Colunistas / Crônicas
Jolivaldo Freitas

UM DIA na emergência do Hospital Salvador e o GOL

Cronista diz que, agora vai, com médicos cubanos e angolanos, e o camarada levando ferro sem anestesia
26/06/2013 às 20:16
 O Ministério da Saúde disse que irá abrir 12 mil vagas de residência médica em todas as especialidades. A medida visa a ampliar o número de especialistas e zerar o déficit da residência médica em relação ao número de formados em medicina. As primeiras 4 mil vagas serão criadas até 2015.

  Também, segundo a presidente-denta Dilma, iremos importar milhares de médicos para atuação no SUS. Achei legal e pensei: com certeza virão médicos de Houston, da Suécia, da Inglaterra e de Paris. Coisa de primeiro mundo. Nada deste carniceiros formados a facão em algumas das nossas universidades. Foi quando fiquei frustrado já que me disseram que virão médicos de Cuba, Nigéria e Angola.
 
   Tô lascado, pensei rápido. Como se já não bastasse o pessoal do nosso terceiro mundo científico, virão a rabeira da Medicina. A senhora que tem filho pequeno já deve estar de saco cheio quando o pediatra formado pela UFBa, FTC, Bahiana de Medicina e outras olha, abre os olhos, puxa a língua e toma a temperatura do seu filho que está mal pra cacete e diz:

- É virose!

Imagine o que vai dizer o cara que vem da Namíbia ou do Paquistão:

- Acho que é verminose, diz um.

- Nada, com certeza é vírus.

- Porra nenhuma, diz um terceiro. É espinhela caída.

- Qualé – garante o cubano – é olhado. É santeria.
 
   Semana passada passei o maior sufoco no Hospital Salvador. Já de entrada cheguei recebendo uma pingueira na careca. A moça da recepção, coitada, estava recebendo uma saraivada de impropérios por parte de um paciente que chegara às 11 horas da manhã e às 13h30min ainda não havia tido a clemência e receber um, pelo menos, oi, olá, como está passando, por parte de quem deveria atender na emergência do cacete armado.

   Já arrepiei e fiquei e mais ainda arrepiado quando as moscas pousaram em meu braço. Eu, com todo nojo retido, tinha certeza que elas vieram de um montinho de algo que parecia vômito, ou cocozinho de criança ou mesmo um pouco de iogurte que caíra no chão. Vá saber... e eu nem queria olhar direito. 

  Espantei as moscas e este foi meu passatempo enquanto esperava atendimento emergencial para minha filha.

  Quando perguntei na recepção quanto tempo de espera para atendimento médico a moça me disse que no mínimo uma hora e meia. Tirado a engraçadinho eu a lembrei que não havia problema, pois o Cemitério do Campo Santo estava ali pertinho, coisa de 200 metros e dava para levar o corpo nas costas em caso de morte. Economizaria pelo menos dez mil reais de féretro. A moça não gostou da piada.

   Enquanto isso outras pessoas, dentre tantos que esperavam calados, ruminando suas dores como rebanho apático, conversavam entre si, se queixando do atendimento. O rapaz de camisa listrada que dera piti pela demora não se conformava e estrilava para todo mundo ouvir. Foi quando um funcionário disse que a demora era por causa da estrutura. 

   Havia apenas dois médicos para atender ao rebanho todo que decidira ficar doente justo naquele dia em que a Seleção Brasileira iria jogar; e para piorar apareceram dois casos para UTI.

   Os médicos, coitados, atenciosos e se virando. O enfermeiro Gil Miranda, que faz a triagem, mais grosso que pau de amarrar jegue, só faltava dar coice em quem se queixava da demora e para mim disse que estava alí somente para cumprir a burocracia e ganhar seu dinheiro no fim do mês. 

   Aliás, dinheiro que disse nem saber de onde vinha, uma vez que a Golden Cross para se livrar do pepino e de profissional sem comprometimento como Gil passou o mico para outro. Nenhum funcionário, por sinal, sabe quem é responsável pelo hospital. Como disse Gil Miranda:

- Eu quero é receber no fim do mês. E basta!

  Ele, aliás, se vangloria de rechaçar com ironia queixas de jornalistas que chegam lá para atendimento. E cita famosa repórter da TV Bahia que foi se queixar da demora e em que deu um chega-pra-lá, como se tivesse fazendo o melhor marketing para a empresa.
  Enquanto isso a pingueira do Hospital Salvador teimava em cair em minha careca e crescia a insatisfação dos doentes que chegavam para emergência e a demora era tanta, por falta de estrutura, que a dor até passava. Deus protege os pacientes do Hospital e quem tem palno da Golden Cross. Tanto que nego chiou mas nenhum morreu na fila. Uma enfermeira passava com material de atendimento descoberto num carrinho e um funcionário gozando a cara da gente e dando indireta dizia para o pessoal da recepção: vamos suspender tudo daqui a pouco e só vamos voltar depois do jogo.

   Pedi a Deus que no Brasil ganhasse. Já pensou o que Gil faria se os canarinhos perdessem. Com certeza seria carrinho, dedada ou chute por trás. Pior, talvez somente no SUS. Imagine quando chegarem os médicos importados sabe-se lá de onde. Lembrei que o Hospital Salvador já teve de indenizar alguns pacientes por danos morais. Acho que vou processar. Tem gente ou instituição que só aprende doendo no bolso. Sem anestesia.