Muito mais que bom senso

Nara Franco
08/12/2013 às 21:32
Fim do Campeonato Brasileiro e o grande campeão, além do Cruzeiro, foi o movimento Bom Senso F.C., liderado pelo zagueiro do Corinthians, Paulo Andre. Pela primeira vez na história desse país, como diria o ex-presidente Lula, jogadores de futebol entraram na pauta da imprensa não por seus carros ou namoradas. Acho que só na época da Democracia Corinthiana vimos uma leva de atletas com tamanha consciência sobre os direitos e deveres de clubes, jogadores e entidades esportivas. Explica muito o fato de a maioria deles ter passado anos na Europa e ter visto como o futebol pode e deve funcionar como negócio e entretenimento.

Nosso calendário é pesado, nossos clubes não pagam impostos e, muitas vezes, sequer honram com os salários de seus profissionais. Nossos jogadores são moeda de troca aos 12, 13 anos e a televisão dita horários e regras. A cereja do bolo de tamanha zona, que a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) parece não ver ou simplesmente não tomar conhecimento, foi a pancadaria entre torcedores de Atlético-PR e Vasco, em Joinville, que fechou a temporada com cenas deploráveis da mais pura selvageria.

O maior torneio do país chegou ao fim com imagens de descaso. Descaso com quem gosta de futebol. Parafrasendo o jornalista André Rizek, do canal SPORTV, Fluminense e Vasco caíram para a segunda divisão, mas o grande rebaixo foi o futebol brasileiro. Completo: e a manada de incompetentes que o "organiza".

Este ano, presenciamos brigas no estádio Mané Garrincha entre torcedores de Vasco e Corinthias, torcedores do Flamengo e São Paulo. A festa da vitória do Cruzeiro transformou Belo Horizonte em uma praça de guerra. O Atlético-PR fechou o campeonato em Joinville justamente por conta de uma confusão entre torcedores no clássico contra o Coritiba. Ou seja, a pancadaria comeu solta e nossas autoridades fecharam os olhos.

O país do futebol não respeita o Estatuto do Torcedor, os lugares marcados nos estádios, a venda de ingressos, a fila, o preço, a entrada, a saída. Não respeita nada. O Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) passa a temporada julgando frase aleatórias de jogadores, cartões amarelos e expulsões, mas procurar uma solução  para o problema da impunidade, cadê?

Quatro torcedores em coma no jogo de hoje, suposta superlotação na final da Copa do Brasil, cambistas em todas as partidas, torcedores do Corinthians tratados como pobres coitados para, logo na primeira semana de Brasil, serem flagrados fazendo o que sabem fazer de melhor: brigar em estádios. Alguém foi preso? Não. Algum clube foi punido? Não.

Penso duas, três vezes antes de ir a um estádio de futebol. Tenho medo de brigas, da violência gratuita que pessoas desprovidas de qualquer senso de civilidade possam me causar. É triste constatar a ineficácia do Brasil em fazer funcionar qualquer coisa que seja. Mais triste ainda é ver ex-jogadores como Cafu e Ronaldo, ao lado do Ministro dos Esportes, saudando nosso "jeitinho" como se boa coisa ele fosse.

No ano da Copa do Mundo, vamos torcer para que o Bom Senso F.C traga muito mais que bom senso aos nossos dirigentes e mandatários. Traga a capacidade de organizar um esporte que gera milhões: milhões em paixão, mas também em emprego, renda e qualidade de vida. Que, em rede nacional, a bola não seja coadjuvante das cenas selvagens que vimos hoje. Que os supostos torcedores, que na verdade são bandidos, sejam punidos, banidos dos estádios. Que os clubes - de fato - sejam responsabilizados pela insensatez de suas torcidas. Assim como na Europa, sejam eliminados de torneios e sintam no bolso a consequencia de terem ao seu lado torcidas organizadas, que nada mais são que facções criminosas.

Que dirigentes não usem a situação de um time para justificar o prosseguimento de um jogo sem qualquer tipo de garantia de segurança para torcedores e jogadores, como fez hoje o diretor do Atlético-PR. A prioridade sempre deve ser a vida. Nunca o resultado esportivo.

Que em 2014 as manchetes esportivas sejam sobre os astros da bola e não sobre a violência.