Cultura

POETA SERAFIM ALVES DEFENDE LUBI COMO ESTAMPA NA NOTA DE 200 REAIS

Lubi vai arregimentar forças políticas para tentar conseguir o projeto que engrandecerá a Serrinha e o Brasil
Lubi da Serra , Bahia | 09/08/2020 às 07:33
Nota de 200 com o lubi
Foto: TFF
  O jornalista Tasso Franco publicou neste domingo a 19ª crônica em seu livro Lobisomem de Serrinha, a nuvem de fogo e o fim do mundo, uma recomendação do poeta Serafim Alves para que o lubi estampe a cédula de 200 reais a ser lançada pelo governo. Veja crônica abaixo. As demais você ler no aplicativo wattpad.

   POETA SERAFIM ALVES DEFENDE LUBI COMO ESTAMPA NA NOTA DE 200 REAIS


   Entrementes, a espera do café da manhã que estava sendo preparado pela Ester, ainda em pijama de quadros e usando sapatos de ourelo, eu a folhear as páginas do nosso pasquim semanal "A Clarineta do Tição" acomodado numa poltrona ao pé da lareira, o frio dos alpes serrinhenses cortante como fio de navalha Parker ao lado de fora, pois, já havia experimentado sua intensidade quando fui ordenhar Mimosa.

  Consegui, a custo, 9 litros de leite tremendo os ombros no curral, mesmo protegidos com a Colonial, a esposa a temperar o cuscuz com massa Tabajara da Porto Velho, o Zenerosa de Sêo Gilson perfumando o ambiente, preparava com o cortador Cohiba a ponta de um dominicano, quando o telefone fixo toca. 
A essa hora, ainda se aproximando das 8, para muitos cedo, mas, para nós, já com bom tempo de luz, atendo e ouço a inconfundível voz do poeta Serafim Alves.

   - Madrugaste, oh! vate iluminado do amanhã.

   - Tinha algo muito importante para lhe comentar, algo relevante, algo superior, daí a ligação.

   - Imaginei que a chikungunya tivesse piorado seu estado de saúde.

   - Estou melhor, poetizando o que posso e já dando passos lentos dentro de casa sem as muletas.

  - Alvíssaras. E que desejas o nobre bardo?

   - Sem muitos rodeiros para não tomar seu precioso tempo, analisando o noticiário da internet verifiquei que os técnicos do Guedes, o nosso Posto Ipiranga, estão com a possibilidade de lançar uma cédula de 200 reais e ouço que a estampa proposta para abrilhantar a nota seja um lobo guará. E que há gozações com a vira-lata caramelo.

   - E que temos nós com isso meu caro trovador?

  - Nada mais justo que V.Exa. o Lobisomem de Serrinha representando todos os lubis do Brasil seja o indicado para tal estampa, muito mais abrangente porque está em todo país, nos quatro pontos cardeais e é muito cultuado e querido do povo, da classe média e dos ricos.

   - Em parte, tens razão, mas falta-nos gabarito, coturno, nossa passada é miúda, vivemos no ostracismo, no oco do mundo, não teríamos como conseguir tal façanha.

  - Vamos mobilizar nossos amigos poderosos, o conselheiro Souza Todavia, meu colega poeta Mendes do Passé, doutor Zéu de Itaberaba, doutor Maurício de Tebas, doutor Alencar, doutor Augustus Abreu, veja que só aí falei em quatro doutores de escol, os jornalistas Bina Dourado e Vasconcelos de Valença, artistas, políticos, nossos senadores, nossos deputados, o Pereira, o Nelson, a da Mata, nossos homens em finanças, o Calmon de Sá, os Coelhos, os Mendonça, uma frente ampla com apoio do clero e da grande loja maçônica, parlamentares estaduais, o Pinto, o Galo, a Nunes, o Machado, o Leal, o Sanches, que teremos êxito.

   Nisso a Ester toca a sineta chamando-me para o café. 

   Peço desculpas por ter que encerrar a conversa. Serafim, na despedida, disse que mandar uns versos sem rima inspirado em Walt Whitman justificando a minha indicação para a estampa.

  Posto a mesa indaguei a Ester o que tínhamos de saboroso.

  - O de sempre. Cuscuz, ovos, café com leite, batatas doces cozidas e pão. E agradeça a Deus por tal fartura diante dessa pandemia do coronavirus.

  Benzi-me e estava a saborear o amarelo ouro do cuscuz com ovos remexidos quando o zap anuncia o poeta Serafim a mandar-me os versos. Ester azucrinou. 

  - Você agora vai tomar seu café, olhar minha beleza, conversar comigo, e não ficar perdendo seu tempo com esse poeta de meia tijela que nem rimar coração com pão sabe.

  - É importante o que o Serafim está a sugerir. Paciência, vejo mais tarde.

   - Mesmo sendo algo relevante deixe para depois salvo se for uma coisa que envolva sua pessoa, sua personalidade, amoleceu Ester.

   - E é, disse pondo leite na caneca.

  - Pois desembuche para mim e depois atenda o iletrado. 

   Narrei a Ester a sugestão do Serafim para o Lubi estampar a nota de R$200,00 e ela ficou entusiasmada. Terminado o serviço do café dirigi-me a poltrona, acendi o Don Diego Corona, baforei a primeira nuvem, passei as vistas mais uma vez no Clarineta e resolvi, então, ler o poema do Serafim sobre minha indicação à estampa.

   Exponho em prosa poética as razões pelas quais o Lubi deve, necessariamente, estampar a cédula de 200 reais.

  Porque sóis a representação das matas, da caatinga, do pantanal, dos pampas, do cerrado, do agreste, em tudo sóis um pouco e tudo/ Porque sóis o ouro, a prata, a bauxita, o minério de ferro, o aço, o manganês, o titânio, um pouco sóis em tudo, sóis, sóis/ Porque sóis os trabalhadores do campo, do comércio, dos serviços, das fábricas, dos transportes, dos hospitais, sóis um pouco de cada, no geral sóis/ Porque sóis os mares, os rios, as lagoas, as lagunas, os riachos, as cachoeiras, os açudes, sóis parte de cada um, um pouco sóis de tudo/ Porque sóis a metafisica, a psicologia, a matemática, a medicina, a engenharia, a arquitetura, sóis uma partícula de cada, sóis integrais/ Porque sóis a riqueza, a pobreza, a classe média, as minorias, os desamparados, os devedores, dos adimplentes, sóis uma parcela deles, de cada sóis/ Porque sóis o branco, o negro, o índio, o amarelo, o mameluco, o pardo, o curiboca, o sarará, sóis todos eles num só.

  E em sendo justo, adequado, próprio, pertinente, sobranceiro, sua indicação é perfeita para a nova cédula de 200 reais/ Será, quiçá, uma nova moeda, o lubi, assim são o dólar, a libra, o peso, o ien, a libra, o euro, nos ombreando com o mundo/ Nos dignificará, nos elevará aos píncaros do Monte Olimpo, ao Himalaia, aos Andes, a Agulhas Negras em grandeza e poder. (Sem mais, por enquanto, versos a completar, do amigo S.A).

   Meditava, baforava o corona a flutuar em pensamentos na poltrona quando retorna a Ester do quintal com um cesta repleta de ovos.

  - Estás delirando, pergunta-me.

  - Meditando, meditando. Acabei de ler os versos em prosa do poeta Serafim e vejo que tem muito sentido minha indicação para estampar a cédula de 200 reais.

   - A causa pode ser nobre, mas, versos desse poeta do amendoim, esse Serafim sem rimas, sem métricas, "burro" como diz sua neta Sol, vai é derrubar sua pretensa indicação que acho, justa e meritória, empoderou-se Ester abraçada a cesta de ovos. 

  - Estou a pensar, Ester, solicitei um curto café Colombia para temperar o Don Diego, como será importante para nossa Pátria, vede que o governo está a pagar 600 reais aos desassistidos pela pandemia nas filas da Caixa e com nossa estampa desembolsaria apenas 3 lubis.

   Ester admirou-se. Colocou a cesta de ovos sobre a mesa e aproximou-se para inteirar-se da grandeza do ato.

  - Veja, preciosa Ester, 1 dólar vale 5.3 reais. Com a nota do lubi viramos o jogo e 40 dólares, sim, digo para você gravar bem, quase 40 dólares valerão 1 lubi. Que magnífico. Com 50/6- lubis iremos passear em Mendonza que você tanto deseja.

   Ester entusiasmou-se. Bebericava um xerez. Já dizia que Serafim era um bardo do nível de Drummond, de Castro Alves, de Poe, e afirmava com a voz embargada: - Ligue para ele, que complete os versos em prosa de sua apresentação e vamos tocar o projeto à frente.