Câmara de Salvador: devolve o padroado da cidade a Santo Antônio

Tasso Franco
12/06/2016 às 20:12
   Salvador tem situações incompreensíveis e que podem ser resolvidas desde que algum (a) vereador (a) se interesse por analisar distorções históricas que existem na cidade, entre elas, comentamos aqui agora, o fato de insistir-se em ter São Francisco Xavier como padroeiro da cidade, posição que foi ocupada originalmente por Santo Antônio e Lisboa e Pádua, este sim, um santo querido e reverenciado pela população católica e povo de santo.

   Santo Antônio está inserido na história da cidade desde os seus primórdios quando aqui uma imagem aportou trazida pelos franceses, em 1595. 

   Conta a história que uma frota de doze velas partiu do reino da França para se apossarem da capital da Bahia e ao passarem por Arguim, pequena fortaleza portuguesa erguida nesta localidade africana, os luteranos comandantes das naus determinaram praticar atos de violência contra seus habitantes e suas igrejas, apoderando-se de uma imagem de Santo Antônio, a qual entre 'insultos e blasfêmias' foi embarcada numa das naus.

   Nas proximidades da costa do Brasil houve um temporal fazendo naufragar quase todas as embarcações, salvando-se, a nau que conduzia a imagem de Santo Antônio, indo dar nas costas de Sergipe.

   Todos os náufragos foram presos e enviados ao governador da Bahia, dom Francisco de Souza, e quando da viagem a pé, a 12 léguas da sede da cidade da Bahia, no domínio dos Garcia D'Ávila, os prisioneiros toparam com a imagem de Santo Antônio, esta sendo levada a Francisco Dias D'Ávila, primeiro senhor da Casa da Torre, o qual colocou na capela do seu solar.

   O fato chegou ao conhecimento dos capuchinhos que foram buscá-la e levaram-na para a Igreja de Nossa Senhora da Ajuda, a igreja dos Mercadores. No dia 23 de agosto de 1595, a imagem foi conduzida para o Convento de São Francisco, "com maior pompa e solene assistência de representantes da Câmara e do Cabido, como consta da ordem do governador do estado, Rodrigo da Costa".

   Em 'Memórias Históricas da Provincia da Bahia', volume IV, página 129, Inácio Aciolly de Cerqueira revela que Santo Antônio foi o primeiro padroeiro da cidade do Salvador e tinha soldo de praça de soldado intertenido, na Fortaleza de Santo Antônio da Barra, padroado estabelecido em reunião da Câmara dos Vereadores datada de 20 de novembro de 1645.

   Quando da expulsão dos holandeses de Pernambuco houve uma grande festa em honra a Santo Antônio, e aos 10 de junho de 1705, 50 anos depois deste feito, a Câmara de Salvador representava ao governador da Bahia, dom Rodrigo da Costa, pedindo a promoção do soldado Santo Antônio a capitão, o que aconteceu no dia 16 de junho do mesmo ano, determinando que se pagasse todos os anos ao Sindico do Convento de São Francisco, o soldo que se costumava pagar aos capitães da Praça".

   Dom João VI por decreto de 13 de setembro de 1810 concede a patente de sargento mor ao glorioso Santo Antônio "que se venera na cidade da Bahia e a quem o povo da mesma cidade consagra a mais viva devoção, sou hora servido a elevá-lo ao posto de tenente-coronel de Infantaria", isso no governo do conde dos Arcos.

   O Convento Franciscano recebeu esse soldo mensal até 18 de maio de 1912, na República Velha, quando o Ministério da Fazenda cancelou o benefício.

   A essa altura, a cidade já devotava Santo Antonio na Barra, na Mouraria, no Centro Histórico (Convento de São Francisco) no Além Carmo e em vários outros locais da cidade. Veneradissimo até os dias atuais.

   E como foi que Santo Antônio perdeu a condição 
   de padroeiro para São Francisco Xabier?

   No ano de 1685 houve um surto de febre amarela na população da cidade do Salvador, uma localidade suja, sem saneamento básico, pipas de cocô ainda sendo lançadas ao mar da praia da Preguiça, acontecendo muitas mortes.

   A Companhia de Jesus (jesuitas) que era a comunidade religiosa mais poderosa da cidade fez uma campanha em suas missas solicitando que a população implorasse a São Francisco Xavier, este morto na China, Sanchoão, 1552, por 'cólera morbus', para que intercedesse junto aos céus e livrasse a cidade da peste. O santo teria atendido ao pedido.

   Na verdade, o governo da época, Antonio Luis Telo de Meneses, o Marques das Minas, adotou algumas medidas saneadoras e as mortes dimuniram e depois cessaram.

   Os jesuitas, sempre oportunistas, encabeçaram um movimento popular e pressionaram o Senado da Câmara para que São Francisco Xavier fosse declarado padroeiro da cidade, o que aconteceu por bula papal de 10 de maio de 1686.

   A população até hoje, nunca comemorou essa data, que se resume a uma procissão mixórdia realizada por vereadores entre a Câmara e a Catedral Jesuitica da Sé onde existe uma imagem de São Francisco Xavier, com apenas a parte do tronco e da cabeça.

   E quem é esse tal de São Francisco Xabier?

   Nasceu na Espanha, Navarra (hoje, área do país Basco), no castelo de uma das familias mais aristrocratas da localidade, no ano de 1506, e foi batizado com o nome de Francisco de Jasso Azpilcueta Atondo y Azanáres. 

   Era o filho mais novo de Juan de Jasso, ministro das Finanças da Corte de Dom João III, de Navarra, e de Maria Azpilcueta, senhora dos palácios e vilas de Azpilcueta e Xavier.

   Daí vem seu nome Francisco de Xavier (e não Francisco Xavier), originário dessas terras. Francisco, no entanto, desempenhou seu padroado em território português.

   Em 15 de agosto de 1534, Inácio de Loyola, Francisco Xavier (grafia em português), Pedro Fabro, Alfonso Salmeron, Diego Laynez, Nicolau Bobedilla e Simão Rodrigues, fizeram votos de castidade na capela de Saint-Denis, Montemart, Paris, colocando-se a disposição do papa para onde houver necessidade e fundaram (ainda sem saber) a Companhia de Jesus, congregação religiosa destinada ao ensino, à conversão e à caridade.

   O reconhecimento papal aconteceu em 1541. Em 24 de junho de 1537, Francisco de Xavier é ordenado padre. Exerceu seu padroado no Oriente, especialmente na Índia e no Japão, depois na China, onde morreu. Seu restos mortais se encontram em Goa, na Basílica de Bom Jesus de Goa, Índia. 

   Éconsiderado o apóstolo do Oriente e a igreja católica considera que tenha convertido mais pessoas ao cristianismo do que qualquer outra.

   Em resumo essa é a história de São Francisco de Xavier (em espanhol) ou São Francisco Xavier (aportuguesado) e não tem nenhuma relação com a cidade do Salvador.

   E Santo Antônio qual a realação com a cidade?

   Uma relação enorme com a cidade e sua gente. O bairro da Mouraria (dos mouros) nasceu sob a égipe de Santo Antônio da Mouraria e lá existe uma igreja belissima desde o século XVII. O Santo Antonio Além do Carmo também floresceu graças aos devotos do santos que já não cabiam na Mouraria e no centro antigo, e lá tem outra igreja e devotos do santo.

   O Convento de São Francisco - faz referência a São Francisco de Assis, contemporâneo do peregrino Antônio, nascido em Lisboa, no século XII (Fernando de Bulhões, o santo Antonio nasceu em Lisbo no dia 15 de agosto de 1195). 

   O Santo Antônio da Barra tem toda sua história ligada a cidade do Salvador desde a época da existência do Caminho do Conselho (hoje, Ladeira da Barra).

   Só isso aí já justificaria retornar Santo Antônio como padroeiro da cidade, patrono do Afoxé Filhos de Gandhy, santo do pãozinho, dos pobres, dos ricos e das donzelas.
   Além do mais é um santo popular, casamenteiro, querido, amado, reverenciado.