"O artigo 145 do ECA diz que o Judiciário tem a competência de estabelecer a proporcionalidade do número de varas exclusivas da infância e da juventude por número de habitantes. Dezoito anos após a promulgação do Estatuto, porém, nenhum Tribunal de Justiça do Brasil regulamentou os critérios para a criação de varas - fundamentais para agilizar a responsabilização de agressores, garantir a proteção da vítima e minimizar a revitimização de meninos e meninas.
Além do contraste regional, a conseqüência é a elevada demanda dos juízes especializados: a média, no Brasil, é de 438,8 mil habitantes por magistrado (veja abaixo a média por Estado e por Região)", fala o vereador Antonio Lima, que é advogado.
FALTA PRIORIDADE
Antonio Lima lembra que o presidente da ABMP, Eduardo Rezende Melo, afirma que "o levantamento mostra que ainda falta prioridade absoluta na organização do Sistema de Justiça da Infância e da Juventude no País". A Associação defende como critério a criação de vara especializada nos municípios com mais de 100 mil habitantes, pois as políticas de assistência social, saúde e educação partem do princípio de que as cidades de grande porte - justamente aquelas com mais de 100 mil habitantes - apresentam uma organização social complexa e sinais de vulnerabilidade que justificam a especialização dos serviços.
A pesquisa identificou outro desrespeito ao ECA. Apesar do artigo 150 obrigar a criação de equipes multidisciplinares - com assistentes sociais, pedagogos, antropólogos, psicólogos, etc. - nas varas da infância, dois estados não cumprem a regra: Ceará e Rio Grande do Norte. Já no Distrito Federal e em seis estados (Acre, Alagoas, Bahia, Piauí, Tocantins e Pará) essas equipes estão presentes apenas nas capitais, ou, no máximo, em algumas grandes cidades.
Formação precária
Se o assunto é Direito da Criança e do Adolescente, a formação de magistrados, promotores e defensores públicos é precária, quando não inexistente. O levantamento mostra que não há espaço para o tema nas faculdades de Direito, nos editais de concurso público e nos cursos de formação inicial e continuada para aqueles que ingressaram na carreira.
No caso da formação inicial dos aprovados em concurso, por exemplo, menos da metade das instituições do Sistema de Justiça realiza qualificação ou treinamento específico para os profissionais que irão atuar junto às varas da infância e juventude. Mesmo entre aqueles que promovem uma formação específica em direitos da criança e do adolescente, o curso dura, no máximo, oito horas.
"Ainda existe um desafio enorme para o juiz, que não é formado em direito da infância, ter um olhar interdisciplinar", afirma o presidente da ABMP, lembrando que a Justiça da infância lida com situações bastante complexas.
CNJ deve publicar resoluções
O resultado do levantamento foi apresentado ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) no dia 9 de julho. A ABMP também apresentou propostas para fortalecer o Sistema, com a expectativa de o CNJ determinar a implementação das medidas pelos Tribunais de Justiça do País.
A iniciativa deve render resultados em breve. O juiz e conselheiro do CNJ Antonio Umberto de Souza Júnior disse que irá propor, na última reunião do Conselho de agosto, uma resolução determinando que o direito da infância e da adolescência seja incluído nos concursos de magistrados e seja tema de curso de formação juizes especializados. "Imagino que será aprovada sem dificuldade", afirma Antonio Humberto.
Sobre a falta de parâmetro para a criação de varas da infância de acordo com o número de habitantes, o conselheiro diz que o Departamento de Pesquisa Judiciária do CNJ fará um estudo para chegar a um critério ideal, que serviria de orientação. Segundo ele, o Conselho não tem poder de obrigar os Tribunais de Justiça a criar varas. "O ECA estabelece apenas a possibilidade de instalação das varas", aponta. "Até setembro a gente deve concluir o estudo e verificar o que pode ser proposto".
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