Causos & Lendas
Lobisomem de Serrinha
11/10/2020 às  20:31

LUBI COME CUSCUZ SERTANEJO E QUER PRODUZIR BIFE 3D EM SERRINHA

Lubi diz que vai produzir até mulher em silicone na na Serra Design Industry


Acordamos cedo, como de hábito, tirei leite da Mimosa e de outras vaquinhas que tenho no meu sitio, meu lar doce lar, enquanto minha esposa Ester cuidava de preparar um cuscuz nordestino servido com leite de coco e ovos das pedrezes do quintal, pão de Limeirinha e chouriços dos netos do Novaes, a senhora suando em bicas, pois, por tradição ainda tritura o milho seco num moinho manual, depois peneira o moído, a fubá, adiciona água e sal deixa a descansar por 30 minutos e só então põe a massa no cuscuzeiro.

Técnica artesanal com a parte baixa do cuscuzeiro contendo água fervendo, ralo vaporizador com peneira em furos no intermezo, colocando a massa com as mãos deixando-a a cozinha por 15 a 20 minutos. A tampa tremeu, o nordestino cheirou, tirou.

Claro, eu também fazia minha parte torrando grãos do café Gonzaga na bolinha em trempe de lenha com fogo médio, depois moendo os granulados em moinho manual e posto em chaleira com água fervendo.

Estou nessa labuta, que é diária, liga-me o poeta Serafim Alves todo satisfeito, eufórico, a informar-me que a poeta americana de origem húngara Louise Gluck, portanto, nossa parente, ganhara o Nobel de Literatura acrescentando ao meu tosco conhecimento que a poesia da gringa faz da existência individual algo universal.

Eu sem entender patativa desse ensinamento diante de minha pouca leitura, com o fone preso entre o ouvido e ombro para não cair e com a outra mão tentando coar o café quando o aro do coador despencou e dei um berro: - Socorro, Ester, o coador quebrou E o café está perdido, ou quase.

Serafim, ao ouvir meu pedido de SOS, comentou: - Não me diga, nobre Lubi, que a essa altura do século XXI com máquinas de café expresso, cápsulas de todo tipo de café à venda em qualquer supermercado, do Eliseu ao Chama, ainda estás a coar café...

- Tradição, meu caro poeta, a Ester moe o milho para o cuscuz e produzo o café, mas, quase queimo os braços diante do defeito no coador.

- Isso é um absurdo, destacou o vate do outro lado da linha, há fubás Tabajara e outras no Barbosa, no Assaí, nas vendas do Mercado Municipal, as novas tecnologias estão aí para nos beneficiar. Moer milho e torrar café na bolinha são coisas do tempo de Ruy Barbosa, de Machado de Assis. Vês que, anuncia a imprensa, agora teremos o nosso bife de cada dia, o filé de cada mes, a picanha de cada semestre, em máquinas 3D impressos.  

A Ester, que a tudo escutava e alertava que o cuscuz já estava posto na mesa, os ovos a brilhar, insinuou que eu mandasse o vate a pqp com todas suas tecnologias e mais a Gluck, tinha ajeitado o coador com um pedaço de arame, concluído o coamento do granulado com fragrância de Perseu, e o poeta do amendoim que fosse comer seus impressos com sal e pimenta. Pedi-lhe mais um instante e respondi ao poeta.

- O que será de nós com essas novas tecnologias que estão ocupando os espaços, em todos os campos, e agora vem vosmincê falando em bife, no nosso filé com fritas e ovo, em 3 D?

- Ora, meu venerado lubi, vamos aderir as novidades sem medo de ser feliz. Outro dia fui a uma lanchonete, aqui nos alpes serrinhenses, e o nugets era de papelão, uma delícia.

- Voltamos, então, ao tempo da II guerra mundial quando se comia ratos e eram de bom paladar?

- Não, nada disso, são novos tempos, bife impresso com gosto de filé; picanha com formato de picanha com a gordura nas bordas; peito de peru de primeira qualidade, adiantou Serafim.

Ponderei: - Os chineses já comeram quase todos os nossos jegues, dos alpes e além sertão, estão de olhos miúdos que têm, mas, graúdos de fome, em nossos cabritos e bodes; os ingleses levaram nosso ouro na época da colônia e os canadenses estão por acá explorando nosso ouro subterrâneo entre a Pedra e a Santa Luz; enquanto isso, o governo não traz nada de produtivo para nossa Serra, salvo o auxílio emergencial de Brasília, e ambulâncias e carros de polícia do estadual; de maneira que, se não abrirmos os olhos, estaremos fritos.

- Cozidos e fritos já estamos. A diária de um pedreiro está custando quase 1 guará e pra pintar um portão aqui de casa gastei 3 guarás. Com as TIs e o conhecimento profundo, a robótica, um robô vai pintar o portão.

- Seja mais claro, me familiarize com essa linguagem perdoe a minha ignorância: o que são TIs e esse tal de conhecimento profundo.

- As Tecnologias da Informação, dos computadores, da internet, dos robôs, das pipetas para tirar leite, das geladeiras inteligentes que falam, da robótica que produz válvulas para o coração, dedos, orelhas, uma maravilha.

- Que loucura. Diz-me que posso trocar minhas orelhas de abano e que tenho de aposentar o tamborete para tirar leite?

- Sem dúvida. Pipetas elétricas para tirar leite são mais produtivas. Sabe o que aconteceu em Dubai, recentemente? Uma construtora reuniu impressoras 3D de vários tamanhos e ergueu um prédio de dois andares em 16 dias. E vocês sabe quanto tempo levou o mestre Fernando da Chapada para erguer um prédio nosso na Serra, de dois andares, mais de 1 ano. 

- Que maravilha deve ser. Em Pindorama essas novidades demoram muitos anos para chegar. 

- Nada. Organizemos uma sociedade e vamos fazer casas impressas em 3D na Serra Home e comprar uma impressora da redefine Meat, de Israel, que, com uma combinação de plantas e moléculas bovinas produziremos 20 k de file por hora na Serra Meat Gorumet. Ficaremos ricos, meu mentor.

- Mas, com isso podemos quebrar nossa turma do Matadouro e não é bom. O que faremos com nossos nelores e zebus, com nossas fateiras, nossos magarefes?

- Esse será um problema do messias, do governo em Goias Velho, do Costa, do Silva e não nosso. Não podemos parar o progresso e ficar fazendo vitaminas de bananas como no tempo de Gó do Abrigo, café com bolo como na época de Agripina, consertar TV como na era de Joel, remendar bicicletas como o Bié fazia, cortar cabelos como a Camiá. Isso tudo será trabalho para nossos robôs. Entregaremos vitaminas de bananas enlatadas na porta dos clientes e bolos com mais de mil sabores em capsulas.

A Ester, impaciente com o alongar de minha conversa com o poeta, bateu a colher de pau na mesa e disse: - Acabou seu tempo. O cuscuz tá ficando frio e os ovos enrugados. Desliguei o fone e sentei-me à mesa.

- Ora, estava a me atualizar das coisas do mundo com o poeta Serafim e diria, para a madame se acalmar, que ficaremos ricos com as novas tecnologias, com o conhecimento profundo, a robótica - soletrei o que me disse o vale.

- Só rindo dessas duas almas penadas. Minha cortina está com o black-out todo furado pelo sol e v não conserta, o coador tá remendado com arame, minha máquina de costurar tá com o correia do pedal quebrada, a TV tá ciscando, o sofá afundando, o lustre estourado, a tampa do vaso sanitário lascada e vem falar em robótica. Me poupe. 

- Tudo isso será resolvido por nossos robôs. Vamos produzir bifes impressos, casas impressas, a nossa cozinha será hight tech, máquina Npress para o café, multiprocessadores, fogão elétrico, sofá prime magno, lustre cristal de 45 braços, vaso sanitário inteligente. E vamos alem com a Serra Design Industry produzindo armas e joias tudo impressas em 3D.

- Daqui a pouco você vai dizer que produzirá uma mulher de silicone como aqueles que são vendidas no Japão e me trocar por uma Yakamoto Doll?

- Trocar você, minha rainha, minha Afrodite, minha Deusa dos Alpes, jamais. Agora, produzir mulheres de silicone tão reais como as humanas, isso, sem dúvida, diria, melhores, mais belas e sensuais do que as japonesas.

  Entusiasmado, nessa prosa, engasguei com um pedaço do cuscuz com ovo, comecei a tossir sem parar, a Ester mandou eu levantar os braços, deu dois tapões nas minhas costas com uma colher de pau e voltei ao normal. Depois, pregou a chaleira, colocou mais um pouco do Perseu na minha xícara e disse:

- Cadê seu robô? Cadê suas novas tecnologias? Não fosse "Marieta', minha colher de pau, v ia era pra Vênus. Como diz sua neta Sol, ponto final meu rapaz. Vá catar as acerolas com o balde e fazer o requeijão como sempre fez, na mão grande.


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