URMA DE JORNALISTAS DA UFBA 50 ANOS: O CACIQUE ERA NOSSO 2º LAR

Tasso Franco
20/08/2021 às 13:06
    A turma de jornalistas UFBA 1971 está completando 50 anos de formatura e teremos um almoço dia 7 de outubro próximo (Madero) para comemorar. 

   Foi uma turma maravilhosa mista - homens e mulheres - e na foto estão apenas os mans, 15 dos 16 ou 17 que éramos. E, hoje, somos 10 ou 11, pois, alguns partiram para outra esfera espiritual, mais recentemente, Eliezer Varjão - segundo na foto à direita na linha intermediária. 

   Entramos em 1968 e saímos em 1971 numa época em que a cidade do Salvador era provinciana, algo em torno de 650.000 habitantes no final do tumultuado e revolucionário ano 1968, do maio de Paris e do AI-5 no Brasil.

  E como era a cidade do Salvador em que começamos a nossa jornada jornalística?

   Não havia classe média alta ou ricos na nossa turma. Ninguém tinha sequer um fusca. Éramos representantes da classe média- média e todo mundo precisava trabalhar para se manter e/ou ajudar a família. Eu era do interior e morava numa pensão paga por meu pai. 

  As pensões que abrigavam os interioranos se situavam no coração da cidade alta - Bângala, Nazaré, Mouraria, Av Joana Angélica, Nova do São Bento, Tororó - e a vida cultural e política também se situavam nesse espaço incluindo a Chile, a Sé, o centrão, a Sete, a Barroquinha, a Baixa dos Sapateiros, onde estavam sediados os jornais e rádios - A Tarde, DN, Jornal da Bahia, Sociedade, Excelsior e as sucursais dos jornais do RJ e SP. Fora desse circuito só as iniciantes TVS, Itapoan e Aratu, na Federação.

  O centro do poder político ficava na Sé (Assembleia), na Pça Municipal (Palácio do Governo e Prefeitura) e a área econômica no Comércio - porto, firmas exportadoras e bancos. 

  Tudo girava nesse quadrilátero. Muitos de nós transitávamos por essa área a pé. Eu morava na Joana Angélica perto da faculdade e comecei a trabalhar no Jornal da Bahia e meu percurso era escola, restaurante universitário (no Corredor da Vitória) e Barroquinha onde ficava o jornal.

    Eventualmente pegava um ônibus. Mas, via de regra, fazia todo esse percurso na bota. Não havia ônibus circulares o que era um problema. O ônibus de Nazaré só fazia Nazaré a Sé; o Barra e Barra Avenida (pela passava pelo RU) também era até a Sé. A bota era a solução. A paleta.

  Nessa época usávamos uma bolsa tipo 'guerrilheiro' ou 'cangaceiro' de couro curtido para levar algum livro, caderno, caneta e eventuais lanches. Estudante era conhecido de longe. Alguns usavam barba para se assemelhar a 'guerrilheiros' cubanos. 

  As bolsas a gente comprava na ladeira da Barroquinha ou no Mercado Modelo. Aos olhos de hoje, eram horríveis, mas, a gente achava lindo. Quando entrei na Tribuna da Bahia, em 1969, Quintino de Carvalho, que era o editor chefe, determinou o uso do paletó e gravata e aposentamos (em parte) a bolsa de 'guerrilheiro'. Mas, tinha gente que usava e ficava mais ridículo ainda.

  Fui com Paolo Marconi comprar meu terno na Ipê, loja que vendia eletrodomésticos e ternos, na Av Sete. Como estávamos com carteira do trabalho assinada (grande conquista, até inesperada) isso facilitou muito as coisas e as compras. Pagávamos as prestações no carnê de papel. Um terno para todo ano com variações das camisas e gravatas. Era cada combinação (às vezes) de doer a alma.

  Depois que ganhei uma 'gaita' melhor sai da pensão e fui morar com 3 colegas num apartamento da Nova do São Bento, quarto e sala, dois beliches. A rotina era a mesma com a diferença que o curso de jornalismo mudou para o Canela. Mas, estava na rota do RU. Pela manhã e à noite, o rango era pão com ovo. Em frente ao Jornal da Bahia tinha uma lanchonete legal e o bar de Cabelinho para molhar o palato. 

  A Nova do São Bento e adjacências até o Mocambinho eram uma muvuca com bares, boites e o Anjo Azul, a boite dos artistas visuais e da elite. À direita, descendo rumo a Castro Alves ficavam os 'bregas' chIques e medianos, de Maria da Vovó ao Melancia. 

  O 'point' intermediário dos jornalistas era o Restaurante Cacique - ao lado do Cine Guarani, onde, no fundo funcionava o Tabaris dando os últimos suspiros, com Sandoval de cantor. 

  O Cacique era nosso segundo lar. Quase todo mundo se conhecia - jornalistas, advogados, contadores, médicos, políticos e outros - que atuavam no centro. Éramos atendidos (invariavelmente) por um garçom chamado português ou portuga, fumante inveterado que prendia o cigarro numa forquilha de uma árvore. Chope era a bebida campeã. 

  E assim se passaram os anos iniciais dessa nossa trajetória. Evidente que cada qual tem sua história e lembranças dessa época (1968/1971) e conte a sua quem assim quiser. Foi do janelão da redação do Jornal da Bahia que vi a abertura do Carnaval de Salvador que se dava no sábado, pela manhã. (TF)