Saúde

Sangue na urina é um dos sinais do câncer de bexiga

Tratamento cirúrgico da doença pode ser feito nas modalidades aberta, laparoscópica e robótica
Carla Santana , Salvador | 23/11/2020 às 12:23
Sangue na urina é um dos sinais do câncer de bexiga
Foto: divulgação
O mestre de obras Edelmir Cerqueira Belo (61), morador do município baiano de Iraquara, localizado na Chapada Diamantina a cerca de 530 quilômetros de Salvador, jamais imaginou que pudesse ter câncer de bexiga até que um dia, enquanto terminava a obra de um telhado, começou a sentir dores muito fortes na virilha e nas costas, além de perceber a presença de sangue na urina. Após passar por diversos exames - sangue, urina, ultrassom e biópsia, o diagnóstico foi confirmado. Como tinha contato regular com agrotóxicos sem a devida proteção, é possível que esta tenha sido a causa da doença, que também tem o tabagismo como um forte fator de risco. O tratamento incluiu três procedimentos cirúrgicos, sendo duas raspagens iniciais (ressecções transuretrais) e, por último, a cistectomia radical, ou seja, retirada total do órgão seguida pela construção de uma neobexiga para garantir o fluxo e o armazenamento da urina. “Hoje em dia, cada manhã é um motivo para eu agradecer por estar vivo e com saúde. Graças a Deus e à ciência, minha vida foi salva”,  declarou.

O câncer de bexiga é a segunda neoplasia do trato urinário mais frequente entre os homens, atrás apenas do câncer de próstata. No Brasil, a estimativa anual de casos é de 10.640, sendo 7.590 em homens e 3.050 em mulheres. Na Bahia, o Instituto Nacional do Câncer (INCA) estimou 470 diagnósticos do início até o final deste ano, sendo 320 em homens e 150 em mulheres. Seus sintomas, pouco conhecidos, podem ser silenciosos, fato que pode levar ao diagnóstico tardio da doença e reduzir as chances de sucesso do tratamento. Os sinais também podem ser confundidos com os de outras enfermidades, como a infecção urinária. Além da presença de sangue na urina, dor durante o ato de urinar e a necessidade frequente de “fazer xixi”, mesmo sem a bexiga estar cheia, são alguns dos principais sinais de alerta para que a pessoa busque um especialista. 

A melhor forma de prevenção é o fim do tabagismo, já que o cigarro está associado à doença em 50 a 70% dos casos. Homens brancos e de idade avançada são o grupo com maior probabilidade de desenvolver câncer de bexiga. Outro fator de risco é a exposição ocupacional a compostos químicos como aminas aromáticas e hidrocarbonetos policíclicos presentes em indústrias de corantes, tinturas e derivados de petróleo. A descoberta do tumor pode ser feita através de exames de urina e de imagem, como tomografia computadorizada e cistoscopia (investigação interna da bexiga por um instrumento dotado de câmera). Durante este exame, podem ser retiradas células para biópsia, a fim de confirmar o diagnóstico. A escolha do tratamento depende de fatores como idade do paciente, estadiamento (estágio do tumor), gravidade dos sintomas e tipo de tumor.

Cirurgia - Quando o tratamento cirúrgico é o mais indicado, a cirurgia pode ser de três tipos: ressecção transuretral, mais conhecida como “raspagem da bexiga”, que é quando o médico remove o tumor por via uretral utilizando um bisturi elétrico; cistectomia parcial, que é a retirada de uma parte da bexiga; ou cistectomia radical, remoção completa da bexiga. “Neste caso, faz-se necessária a posterior construção de um novo órgão para armazenar a urina”, explicou o urologista Breno Dauster,  pioneiro da cistectomia radical laparoscópica na Bahia e integrante do Robótica Bahia - Assistência Multidisciplinar em Cirurgia. Após a remoção total do tumor, pode ser indicado administrar a vacina BCG dentro da bexiga para tentar evitar a recorrência da doença. 

Uma alternativa de tratamento é a radioterapia, que pode ser adotada em certos casos na tentativa de preservar a bexiga. A quimioterapia pode ser sistêmica (ingerida na forma de medicamentos ou injetada na veia) ou intravesical (aplicada diretamente na bexiga através de um tubo introduzido pela uretra). A cirurgia pode ser feita na modalidade aberta (convencional), laparoscópica ou robótica. No caso do câncer de bexiga músculo-invasivo, tipo potencialmente letal que requer tratamento agressivo, a cistectomia radical é o mais comumente indicado. “Os pacientes que se submetem à cirurgia de retirada total da bexiga precisam ter suas vias urinárias reconstruídas para garantir o fluxo da urina. As duas principais técnicas usadas na reconstrução são a neobexiga ortotópica e o conduto ileal, também conhecida como cirurgia de Bricker”, pontuou outro urologista do Robótica Bahia, Augusto Modesto . 

Cistectomia robótica - “Na cistectomia radical minimamente invasiva auxiliada por robô, a reconstrução da bexiga é facilitada e mais precisa pela liberdade de movimentos. Além disso, há mais segurança para o paciente, redução do tempo cirúrgico, menores riscos de sangramentos e de complicações pós-cirúrgicas como infecções”, destacou Modesto. A cirurgia robótica é indicada sobretudo para tratar os casos mais delicados e complexos, que antes estavam relacionados a cirurgias de altíssima complexidade e maiores riscos aos pacientes. “Como é menos invasiva, este tipo de cirurgia otimiza a recuperação do paciente após o procedimento”, completou o urologista. A visão tridimensional ampliada em dez vezes e a filtragem de tremores das mãos dos médicos contribuem para o aprimoramento nos resultados da cistectomia robótica. 

Um outro ponto relevante com o advento do robô, frisou Breno Dauster, é que a confecção da neobexiga ortotópica ou do conduto ileal torna-se mais fácil, agregando rapidez e segurança para o paciente. “Na técnica convencional (aberta), complicações como hérnias internas e complicações infecciosas podem mudar a evolução do pós-operatório  e aumentar o número de reabordagens e o tempo de internação”, destacou Dauster. “A ideia do acesso minimamente invasivo é não só aproveitar as pequenas incisões, mas toda a tecnologia da robótica (visão tridimensional; movimentação de pinças em 360 graus e maior conforto para o cirurgião) em prol da redução de complicações, realizando uma cirurgia menos mórbida, com melhores resultados oncológicos e funcionais”, completou o especialista, que é proctor (treinador de outros cirurgiões) em cirurgia robótica.

Urologistas do Grupo Robótica Bahia (RB) realizam cistectomias radicais por técnicas minimamente invasivas desde 2015, inicialmente laparoscópicas, tanto no Hospital São Rafael (HSR) quanto no Aristides Maltez, hospital de referência em tratamento de câncer na Bahia. A partir da chegada da plataforma robótica em Salvador há um ano e meio, integrantes do RB têm realizado as cirurgias robóticas de bexiga com reconstrução intracorpórea tanto no HSR quanto no Hospital Santa Izabel (HSI), que também adquiriu a tecnologia no ano passado. “As cirurgias robô assistidas são uma tendência sem volta no tratamento do câncer de bexiga devido aos benefícios agregados para o paciente e a redução da morbi-mortalidade”, concluiu o uro-oncologista Augusto Modesto.