Cultura

A CADEIRA E O ALGORITMO CAP 15: A CIDADE ONDE CONVIVEM O NOVO E VELHO

A harmonização entre as novas tecnologias e as velhas, sem atropelos, sem correria
Tasso Franco , Salvador | 24/01/2022 às 10:01
O bondinho ainda resiste como meio de transporte em Lisboa
Foto: BJÁ

   Os meus leitores que tiveram a coragem de ler os primeiros capítulos de "A Cadeira e o Algoritmo" livro que estou publicando no site de literatura Wattpad.com certamente estarão em melhores condições do que os outros na leitura deste capítulo 15, para acompanharem a narrativa cuja temática abordada é a convivência harmônica entre as novas e as velhas tecnologias. 

  Como é possível no mundo atual da robótica, da TI (Tecnologia da Informação) e da IA (Inteligência Artificial) que estão modificando o comportamento do 'sapiens' no planeta sobreviver a esse turbilhão de inovações que seifa milhões de empregos e profissões e vai criando outros campos de trabalho - não tanto quanto os que vão ficando na estrada - e têm gerado uma série de problemas nas administrações das plantas produtivas e ampliado questões de natureza psicológica das mais diversas, tanto que a depressão já foi considerada a doença do século. 

  No capítulo 14 abordei o emblemático livro de Charles Darwin sobre "A Origem das Espécies" trabalho científico que, praticamente, criou o humanisno e diferenciou os homens dos animais, sepultando a tese teológica de que o homem fora uma criação divina, a partir do barro e a mulher da costela de Adão. E não cheguei a nenhuma conclusão - nem poderia chegar - diante de tema tão complexo, encerrando o capítulo mostrando que o desafio do século XXI é harmonizar essas duas convivências, do significado e do significante, do ser próprio e do Outro, nessa permanente luta do consciente com o insconsciente, largamente estudado por Freud, Jung, Lacan e outros psicanalistas e psiquiatras.

  Recentemente estive em Lisboa, capital de Portugal, cidade que entendo sua população consegue administrar o novo com o velho sem perder a ternura, sem se apavorar, sem correria, não que inexistam preocupações e questões que afetam a psiqué, mas sem que o governo central apresse o passo para eliminar as velhas formas de viver e adotar somente os modelos novos baseados no uso da internet e da robótica. 

  Por posto, hospedei-me num flat na praça Dom Luis I, o Building Lisbon que opera sem humanos salvo camareiras. Tudo o mais é realizado pela internet desde a reserva, o acesso ao local, o elevador, o corredor dos apartamentos e o quarto em que se hospeda. Há, na entrada do flat um aviso em banner metálico escrito em 3 línguas - portugues, inglês e francês - dando as boas vindas aos hóspedes e como proceder. 

  Os hospedes recebem um código pela internet assim que fazem a reserva e ao chegarem no flat acessam um painel onde retira o cartão magnético que dá acesso ao elevador e ao apartamento. No check-out previamente acertado deixa o cartão magnético no painel e bye-bye. Não há humanos sequer na portaria para dar boas vindas.

  Veja o seguinte: em 2019 me hospedei neste mesmo flat e havia uma equipe de pessoas para dar boas vindas aos hospedes e levá-los até o aprtamento mostrando, em seguida, como funcionava o fogão elétrico à disposição da familia - copos, talheres, geladeira, cafeteira, etc. E, na portaria, 2 seguranças atuando dia e noite. Pois bem, dois anos depois, esses empregos desapareceram e tudo ficou automatizado. 

  A familia que se vire e abasteça o flat com produtos que gosta para o café da manhã e lanche à noite. Nas proximidades do flat há o Mercado da Ribeira, um supermercado e vários mercadinhos de indianos. 

  Em Lisboa ainda existem dezenas de pensões familiares cujas reservas são feitas pela internet, porém, é a familia que recebe os hospedes, o café da manhã é servida a moda portuguesa e algumas delas têm porteiros à noite toda e outras chaves normais de portas. E há os hotéis estrelados também com atendimento presencial. Ou seja, convive-se, assim, o novo com o velho.

  Um outro exemplo expressivo dessa relação - gravei um vídeo para meu canal do YouTube, Sêo Franco, abordando esse aspecto - está nos sistemas de transportes - público, privado e para turistas. 

  Lisboa moderniza-se, mas, não a ponto de eliminar seus históricos pequenos bondindos que já foram movidos por burros e cavalos e há mais de uma centena de anos são elétricos, o que já existiu na cidade do Salvador desde o final do séxulo XIX, depois os bondes elétricos nas décadas de 1940/1960 que faziam grande sucesso e atendiam linhas que se estendiam até a Barra e ao Rio Vermelho e foram retirados do mapa, sendo o único vestígio deles, ainda existente, uma pequena linha de trilhos na rua da Misericórdia posto a exposição pública nos primórdios do século XXI, gestão do prefeito Antonio Imbassahy.

  Lisboa, no entanto, mantém os bondinhos no Rossio, na Alfama, na Mouraria, na Baixa Pombalina, no Campo do Ourique, em Prazeres, na Misericórdia, no Carmo, na Marques de Pombal, com várias linhas usadas com muita frequência pela população. E, em contraste, com uso de novas tecnologias roda o VLF - Veiculo Leve Sobre Trilhos - em vários trechos da cidade, alguns deles, convivendo com os bondinhos. 

  É, provavelmente, um caso único na Europa o que remete, também, a São Francisco, na Califórnia, onda ainda existem, também.

  A população da capital portuguesa é servida por um metrô moderno com bilhetes vendidos em máquinas automatizadas e em guichês com humanos, trens metropolitanos, e táxis com novas tecnologias especialmente os veículos Citroen, Renault e Mercedes importados da França e da Alemanha. Portugal não tem indústria automobilistica dada a sua dimensão e população - 10 milhões de habitantes - menos 5 milhões do que a Bahia, Lisboa com 2.2 milhões de pessoas na rua Região Metropolitana e na planta central, histórica, pouco mais de 550 mil habitantes.

  A população também utiliza ônibus com carroceria tradicionais movidos a gás, os elétricos movidos com bateria de lítio e os a óleo diesel que estão sendo quase todos substituidos. Os antigos elétricos com aqueles imensas hastes presas a uma rede de fios como havia em Salvador, na cidade Baixa, nas décadas de 1960/1970, desapareceram dando lugar aos elétricos mais modernos e silenciosos sem as hastes metálicas e movidos a bateria.

  Há, portanto, uma harmonização, entre o novo e o velho extensiava, ainda, na área do turismo aos 'charriots' - Elevador da Santa Justa e os planos inclinados da Bica e do Carmo nos modelos antigos, e os veiculos Tesla chamados de "Tuk Tuk" - parecidos com os que existem na Praia do Forte - modernos, elétricos, com vários tipos de modelos para atender grupos de 6 a 8 turistas, 4 turistas e 2 turistas, a depender das familias. Atualmente, surgiu um novo modelo tipo cross que parece uma tartaruga ninja para casais.

  Lisboa é uma cidade com dois planos - a Baixa Pombalina e o bairro Alto - idêntica a Salvador com as duas cidades - a Baixa (a Península de Itapagipe) e a Alta, mas, seus ascensores, com custo médio de 5 euros por passagem ida e volta (R$35,00) são usados apenas pelos turistas. O uso dos "Tuk-Tuk" é feito com preço negociado valendo a pechincha que, é um modelo das velhas tecnologias - pechinchar, barganhar ao pé do ouvido - e, ao mesmo tempo usar um Tesla (novas tecnologias). Isso se chama harmonização, humanização. E, provavelmente, por isso, Lisboa seja uma cidade tão querida e desejava para se morar.

  Na complementariedade desses sistemas de transporte a população com maior poder aquisitivo adquire os veiculos com novas tecnologias da Renault, Piegeot, Mercedes, Toyata, Fiat, Citroen, numa oferta ampla de marcas. E, aqueles de menor poder aquisitivo usam bikes e patinetes - este último muito em moda - usado pelos locais e pelos turistas em sistema com uso de aplicativo pelos celulares. Detalhe: você pode deixar a patinete em qualquer lugar da cidade (não necessariamente numa base) assim que o seu tempo de uso pago for concluido.

 E, há, ainda, os ônibus para turistas com guias em três rotas operadas pelo Lisboa Sightseeing: a linha azul, a linha vermelha e a linha roxa. Com um único bilhete, você pode usar qualquer uma delas por 24h ou 48h, a depender da sua escolha. O valor sai por 26,50 euros (24h), ou 30,11 euros (48h).

 Vê-se, pois, que em Lisboa há 12 a 15 tipos diferentes de transportes onde se mesclam as novas tecnologias com as velhas e não existem sinais de que, os adminstradores públicos, queiram por fim aos bondinhos, o famoso elétrico.

  Essa situação é extensiva também as casas de fado, aos restaurantes, bares e tendas familiares onde os preços podem ser acertados via internet ou no pé do ouvido. Algumas casas de fado e restaurantes caseiros não recebem cartões e o pagamento tem que ser feito no efetivo. Parece estranho, mas é assim que funciona, na pechincha. E na Feira da Ladra com 750 anos de existência a pechincha corre solta. Já no Mercado da Ribeira - centro gastronômico mais imortante da cidade - só aceita pagamento em cartões.

 Assim posto, seria esse modo de vida tão singular que faz de Lisboa (e de Portugal) um país tão almejado pelos estrangeiros com poder aquisitivo elevado e/ou gorda aposentadoria para morarem? É provável que sim. Não há uma resposta única para esta questão, mas, certamente, esses pontos pesam e muito, levando-se em consideração, ainda, a paz de espírito, a não violência, a hospitalidade.

 Novas tecnologias convivendo com as velhas, significado e signicantge caminhando juntos, o Eu e o Outro próximos, os brasileiros amam Portugal e Lisboa, em particular. Já são mais de 100 mil vivendo espalhados pelo país e mais ingleses, norte-americanos e alemães. Mas, óbvio, não dá para todos e existe, também, a miragem, a perspectiva do não emprego, e, nem o mundo nem o Brasil, percentuais que fossem, 10% digamos, caberiam em Portugal. Do mundo, 10% da população seriam 800 milhões de pessoas; e do Brasil, 10% um total de 22 milhões de brasis. E Portugal, hoje, abriga 10 milhões de almas.

 Mais tantas milhões de almas por lá inviabilizaria essa harmonia. Nós, o mundo, é que temos que implantar os nossos modelos e não embarcarmos de cabeça na máquina usurpadora das novas tecnologias. Ela é voraz, devastadora, dinâmica, atroz, mas, pode ser parcialmente controlada para não sermos um mundo de robôs, simplemente.

  Tenho prazer ainda de assar uma picanha na brasa soprando o fogo com o ar dos meus pulmões.