Crônicas de Copacabana
Nara Franco
01/07/2017 às  12:00

Uma tarde no Mundial e a guerra

Mundial x Guanabara e o aniversário que para a cidade com Ivete Sangalo de garota propaganda


 O Rio de Janeiro é uma cidade tão única que você pode ir ao supermercado e, ao sair, se deparar com uma cena de guerra. Para quem acompanhou o noticiário na quarta-feira, dia 28, viu que Copacabana parou por conta de uma operação policial na comunidade Pavão-Pavãozinho. Eu moro antes da favela e minha participação na nossa desgraça de cada dia é auditiva. Quando há confronto eu ouço os tiros em casa. Meus amigos me avisaram pelo whatsapp do ocorrido quando eu saía de outra guerra particular de Copacabana: ir ao Mundial.

Não sei em qual momento ir ao supermercado virou uma missão de guerra no Rio de Janeiro. Ir ao Mundial ou ao seu concorrente Guanabara demanda tempo, disposição e paciência. Qual será a versão baiana para tal fenômeno? Me digam depois.

Explico: Mundial e Guanabara são supermercados com preços extremamente baratos. Tal fato causa nas pessoas um comportamento estranho que tenho dificuldade em classificar. É como se você entrasse em um mundo paralelo daqueles que a gente vê em filmes como "A Lenda" ou "Guerra Mundial Z". A Terra está acabando, os zumbis estão chegando e toda a comida existente vai acabar. Não é exagero ou metáfora. É a realidade dos fatos.

O Aniversário Guanabara, que tem como garota propaganda a cantora Ivete Sangalo, para a cidade. Para mesmo. As filas de estacionamento são tão grandes que engarrafam avenidas. Já foi matéria no Jornal Nacional, rende uma quantidade sem fim de memes na Internet e já foi estudado em teses de mestrado e doutorado. Tem gente que gosta tanto que faz aniversário com o tema "Guanabara". A primeira semana do aniversário é digna de UFC. Minha manicure me disse certa vez que na Zona Norte virou um "programa" sair no tapa no supermercado daqueles que você comenta com orgulho na mesa do bar. 

Em Copacabana não é diferente. É Zona Sul, é bairro nobre, mas baixaria é baixaria é igual em qualquer lugar do mundo. O Mundial de Copa, que era xexelento, passou por obras de modernização. Ficou fechado durante dois anos. Ficamos órfãos. Confesso que eu não ia muito porque o local era insalubre. Mas muitas vezes me peguei suspirando por ele. Nas filas dos outros mercados várias veze comentários surgiam. "Que falta faz o Mundial...".

Quando ele abriu foi uma festa! As senhorinhas de Copa botaram roupa nova e tudo. Parou a Rua Barata Ribeiro, a segunda mais importante do bairro. Claro que eu me animei. E aí chegamos ao planejamento. Ir ao Mundial não pode ser em qualquer dia. Até o dia 15 do mês é melhor ir de capacete, botas e arma de choque. Juro por Deus que já presenciei briga de senhoras por causa de Nuggets anunciados a R$ 3,99. É o Vietnã. JAMAIS (em caixa alta mesmo) ir em um sábado à tarde. É como entrar no Morro do Alemão à noite em um carro escuro. Domingo é vetado. Proibitivo. Depois do dia 20 ainda é cheio, mas dá para andar sem batidas de carrinho no tornozelo a cada 1 minuto.

Tem que planejar o dia, o horário, como ir, como voltar. Porque de repente vem um promoção relâmpago e você se pega correndo como Usian Bolt na busca por um azeite a R$ 10. É como um vírus que toma a gente assim que se cruza a entrada. Já vi, e juro de novo, dois homens saírem com sacos de linguiça para um batalhão. Duvido que um dos dois tivesse geladeira para armazenar tamanha quantidade.

Estive lá no dia 28. Dia ótimo. Fim de mês, todo mundo duro. Fui no meio da tarde. Naquela hora que as domésticas já fizeram o almoço, as velhinhas estão tirando o cochilo da tarde. Foi lindo. Corredores apenas cheios. Promoção relâmpago de cerveja gold sei lá o que. Aquela que ninguém compra. Fila com final visível!! Que delícia. Você se sente vitorioso, esperto demais.

Claro que sempre vai ter uma briga. Porque sem briga não é o Mundial. Dessa vez uma mulher na fila, empacada por conta de um carregamento de leite, mandou alguém tomar naquele lugar porque não alcançava o pão. Pura bobagem, quase briga de criança. Catei minha caixa de leite a R$ 2,49, o X-14 em promoção e muitas outras coisas para encarar a fila. Papo vai, papo vem, um homem atrás de mim me deu a dica de uma vida:

- Hora boa de vir é às oito da noite. As mulheres todas estão vendo novela e esquecem disso aqui.

No jargão jornalístico isso é um "lead", ou seja, o melhor da notícia. Tá certo que tinha muito homem na fila e não vou discutir igualdade de gênero no mercado. Concordei com a cabeça e guardei a informação a sete chaves. Na próxima ida eu conto se deu certo ou não.


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