Cultura

MUSEU NACIONAL DOS COCHES LISBOA: TRANSPORTES ANTES DO AUTOMÓVEL (TF)

Como era o transporte das autoridades entre os séculos XVI e XIX com uso de coches e cavalos
Tasso Franco , Lisboa | 10/01/2024 às 08:06
Em primeiro plano a coche de Felipe II na sua viagem entre Madrid e Lisboa, 1619
Foto: BJÁ
     O Museu Nacional dos Coches de Portugal instalado desde 2015 em prédio moderno na Avenida da Índia, Lisboa, a poucos passos do Palácio de Belém onde reside o presidente da República, é uma das mais interessantes preciosidades históricas deste país, no segmento transporte. Embora os modelos expostos sejam relacionados em sua maioria à casas reais dá para ter uma ideia como se desenvolveu o transporte de pessoas e passageiros a partir do século XVI, exatamente no período relacionado à descoberta do Brasil.

    Ora, já na virada dos séculos XV para o XVI, os portugueses já usavam coches puxadas por cavalos para o transporte de passageiros e das autoridades da Corte. Claro, os cocches, berlindas e seges expostas no museu são em sua maioria de modelos usados por reis, rainhas, filhos dos reis e rainhas, papas, e alguns modelos do Correios, do transporte de presos e de carruagens de viagens. Os passageiros comuns em Lisboa, a essa altura cidade com 1500 anos de existência, usavam modelos mais simples, porém, parecidos: estruturas em madeira e ferro produtos artesanais. A maioria das pessoas, no entanto, andava a pé.

   Paga-se 8 euros para ter acesso ao museu e como estamos em Portugal, ao menos para os brasileiros, os pórticos e letreiros são em português e inglês. Ininicialmente, o museu era chamado dos Coches Reaes e se situava no antigo picadeiro do Palácio de Belém, criado em 1905. Hoje, situa-se no novo edificio em frente (Av. da Índia), inaugurado em 2015.

   O museu reúne uma colecção única no mundo, de cerca de 9 000 objetos, que inclui predominantemente viaturas de gala ou de aparato, algumas de viagem e de passeio, dos séculos XVI a XIX, e acessórios de cavalaria. Foi criado por iniciativa de D. Amélia de Orléans e Bragança, mulher do rei Dom Carlos I (1889–1908), último rei de Portugal, assassinado - com a finalidade de reunir, salvaguardar e apresentar ao público um importante acervo de viaturas pertencentes à Casa Real.   

    Após a implantação da República, a 5 de outubro de 1910, a coleção do museu aumentou com a vinda de um conjunto de coches e berlindas da extinta Casa Real e de viaturas provenientes dos bens da igreja. Em 1911, o museu passou a designar-se Museu Nacional dos Coches. A 23 de maio de 2015, a maior parte da coleção foi transferida para o novo edifício.

 Este conjunto de viaturas permite ao visitante a compreensão da evolução técnica e artística dos meios de transporte de tração animal, utilizados pelas cortes europeias até ao aparecimento do automóvel. O acervo inclui coches, berlindas, carruagens, seges, carrinhos de passeio, carrinhos de criança, liteiras e cadeirinhas. Completam a coleção, arreios de tiro e cavalaria, acessórios de viatura, fardamentos, instrumentos musicais, um núcleo de armaria e retratos a óleo dos monarcas da Casa de Bragança.

   A coleção está bem conservada e impressiona, de cara a coche usada pelo rei da Espanha, Felipe II, na sua viagem de Madrid até Lisboa, quando da conquista de Portugal pela Espanha (1580/1640) , viagem feita em 1619. Também impressiona a Coche dos Oceanos, Sec. XVIII, usado na entrada triunfal em 1716 pelo Embaixador Português em Roma.

 É no reinado de D. João V que o poder real atinge o seu máximo expoente. Esta ostentação traduz-se também nas decorações dos magníficos coches utilizados em cerimónias de grande aparato que impressionavam as populações. A viatura de aparato mandada construir pelo rei D. João V para a Casa Real Portuguesa é um exemplar deste período. 

Carros Triunfais século XVIII – Exemplos únicos do barroco italiano são três coches principais da embaixada do Marquês de Fontes enviada a Roma por D. João V ao Papa Clemente XI, em 1716.

Barroco Português século XVIII – Nas viaturas deste período, o trabalho de talha dourada e as pinturas das caixas revelam composições harmoniosas entre temas sagrados e profanos. É na decoração do Coche de D. José que melhor podemos observar toda a exuberância do estilo barroco em Portugal.

Troca da Princesas século XVIII – A cerimónia do duplo casamento realizada na fronteira do Caia entre um príncipe de Portugal e uma Infanta espanhola e de um príncipe de Espanha e uma Infanta portuguesa, traduz o reatar das boas relações diplomáticas entre os dois países desde a Restauração da independência em 1640. Testemunhos deste grande evento são os coches e berlindas que participaram nesta viagem.

  Há, ainda berlinda Francesa, Sege dos Óculos e Carrinho de Criança do Principe D. Carlos (futuro D. Carlos 
Berlindas séculos XVIII e XIX – Modelo de viatura que surge em Berlim na segunda metade do século XVII. Distingue-se do coche pelo tipo de suspensão. A caixa deixa de estar suspensa e passa a assentar sobre duas fortes correias de couro que lhe dão maior estabilidade e tornam as viagens mais cómodas.

Viaturas Eclesiásticas – Os membros do alto clero tinham estatuto equiparado ao da Nobreza e possuíam as suas próprias viaturas identificadas pelas armas prelatícias. Em certas cerimónias as imagens religiosas eram transportadas em berlindas processionais.

Seges século XVIII – As seges eram viaturas puxadas por um ou dois cavalos, muito discretas e práticas para o dia-a-dia. Podiam ser conduzidas pelo próprio passageiro ou por um boleeiro, homem que seguia montado num cavalo ao lado da sege segurando as rédeas. Foram os primeiros carros de aluguer em Lisboa. Sege dos Óculos (portuguesa).

Carros de Passeio século XVIII – Construídos na época de D. Maria I, são carros ligeiros, decorados em estilo rocaille, puxados por um só cavalo e utilizados pela Família real em passeios em jardins e tapadas dos Palácios.

Liteiras e Cadeirinhas – As liteiras eram utilizadas na Europa desde o tempo dos romanos até ao século XIX por serem fáceis de manobrar em caminhos onde outros veículos não conseguiam circular. As cadeirinhas eram utilizadas, sobretudo nas ruas estreitas das cidades, no transporte de senhoras da nobreza, doentes ou membros do clero.

Carros de Passeio século XIX – Estes carros, de caixa aberta, linhas simples, revestidos a couro negro eram utilizados para passeios ao ar livre no campo ou na cidade. As Vitórias e Phaetons são modelos que podem ser conduzidos pelo próprio passageiro.

Carrinhos de Criança – Carrinhos de pequenas dimensões feitos à semelhança dos carros de adultos para os pequenos príncipes e princesas passearem nos parques e jardins. Podiam ser puxados por póneis ou carneiros.

Carros de Caça – A caça foi, desde sempre um dos grandes divertimentos da nobreza. No século XIX os Charabãs serviam para transportar os caçadores e acompanhantes para as tapadas. As senhoras podiam assim ficar sentadas nestes carros a assistir às caçadas em locais elevados.

Carruagens de Gala – Viaturas de aparato utilizadas pela Família Real e Nobreza em festas de gala tais como Coroações, Entradas Públicas, Cortejos de Casamento e Batizados e em cerimónias religiosas.

Viaturas Urbanas – No século XIX surgem vários modelos de carros fechados ou abertos para circular nas cidades. Apresentam características técnicas inovadoras que facilitam a condução e dão mais segurança e conforto aos passageiros. É nesta altura que surgem os sistemas de travagem integrados, os pneus de borracha, os guarda-lamas, diferentes tipos de molas amortecedoras e a campainha.

Malas-Postas – Surgem em finais do século XVIII destinadas a levar correio. Eram veículos muito robustos puxados por duas ou mais parelhas e que se tornaram os primeiros transportes públicos entre vilas e cidades. Levavam passageiros e bagagens no interior e na cobertura. Com o aparecimento do comboio algumas destas viaturas deixaram de ter utilidade e foram adquiridas por famílias nobres para passeios e caçadas.

Outras coleções

O museu possui ainda outras coleções de bens ligados ao funcionamento dos coches e da corte. Arreios Equestres. Acessórios de cavalaria e de jogos equestres onde se destaca o Estafermo. Acessórios de Viatura
Cama de Campanha, Acessório para Mudança de Rodas. Fardamentos Uniformes das equipagens da Corte.