Colunistas / Literatura
Rosa de Lima

ROSA DE LIMA COMENTA COLETÂNEA CONTOS "AS BAIANAS", CASARÃO DO VERBO

Livro bem baiano
29/04/2012 às 08:01
Foto: BJÁ
"As Baianas", 150 páginas, editado pela Casarão do Verbo
   As brasileiras, as cariocas, as mulheres, sempre elas. Foi assim, curtindo uma brincadeira depois de beberem Sérgio Porto, O Stanislaw Ponte Preta, que um grupo de escritores baianos (Carlos Barbosa, Elieser Cesar, Gustavo Rios, Lima Trindade, Mayrant Gallo e Tom Correia) presenteou os leitores com deliciosa coletânea de seis contos editados pela Casarão do Verbo, 150 páginas, "As Baianas", um brinde às mulheres baianas com peripécias que se passam na cidade do Salvador.

   São traços reveladores da identidade local colocados pelos autores com humor, passados em ambientes que são familiares aos nativos - Dique do Tororó, Corredor da Vitória, Santo Antônio Além do Carmo, Barris, Soledade, Cabula, Ondina, etc - o que faz com que nos aproximemos mais dos personagens, como se estivessemos vivendo uma delas em carne e osso.

   É muito interessante essa proximidade dos leitores com o ambiente em que vivem, muito diferente ao ler, por exemplo, "O Cemitério de Praga", de Umberto Eco; ou o Drácula dubliniano de James Joyce.

   Diria que cada um dos autores que compõe a coletânea tem seu próprio estilo, o que é natural, pois, ninguém nasce com o dom da mesma pena e narrativa. Eles, no entanto, se aproximam quando tratam de um tema geral, as mulheres da Bahia nesse contexto de "As Baianas", cada qual com seu charme, cada qual com sua percepção de vida, cada qual com seu traço, compondo um livro bom de ser lido, em gute-gute, um misto de contos com tempero de crônicas, em passagens que colocam a cidade da Bahia em permanente destaque, a mãe de tudo.

   Abre o volume o texto "A Bonnie dos Barris", de Mayrant Gallo, narrativa do desejo de uma provinciana em viver a aventura de "Bonnie e Clyde", casal de bandidos norte-americanos, o qual ficou famoso na década de 1930 por roubos a bancos e assassinatos de policiais nos EUA (Bonnie Elizabeth Parker e Clyde Barrow, imortalizados no filme de Arthur Penn). Os locais partilham desse sonho usando como cenário um posto de gasolina na Boca do Rio e um primo sequestrado e posto no porta-malas de um carro à beira mar, de uma narrativa bem pitoresca pelo desejo da fama e da glória permanentes, à moda baiana.

   Segue "A Guerreira da Lapinha", de Elieser Cesar, com narrativa de Quitéria, uma provável heroina à semelhança de Maria Quitéria, personagem que comete um crime matando um "portugalha", português de mercearia, o qual participa do roteiro à festa ao 2 de Julho, com todas passagens pitorescas ao desfile, até a lembrança do encontro entre a então prefeita Lidice da Mata e o governador ACM, com andanças pela velha cidade da Bahia - Lapinha, Soledade, São José, Boqueirão, Pelourinho e Cantina da Lua sendo detida no Campo Grande, ao pé do caboclo. Sugestivo e original.

    Em "A Santinha da Ribeira", de Tom Correia, na minha modesta opinião o mais criativo dos seis contos, Correia traz à sua memória e dos leitores passagens por uma Ribeira de sua infância e um arsenal de artifícios e chichês sobre a baianidade, a melhor delas "o povo vendendo alegrias engarrafadas" , para descever o encontro com a "Santinha", narrativa bem intimista com suas mágoas e recordações.

   Já em "A Periguete de Ondina", Lima Trindade segue por essa trilha com boa linguagem enveredada pelo mundo do Carnaval, narrando com picardia, o que é comum na Salvador de hoje, o esforço de uma periguete para conquistar a pulseirinha de um camarote, o mais chique deles, de La Mercury, a Daniela. Trindade cria todo um enredo com personagens vinculados a periguete, um amante e um amado, amor e sexco, o que faz com que a periguete conquista uma pulseirinha falsa e seja barrada no baile.

   Em "A Putinha da Vitória", Carlos Barbosa nos brinda com um personagem também muito comum nos dias atuais, a garota de programa da classe média alta, a qual vive o drama shakespereano de ser ou não ser (puta), mesclando nesse cenário o contrastre das mansões e apartamentos de luxo do Corredor da Vitória e o Restaurante Universitário da UFBA com passagens pelas redes sociais. Plíno, o Sempre Moço e sua Betina são um traço de uma realidade bem presente na sociedade baiana atual.

   Por fim, "A Noivinha do Cabula", de Gustavo Rios, o mais sofiosticado deles em linguagem e metáforas, uma tragédia, uma vida como ela é, a sombra de carregar um destino.

    Quem ainda não teve a oportunidade de conhecer "As Baianas" recomendo apressar o passo.