento dirigido ao antigo CRA (hoje Instituto do Meio Ambiente - IMA), a Cetrel S/A apresentou informações que, de acordo com Luciano Pitta, tiveram grande importância para a investigação. Segundo informou, a Cetrel firmou contrato com a Agripec Química e Farmacêutica (atual Nufarm), empresa com sede na cidade de Maracanaú, no Ceará, prevendo a incineração de 94 toneladas de resíduos classe 1, que foram transportados para a Cetrel S/A com a devida autorização legal em novembro de 2005.
História
Em 14 de junho de 2006, a Cetrel contratou a empresa Litoral Limpeza Industrial para realizar o transporte interno de parte daqueles resíduos, que ainda permanecia em sua área de estocagem, a fim de conduzi-los de sua área de armazenagem, localizada na Via Atlântica, ao incinerador situado na Rua Oxigênio. Entretanto, em julho de 2006, ao efetuar conferência em seu sistema, a Cetrel teria identificado uma diferença no peso da carga transferida pela transportadora. O sistema, no dia 21 de junho de 2006, teria acusado que o caminhão deixou de entregar 3.040 kg do resíduo transportado. A empresa acusa, então, a transportadora Litoral de possivelmente ter promovido o descarte do remanescente em local inapropriado.
A Litoral Limpeza Industrial, por sua vez, explica o promotor de Justiça, apresentou versão diversa da manifestada pela Cetrel, informando que já trabalha para a empresa há 11 anos e que o caminhão chega na Cetrel no início da manhã limpo, efetua o transporte de resíduos durante o dia e sai da empresa contratada limpo. O representante da empresa afirmou também que, no dia 21 de junho de 2006, foram feitas duas viagens para transporte de resíduos; que na própria Cetrel informaram que a balança da empresa estava com defeito (informação que inicialmente foi confirmada pela Cetrel); e que, naquele dia, o procedimento de lavagem realizado na Cetrel não foi efetuado de forma adequada. Em resposta ao MP, a Cetrel posteriormente informou que não houve nenhum defeito na balança em 2006, uma vez que ela foi submetida a manutenção preventiva, conforme consta em documentos no bojo no inquérito civil.
Segundo o promotor de Justiça Luciano Pitta, durante toda a instrução do inquérito civil, houve "a estranha coexistência de versões diametralmente opostas ao mesmo e único fato (o descarte clandestino), eis que, de um lado, a empresa Cetrel S/A 'jogava' a culpa na empresa Litoral Limpeza Industrial Ltda, a qual, por sua vez, 'empurrava-a' de volta", o que deixava claro que elas queriam a todo custo eximir-se da responsabilidade ambiental. Considerando também que a responsabilidade do fabricante de agrotóxicos e seus componentes é solidária quanto à destinação final tanto dos restos do seu processo industrial, quanto das embalagens, bem como em relação à inutilização, o Ministério Público evidencia que os resíduos transportados (compostos de pesticidas à base de organofosforados) pela empresa Litoral Limpeza Industrial, contratada pela Cetrel, eram provenientes da empresa Agripec, entidade geradora.
Diante das constatações, o MP requer que as três empresas sejam condenadas a reparar integralmente e de forma solidária os danos ambientais decorrentes do derramamento de resíduos tóxicos na Via Cascalheira, restituindo as áreas que tenham sofrido degradações e indenizando os respectivos danos, e a adotar as medidas compensatórias a serem definidas pelo órgão técnico do Ministério Público, ou em perícia judicial, em face dos danos considerados irrecuperáveis. Pede ainda que sejam realizadas análises físico-químicas das águas do Rio Capivara Grande e seus afluentes, córregos locais e águas subterrâneas, onde foram descartados os produtos químicos, e que seja feito um levantamento das consequências da deposição das substâncias químicas junto aos cursos d'água atingidos e às populações ribeirinhas, inclusive os danos à saúde ocasionados pelo consumo de água por pessoas, animais e para irrigação.