Colunistas / Filosofia Popular
Rasta do Pelô

RASTA DO PELÔ troca panetone irmã Dulce por italiano e se dá mal

Badu, o intelectual de bigode, lhe ensinou a fazer tudo certinho para agradar a santa e a patroa do Rasta, mas o danado esqueceu de retirar a embalagem plástica da venerável.
14/12/2012 às 13:04
 Posso garantir que a ceia de Natal aqui de Casa está quase pronta. O básico já comprei, inclusive o queijo Jong e o presunto da Sadia, para não ter uma "batalha de Itararé", e a mulher arrepiar.

   Diria que, nem tanto, pois, ainda assim vive a resmungar pela sala dizendo que eu deveria deixar a casquinhagem, porque, segundo ela, "ninguém leva nada para o céu" (ainda bem que não me colocou no inferno ou na ante-sala, o purgatório), e comprar um panetone Bauduco de lata ou um italiano na Cacau Show. Vive arreliando com o panetone da Irmã Dulce que adquiri. Um, não, diga-se dois panetones com a efígie da imaculada dos pobres.

   - Já lhe disse que este panetone é abençoado pela venerável e de ótima qualidade - rebati suas insinuações.

   - Que seja, agora, no Natal, a gente merecia uma coisa melhor, um italiano que nunca provei e dizem que é sensacional ou um daqueles de lata - ouvi a dita falar tricotando uma boina.

   - Você tá querendo demais. Se comprasse um desses não viria o jong e as passas. Dinheiro está pela hora da morte - completei sinalizando que, pior seria se tivesse comprado o panetone da padaria de Pepe dos Pobres, todo troncho parecendo uma bola de futebol de couro murcha.

   - Se você chegasse aqui com um panetone desses eu enfiava era no seu fiofó porque me mato, costuro boinas aqui até tarde, faço tererê o dia todo, e você fica só com esse tamborim que não leva a nada, mas dinheiro tem pra tomar cerveja, retou.

   - Você acha pouco eu ficar o dia todo naquele Pelourinho, sol a sol, chuva a chuva, vendendo suas boinas para a turistada!, questionei aduzindo que, agora, no período do Natal, infelizmente ninguém contrata percussionista, mas que a época boa tá chegando com o verão e o Carnaval.

   - Boa pra suas quengas que não vejo crescimento do capilé nesse período e você fica é mais magro, perdendo noites e quem sabe fazendo miséria por aí, me provocou.

   - Sai daí doida cheirosa que sou homem direito. Pergunte ao maestro Reginaldo se ando fora da linha. Pergunte a Arerê. Pergunte a Paulinho Camafeu. Pergunte a Edil Pacheco, a qualquer um dos que me contratam, zanguei e só não fui ao Flor da Manacá tomar um goró de desonra porque já era tarde de noite.

   - Sabe de uma coisa, não venha desviar a conversa. O que quero mesmo é um panetone italiano com todo respeito a venerável irmã santa dos pobres e disso não abro mão. Você que coma com os meninos esse aí (me atiçou o panetone) que só aceito um italiano.

   - Tá bom, concordei para que a casa não fosse abaixo, pensando como adquirir tal troféu. 

   No dia seguinte, cedo, ao me deslocar para o trabalho, ainda no ônibus liguei para Badu, o intelectual de bigode, meu guru, pedindo socorro, um aconselhamento.

   -Estou numa fria da zorra. Comprei um panetone da venerável irmã Dulce e a mulher só quer um italiano, comentei.

   -Não seja louco. Se você trocar esse panetone a irmã Dulce pode lhe castigar, lhe jogar uma praga! - advertiu-me Badu.

   -Onde já se viu santa jogar praga em alguém. Tá ficando biruta, lelé? - perguntei.

   - Joga sim. No ano de 1350 um chefe polaco ia a Roma e parou em Pádua para visitar a Igreja de São Prosdócimo quando alguém do seu séquito gracejou com Santo Antônio dizendo que "era o santo cuja honra se suspendem campainhas no pecoço dos porcos" e, mal acabou de falar. sua mão e sua boa ficaram tortas, e foi coisa do santo.

   -Vixe! -admirei. E daí?

   -Daí que o chefe polaco levou o sacripanta até o túmulo do santo e este pediu perdão e ficou com a boa boa de novo, aduziu completando: "Já pensou v ficar com a boca torta ou sem tesão".

   -Ô misericordia, faço o que então.

   -Vá numa dessas papelarias chiques, compre uma caixa de papelão e mande gravar "Made in Italy" bem vistoso, e dentro da caixa ponha um panotone da venerável. Vai resolver seu problema, completou.

   - Grande ideia, amigo vou fazer isso.
Saltei no ponto do Shopping Piedade e comprei a dita caixa, levei-a até o Taboão e mandei gravar na tipografia de Benedito Caçuá, em dourado, as inscrições: Panetone Marconi, Made in Italy. Ainda pensei em consultar o jornalista Pig, mas, como o camarada agora é autoridade, não iria importuná-lo por bobagem.

   Chegei em casa, à noite, todo serelepe e entreguei o mimo a patroa, todo arrumadinho, parecendo até um chocolate da Copenhague. 

   Diabos me lambam tanto os beijos que recebi, a mulher mais cheirosa do que dona Socorro, a dona do salão de beleza aqui do bairro. 

   Minutos depois, já acomodado no sofá assistindo Ratinho recebi foi a caixa italiana com panetone e tudo nas fuças.

   - Devia era ter vergonha na cara e pelo menos retirar o plástico da venerável Dulce que embala o panetone.