A Implantação de Bibliotecas Públicas Municipais

Vânia Queirós
13/03/2014 às 17:54
  Várias equipes de servidores públicos do estado da Bahia, lotados na Fundação Pedro Calmon, vinculada à Secretaria de Cultura do Estado, deixaram, por alguns dias, durante quatro anos, em semanas e meses alternados, o aconchego dos seus lares, seus filhos, companheiros, colegas, amigos e familiares. Saíram da sua zona de conforto e a rotina do cotidiano da capital se transformava, dando espaço para novas vivências, novos conhecimentos e atividades profissionais. Participaram de um programa nacional do governo que objetiva a implantação de serviços bibliotecários em todo o território nacional, destacando o importante papel que as bibliotecas públicas têm dentro de uma comunidade. 
       
     O programa de abrangência nacional não é muito conhecido na medida da sua importância, principalmente pelos habitantes das capitais, que desconhecem o Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas do Brasil, vinculado ao Ministério da Cultura. O programa consiste numa parceria entre as três esferas de administração – federal, estadual e municipal e é coordenado pelo Sistema Nacional (SNBP) instituído em 1992 pelo decreto presidencial n°520, de 13/05/1992, em substituição ao antigo Instituto Nacional do Livro - INL. Em cada unidade federativa existe uma coordenadoria vinculada ao SNBP.
     
      O Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas (SNBP) tem por objetivo desencadear uma ação articulada junto aos estados e municípios, com vistas à ampliação do número de bibliotecas públicas e a melhoria dos serviços de acesso à leitura e à informação a todos os cidadãos brasileiros. É responsável pelo gerenciamento das informações sobre a situação das bibliotecas públicas no país e pelo monitoramento e avaliação dos investimentos na área. Trabalha de maneira articulada com os Sistemas Estaduais de Bibliotecas Públicas (SEBP). Cada estado brasileiro possui uma coordenadoria para atender as demandas locais. Tanto o SNBP quanto os SEBPs oferecem assessoria técnica em questões referentes aos espaços, infraestrutura, serviços e formação de pessoal de bibliotecas.
       
    A participação de cada esfera governamental é delimitada, cada um com a sua colaboração específica : a Federal fortalece o acervo das bibliotecas com a doação, em sistema de comodato, de novos livros de todas as áreas do conhecimento e com a melhoria das instalações através da entrega de mobiliário, como estantes, mesas e cadeiras e equipamentos de multimídia como aparelho de DVD, de som, televisão, computadores (com o programa BIblivre já incluído) e livros em áudio e vídeo.  A Estadual – com o assessoramento técnico – equipes de profissionais bibliotecários e auxiliares capacitam a equipe do município contemplado, organizando o espaço dentro dos padrões técnicos e o governo Municipal que se responsabiliza pela sede física da biblioteca e da equipe de profissionais encarregada de gerenciar a mesma.

          Envolvidos no cumprimento de uma missão percorríamos alguns milhares de quilômetros de estradas, algumas bem conservadas e outras sem nenhuma pavimentação asfáltica, com um só objetivo: cumprir a meta do governo federal de implantar bibliotecas públicas nos municípios de todo o país, no nosso caso aqui na Bahia. Ao ser convidada para integrar as equipes de viagens para desenvolver o programa do governo não pestanejei, pois sempre almejei ter alguma atividade laboral em comunidades não muito urbanas. Comunidades geralmente carentes de opções de lazer e cultura, mas onde encontramos pessoas ávidas de informação e do desejo de ter uma ferramenta cultural do porte de uma biblioteca em suas cidades. 

         Desafio lançado, saíamos em busca do cumprimento da tarefa que nos era estabelecida. No papel talvez pode parecer fácil, mas a tarefa árdua, embora gratificante nos colocou diante de realidades diferentes. Existem municípios de economias e portes diferenciados. Dentro desse contexto as dificuldades estavam sempre presentes em maior ou menor escala. Nem todos os municípios contemplados ofereciam as mesmas condições para que o trabalho fosse efetivado. O aspecto físico se apresentava como o mais dificultoso. Assim encontramos espaços grandes, médios e minúsculos (tipo uma garagem) sem ventilação e iluminação adequadas, instalações em andares superiores (e aí como os portadores de necessidades especiais conseguiriam frequentar a biblioteca ?)  sem pontos de instalação elétrica suficientes e por aí vai. 
        
          No entanto, as providências e soluções eram agilizadas, pois o prazo de uma semana para a capacitação técnica (catalogar, classificar e etiquetar livros), fazer o treinamento no sistema Biblivre, fazer o layout do espaço e organizá-lo ia se esvaindo. As 8 horas de trabalho geralmente eram prolongadas mais um pouco e os finais de semana sem shoppings, praias, almoço com a família e amigos receberam uma nova roupagem. Trabalho e um quarto de hotel, um bate-papo na praça, ida a igreja para assistir a missa de domingo e vez por outra, quando coincidia, apreciar uma festa na cidade ou naquela mais próxima e até voltar a ser criança e assistir um espetáculo do circo que fazia temporada na cidade. 
          Quanto ao aspecto das relações humanas, posso dizer que esse superou nossas expectativas, pois o esforço e a dedicação dos profissionais integrantes das equipes que treinávamos nos impulsionava a continuar na missão. Lógico que sempre tem aqueles que absorvem o conhecimento com maior facilidade. A esses foi dada a missão de serem multiplicadores. A todos o nosso obrigada pela parceria constante. O contato com alguns ainda é mantido através das redes sociais. 

        Ressalto aqui um dos pontos positivos do que chamo carinhosamente de “empreitada” da Gerência Estadual do Sistema de Bibliotecas - GESB, a gerência da Fundação Pedro Calmon, responsável pela coordenação de todo o trabalho, o de articular a formação equipes de viagem. Existiu a partir daí o estreitamento do coleguismo, da amizade, da cumplicidade e da alegria de realizar um trabalho de pouca visibilidade, mas de tamanha grandeza profissional.
No total, atingimos todos os municípios do estado, contemplados com o programa, o que resulta na contribuição e formação de um público leitor em um país com problemas educacionais. É muito prazeroso ter contribuído para a implantação de um serviço de informação e construção do saber, formando cidadãos mais conscientes do seu papel dentro da sociedade. Um público leitor em um país com problemas educacionais e culturais emergentes.

          À medida que a biblioteca pública se vincular adequadamente com a comunidade, ela passará a ser o caminho que possibilitará a participação efetiva na sociedade da informação. O acesso à informação, nos novos tempos, significa o investimento adequado para diminuir as desigualdades sociais e as formas de dominação que prevaleceram na história contemporânea.

* Vânia Queirós Gonçalves é bibliotecária e jornalista.