Esporte

HISTORIANDO AS COPAS 6: A TAÇA É NOSSA, SUÉCIA, 1958 -ZÉDEJESUSBARRÊTO

Pelé surge para o mundo do futebol aos 17 anos de idade, depois rei e atleta do século XX
ZédeJesusBarrêto ,  Salvador | 20/09/2022 às 11:41
A seleção campeã do Brasil, 1958, Suécia
Foto: Muesu das Copas


  - “Quando vi o Pelé jogar, fiquei com a sensação de que eu deveria pendurar a chuteira” (Just Fontaine, francês, artilheiro da Copa na Suécia)
 
  - “No momento em que a bola chega aos pés de Pelé o futebol se transforma em poesia” (Pier Paolo Pasolini, cineasta italiano)

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   Dribles e gols sonoros   

  A Copa da Suécia acompanhei inteira de ouvidos grudados num caixote de válvulas, seis faixas, abancado sobre uma antiga cristaleira, no qual minha mãe e as vizinhas ouviam a radionovela mexicana ‘O Direito de Nascer’, e eu ligado em bola e no seriado “Jerônimo, o Herói do Sertão” que tinha um Moleque Saci pra ajudar nas aventuras.

  O som chegava em OC e OM, vagas que iam e vinham, subiam e desciam, aumentavam e sumiam nos deixando aflitos, a mente a imaginar o que estava de fato acontecendo lá tão distante, a imaginação criando um filmezinho de cada lance até hoje guardado no baú da memória. 

  Faz pouco, na reclusão da pandemia, revimos com gosto e curiosidade todos e inteiros jogos de copas históricas, imagens claras. A de 58, na Suécia, foi a Copa do menino-rei Pelé, do anjo das pernas tortas Garrincha, do príncipe etíope Didi, do bravo e técnico Vavá, do incansável Zagallo, Nilton Santos, Zito...
 Era o Brasil da Bossa-Nova, JK construindo Brasília, rasgando estradas, fazendo história, e veio o título de Campeão do Mundo na Copa da Suécia, conquista que nos livrou do ‘complexo de vira-latas’. Pelo menos no futebol éramos os melhores... 

“A Taça do Mundo é nossa/com brasileiro não há quem possa”!  Cantávamos.

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   Pois que ali, nos campos da Suécia de louros e loiras de olhos azuis, deslumbraram o mundo um descendente de índios fulniôs, de pernas tortas, o Mané Garrincha, um gênio, o nosso Chaplin; o príncipe Didi, considerado o craque da copa, inteligência e elegância pura; e um garoto ‘neguim’ de 17 anos que assombrou e deslumbrou até os adversários com talento, arte e gols, sagrando-se assim por méritos e obras “O Rei do Futebol”. Esse menino, anos de reinado depois, foi reconhecido como ‘O Atleta do Século XX’, por feitos e conquistas.
 
  O Pelé tornou-se, no mundo da bola, uma espécie de entidade, tecia encantos com a bola, um semideus dos gramados, brasileiríssimo, simplesmente Pelé, marca e figura reconhecidas em todos os continentes. 

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  O Brasil - país, nação - jamais seria o mesmo depois daquela conquista nos gramados frios do Norte. Mostramos ao mundo um jeito novo, diferente de se jogar bola, com pitadas de dança, negaças, ginga da capoeira, ritmo, poesia, pinturas e... eficiência, gols e gols. Um jogo que, a partir dali, seria considerado arte pela sua beleza de movimentos, cores e imprevisibilidade. 

  Mais, o Brasil (país, nação) deve ao futebol, a Pelé (pela projeção e feitos), como também ao violão de João Gilberto, muito do respeito, do olhar diferenciado que os povos de todos os continentes lançaram então sobre o tamanho verdadeiro do Brasil. A partir daí. O ano de 1958 foi um marco. 
 
 Detalhes: 
- Com Pelé e Garrincha em campo, juntos, a seleção brasileira nunca perdeu. 
   Como poderia? 

- O Brasil foi o primeiro a vencer uma copa fora do seu continente. Um país latino-americano, ex-colônia portuguesa, coroado na Europa.  
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   Presidente ‘bossanova’  

  - O Brasil de 1958 era um país de 65 milhões de habitantes e 53% da população tinha menos de 20 anos de idade. Pura juventude, pujança. A inflação era de 12% ao ano e o mineiro Juscelino Kubitscheck (o JK) cumpria o prometido em campanha: faria 40 anos em quatro. Construía Brasília no meio da selva e rasgava o país com rodovias. Plantava-se a indústria automobilística com a produção do fusquinha em São Bernardo dos Campos. JK fazia uma gestão desenvolvimentista com democracia plena em vigor. 
 
   “Bossa Nova mesmo é ser presidente/ Desta terra descoberta por Cabral/ Para tanto basta ser tão simplesmente/ simpático risonho, original”... 
(versejos do menestrel irônico Juca Chaves, à época). 

  - Ouvia-se nas rádios o Trio Irakitan, Maysa, Alcides Gerardi, Cauby, Ângela Maria, Elizeth Cardoso, Moreira da Silva ... 
 
  E a Bossa Nova mexia com os ouvidos e o gosto musical estabelecido com a canção, o samba ‘Chega de Saudade’, composição de Tom Jobim e Vinícius de Moraes que João Gilberto recriou com um violão tocado de forma absolutamente nova, estranha, numa interpretação minimalista, quase celestial. Hoje, em qualquer canto do planeta onde se toca bossa-nova está a identidade brasileira. Um jeito novo, quase jazzístico, de tocar (e cantar) o samba brasileiro. Simples, simplesmente João. 

 
                                                     Baianidade em alta 

  A TV ainda não tinha chegado à Bahia, mas Salvador era mais negra e tão mais bela! 

  A cidade fervilhava como a capital cultural do país: música, dança, literatura, artes plásticas, cinema, teatro... Capoeira e africanidades, saveiros e sincretismos. A nossa Universidade (hoje UFBa) em ebulição. Petrobrás, bancos, estradas, comércio... As coisas estavam acontecendo na Bahia.

   A zona urbana da capital acabava no largo de Amaralina, até onde chegavam os bondes elétricos. Para o norte eram só praias, dunas, coqueirais sem fim e algumas aldeias de pescadores. A rebuliço urbano girava em torno do Centro Histórico – Praça da Sé, Pelourinho, Avenida Sete, Porto, Calçada... 
  
 No futebol, o Bahia, depois de uma excursão vitoriosa em campos europeus, armava o super time que seria pentacampeão baiano (1958/62) e, em 1959/60, se sagraria o Primeiro Campeão Brasileiro de Futebol, conquistando a Iª Taça Brasil numa final de três jogos sobre o fantástico Santos de Pelé. A tal ‘baianidade’ em alta, orgulho de nascença e terreiro, a torcida tricolor embevecia na Fonte Nova pois ser baiano era ser Bahêa! 
 
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  A trilha nos gramados frios

 O título começou a ser ganho ainda no Brasil, bem antes de a Copa começar. O bem nascido desportista João Havelange (Jean-Marie Faustin Godefroid Havelange), um advogado carioca de 41 anos, ex-atleta olímpico, ligado ao Fluminense do Rio, se elegeria em janeiro de 1958 presidente da CBD-Confederação Brasileira de Desportos (hoje CBF) e investiu como nunca dantes em organização, planejamento. Entregou a seleção e a Copa do Mundo a seu vice, o empresário paulista Paulo Machado de Carvalho, o famoso “doutor Paulo”, que tudo resolvia, decidia, carta branca.

  Doutor Paulo traçou um projeto/plano detalhado de trabalho, com metas e recursos,  para vencer a copa. Estrutura, condições, treinamento e a escolha de uma Comissão Técnica qualificada: - o supervisor Carlos Nascimento, o médico Hilton Gosling, o dentista Mário Trigo (jogadores com muitos problemas na boca), o preparador físico Paulo Amaral e até um psicólogo (João Carvalhaes). 

  O grupo acreditou, apostou nas pernas tronchas de Mané Garrincha e levou à Europa o garoto Pelé, mesmo baleado no joelho por conta da violência dos argentinos num jogo em São Paulo. Paulo Machado era um líder, mostrava-se um homem generoso, sabia ouvir, simples e divertido, mas respeitado, tinha comando. 
No dia 25 de maio de 1958 a delegação brasileira chegava em avião da Panair à Europa, em Roma primeiro, para treinamentos e adaptação.

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   Boa estreia 
  
  Em amistosos na Itália, com goleadas em equipes da primeira divisão, já despontava   o ‘torto’ Mané, aos 24 anos, fogoso, desequilibrando. “O que era aquilo?”, perguntavam pelos jornais. 

  Com Pepe (o melhor ponteiro canhoto do mundo, à época) machucado, substituído por Zagallo, a Seleção Brasileira estreou na Copa da Suécia num domingo, dia 8 de junho, no acanhado estádio de Udevalla, vencendo a Áustria, por 3 x 0 – dois gols de Mazolla e um do ousado lateral esquerdo Nilton Santos. A despeito do placar elástico, foi um jogo difícil e o Brasil valeu-se de contragolpes, atuou bem fechadinho atrás.  
 
  -  Com Garrincha inexplicavelmente no banco de reservas e Pelé tratando o joelho, Feola escalou um time para a estreia que poucos, hoje, seriam capazes de tê-lo de cor: Gylmar, De Sordi, Belline, Orlando Peçanha e Nilton Santos; Dino Sani e Didi; Joel, Mazolla, Dida e Zagallo.   

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  A retranca inglêsa

  Seria o primeiro empate sem gols (0 x 0) da história das copas aquele Brasil x Inglaterra de 11 de junho em Gotemburgo, graças a uma grande atuação do goleiro inglês McDonald. O ataque brasileiro martelou, Mazolla chegou a chorar em campo, abatido, depois de desperdiçar algumas chances – e foi sacudido, duramente repreendido no gramado pelo capitão Belline. Dida, artilheiro do Flamengo (ídolo de Zico), sumido na estreia, já tinha cedido lugar ao valente Vavá. Faltou o gol. 
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  Show de Mané 
 
  Com as dificuldades da partida no empate sem gols contra a retrancada e robusta Inglaterra, um sorteio nos pôs pela frente a então poderosa e ‘científica’ equipe da União Soviética (a URSS) do lendário goleiro Yashin, o ‘Aranha Negra’. Foi aí que os atletas líderes da equipe (Didi, Belline, Nilton Santos) chamaram o treinador Feola, o Doutor Paulo e Carlos Nascimento num canto e os puseram na parede, quase que exigindo a escalação de três jogadores que foram mais que fundamentais na conquista do título: 

   - O apoiador Zito, mais marcador, com mais fôlego, liderança e raça em campo substituiria o clássico Dino Sani, que acusara algum desconforto muscular; o desconcertante ponteiro Garrincha (compadre de Nilton e parceiro de Didi no Botafogo) que era muito superior ao aplicado Joel, e o menino Pelé, como estivesse, que jogaria ao lado de Vavá. 
  
   Dizem os historiadores e os que lá estavam que foram os cinco primeiros minutos mais alucinantes das Copas: - O Brasil começou atordoando, com duas bolas na trave de Yashin, em chutes de Garrincha e Pelé, e o gol de Vavá, batendo da entrada da área, ao receber um ótimo passe de Didi. Mané destroçava a marcação ‘científica’ dos soviéticos. Vavá fechou o placar em 2 x 0, aos 30 minutos do segundo tempo, depois de rápida tabela com Pelé. Os ‘russos’ quase quebraram a canela de Vavá, deixando-o de fora do jogo seguinte.  E deixaram o gramado rendidos, sem entender nada. 

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  Olhe o Rei! 
 
  O País de Gales era o time dos empates, do ferrolho, da retranca. E não foi diferente contra o Brasil, suportando o bombardeio desde o início, com o goleiro Kelsey operando ‘milagres’ e o ponta Garrincha bem vigiado. Só aos 20 minutos do segundo tempo o gol saiu. E que gol! 
 
  Foi o primeiro de Pelé em copas, o mais jovem artilheiro até então no mundial (com 17 anos). Uma pintura. Mazzola alçou na área, Didi tocou de cabeça e o garoto recebeu, dominou no peito de costas para o gol adversário e com dois becões imensos fungando no cangote, aplicou-lhes aquele ‘chapeuzinho’ curto, preciso, a conta certa pra deixar os marcadores ‘sem pai nem mãe’, girando o corpo e batendo rápido, de direita, no canto (1 x 0). Tento com marca registrada do Pelé, pura obra de arte. O Brasil chegava, assim, à sua semifinal fora de casa.
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 França goleada

 Foi o grande clássico daquela Copa aquele surpreendente Brasil 5 x 2 França, no estádio Rasunda, em Estocolmo, no dia 24 de junho - Dia de São João, haja fogos e fogueira!  Seria a batalha entre o melhor ataque da competição - a França do artilheiro Fontaine, 13 gols, e do craque meiocampista Kopa – contra a melhor defesa, a brasileira, ainda sem sofrer gols. 
 
   Mas foi o Brasil que começou ofensivo, com Pelé arrancando e chutando aos 30 segundos pra tirar casquinha do travessão do goleiro Abbes. Na sequência, sem que os franceses respirassem, Garrincha roubou a bola, tentou seus dribles pela direita, foi desarmado mas Zito ficou com a sobra e achou Vavá penetrando pelo meio; o objetivo centroavante matou no peito e fuzilou, abrindo o marcador a um minuto e meio de jogo. Fontaine, rápido e oportunista, empatou logo aos 9 minutos. O jogo ficou duro e brigado, mas Didi, numa ‘folha seca’ da intermediária desempatou (2 x 1) ainda no primeiro tempo. Jogão de bola.
 
  A segunda etapa foi toda de Pelé, três gols, desequilibrando. O primeiro, aos sete minutos, depois de boa jogada e arremate de Zagallo, da esquerda, ele apareceu, oportunista, aproveitando o rebote do goleiro. O segundo aos 18 minutos, completando na pequena área uma das tantas garrinchadas pelo lado direito. O terceiro, já aos 30’, o imarcável menino penetrando pelo meio, dominando com classe o passe perfeito de Didi e fuzilando sem deixar a bola cair, 5 x 1. Os franceses ainda diminuíram, aos 39’, em bela jogada individual do meia Piantoni. Para muitos, foi o grande jogo daquela Copa, mas tinha ainda a final contra os donos da casa.

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 O azul d’Aparecida 

 Dia de São Pedro, 29 de junho, um domingo, o estádio de Rasunda lotou, até o Rei da Suécia, Gustavo VI, esteve presente, participante. Os donos da casa, credenciados por uma bela campanha na competição, em campo com seu uniforme número um, amarelo, o que obrigou o Brasil a jogar de azul pela primeira vez naquela copa. 

  Muitos (jogadores, membros da delegação e radialistas) supersticiosos temiam pela troca da “amarelinha”, logo na final decisiva. Mas Doutor Paulo, mui espertamente, reuniu todos – jogadores e comissão técnica - antes da partida, já nos vestiários, pra dizer ‘emocionado’ que aquele azul viera em boa hora, um azul abençoado pois era a cor do manto de Nossa Senhora Aparecida, a padroeira do Brasil. Deve ter funcionado positivamente no ânimo dos atletas, maioria de católicos.

 A seleção jogou a final, pois, de camiseta azul e com uma substituição na lateral direita: Djalma Santos no lugar de De Sordi. Uma mudança para melhor, sem dúvida, veríamos. Mas foram os suecos que nos surpreenderam no começo com um jogo ofensivo, abrindo o placar aos quatro minutos, em uma bela jogada de Liedholm, driblando Orlando e Belline, pela meia lua, acertando rasteiro o cantinho de Gylmar. 
 
  É célebre a cena seguinte em campo com o ‘mestre’ Didi indo apanhar a bola no fundo das redes e sair com ela caminhando calmamente para o meio campo, conversando com o garoto Pelé, lado a lado, traçando planos para o recomeço do jogo. Pedia calma, respirava fundo, combinaram em acionar Garrincha na direita para destronchar o adversário. 
 
  Assim aconteceu. Didi para Garrincha, os dribles desconcertantes pela direita, o cruzamento da linha de fundo para a pequena área, Pelé em velocidade raspou na bola e Vavá atrás a empurrou para as redes, empatando, aos 9 minutos. Aos 32’, um repeteco: Djalma Santos pra Garrincha, o drible, o cruzamento rasteiro de fundo e Vavá escorou, virando (2 x 1). 

  O show viria na segunda etapa. Logo aos 10 minutos, Pelé recebeu na área um passe de Nilton Santos, deu um chapéu no marcador e disparou na arriada, sem deixar cair, mais um golaço do Menino Rei (3 x 1). Zagallo, que fez uma copa extraordinária, ampliou o placar (4 x 1), cutucando da esquerda na saída do goleiro. Os suecos diminuíram aos 36 minutos (4 x 2), com Simonsson, mas o Brasil era soberano, administrava bem a vantagem. 

  Coube - como uma coroa na cabeça do ‘Rei menino’ - a Pelé fechar o placar e marcar o último gol do primeiro título mundial brasileiro, no derradeiro minuto do jogo, e de cabeça, subindo mais que a zaga, testando um cruzamento na medida de Zagallo, da esquerda, deslocando o goleiro e...  caindo em prantos, como uma criança, afagado pelos companheiros.  Cumpria assim, Pelé, a promessa feita ao pai Dondinho, em 1950: “Não chore, pai, um dia eu ganho um mundial pra você”. Palavra de Rei.
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  Os suecos, educados e deslumbrados com o que viram, aplaudiram de pé os campeões. O Rei Gustavo desceu ao gramado para cumprimentar um por um, com gestos de carinho e agradecimento, e o Capitão Belline, a pedido dos fotógrafos, ergueu a Taça Jules Rimet com as duas mãos, acima da cabeça, num gesto que se tornou marca da conquista da Copa, repetido daí por diante pelos capitães de todas as equipes vencedoras. Um titulo para não esquecer jamais.  
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  Os 22 campeões  

  - Gylmar (Castilho), Djalma Santos (De Sordi), Belline (Mauro), Orlando (Zózimo) e Nilton Santos (Oreco); Zito (Dino Sani) e Didi (Moacir); Garrincha (Joel), Vavá (Mazzola), Pelé (Dida) e Zagallo (Pepe). 

  O Treinador foi o ‘gordo’ Vicente Feola, que era técnico do São Paulo. Dizem que ele cochilava no banco, durante os jogos, mas a realidade é que era um bom homem, entendia de bola, conversava, ouvia e era querido pelos atletas. 

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 Pelé, um menino feito Rei
 
  Aos 13 anos de idade, franzino, o menino Dico, filho do ex-jogador Dondinho, já jogava entre os adultos no BAC- Bauru Atlético Clube, time do interior paulista então treinado por Waldemar de Brito, um ex-meia talentoso que defendeu o Brasil na Copa de 1938, ao lado de Leônidas da Silva e Tim  - época das viagens de navio, 15 a 20 dias em alto mar, sem treinar, os jogadores chegavam na Europa acima do peso, lesos.  

  Assombrado com o que aquele miúdo já fazia com a bola em campo, Waldemar se responsabilizou perante os pais (Dondinho e Dona Celeste) e levou o garoto para treinar na Vila Belmiro, no Santos que se sagrou bicampeão paulista em 1055/56. Assim, aos 15 anos, o adolescente Edson Arantes (Dico, Gasolina, Bilé, Pelé) passou a jogar profissionalmente ao lado de atletas consagrados como Pepe, Zito, Pagão, Formiga, Jair da Rosa Pinto... e danou-se a fazer diabruras inacreditáveis em campo e gols em abundância. 

 Aos 16 anos Pelé estreou na Seleção Brasileira, no Maracanã, com a camisa 13. Entrou no segundo tempo e fez o gol, na derrota de 1 x 2 contra Argentina. No jogo seguinte, no Pacaembu/SP, Brasil 2 x 0 Argentina, ele voltou a marcar, assegurando sua presença na Copa da Suécia. Já se tornara tão essencial que viajou para a Europa, mesmo com o joelho lesionado, inchado, com as botinadas dos ‘hermanos’.
Era só o começo da “Era Pelé”.  
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- A camisa 10 caiu-lhe como um manto de rei por acaso. Às vésperas da Copa da Suécia, a FIFA fez um congresso, em Estocolmo, para as providências finais antes da competição. Uma delas seria a numeração nas camisetas, de 1 a 22, que caberia aos atletas de cada equipe, titulares e reservas. 

  O Brasil não teve representantes na reunião e nem tinha mandado a relação dos atletas já convocados, os titulares e os reservas, com seus respectivos números. Então, sem saber bem quem era quem naquela equipe brasileira, tampouco a posição de alguns deles, teria sido decidido por sorteio, ou mesmo aleatoriamente, a numeração que caberia a cada jogador. brasileiro. Assim é que, por exemplo, o goleiro Gylmar jogou com a camiseta 3 e Garrincha vestiu a 11. 

  A Pelé, por artimanhas do destino ou decisão dos deuses, coube a camisa 10.  Desde então, a camiseta 10 tornou-se um signo, privilégio dos grandes craques, uma marca do Rei, para sempre consagrada.        
 
  A Era Pelé começara. 
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