Cultura

VIDA DE GORDO: A chama olímpica de Jeffinho é no fifó, p/ OTTO FREITAS

Salvador fez festa à moda da casa para receber a tocha olímpica.
OTTO FREITAS , Salvador | 28/05/2016 às 12:07
Prentes de Jeffinho no interior da Bahia e a tocha 'olimpica' do fifó
Foto: DIV

Há muito as torcidas do Bahia e do Vitória sabem disso: desde a sua fulgurante adolescência, Jeffinho jamais foi um modelo de atleta, muito pelo contrário. Enquanto seus colegas de ginásio disputavam as Olimpíadas da Primavera, ele se dedicava à iniciação em botecos, experimentando batidas de fruta e tira-gostos no Barcaça, primeiro bar da Penha, na Ribeira. 

Se outros preferiam tocar tambor na fanfarra da escola, ele se jogava nas serenatas e brincadeiras com as meninas. Em babas de rua ou da quadra do colégio, era um lateral direito perna de pau, sem cintura ou controle de bola, mas chegava junto na dividida - isso quando jogava, pois era sempre desprezado pelos times e acabava no gol ou como juiz sem conhecimento técnico e autoridade.
 
Jeffinho tornou-se, então, um adulto sedentário, medalha de ouro, com louvor, em competições tradicionais como levantamento de garfo e copo. Nessa honrosa condição de atleta de bar e sofá, está fazendo a contagem regressiva para as Olimpíadas do Rio de Janeiro. 

Enquanto passam os dias, o gordo vai levando a chama olímpica no seu fifó - aquele velho fifó de lata, verdadeira garantia de luz para todos nos rincões mais pobres do Brasil rural. Fantasia sobre os esportes dos quais poderia participar, não fosse tão obeso e paradão. 

Pena que o sumô, compatível com o seu tamanho, não está entre as modalidades olímpicas. Tem outras lutas para quem está muito acima do peso, mas sumô, o esporte nacional do Japão, não tem. 

Esgrima tem, mas seria esparro para Jeffinho, pois se trata de um esporte que exige agilidade e corpito de agulha. O gordo tornar-se-ia (como diria o Dr. Michel) alvo mais fácil para seus adversários do que o sargento Garcia para o Zorro.

                                                                            @@@@@@

Sem alternativa, Jeffinho acompanha o roteiro da chama olímpica pela TV: a tocha virou praticamente uma entidade no Brasil; tem mais prestígio do que os dois presidentes da República juntos - o afastado e o em exercício. 

É uma adoração inconsciente e exagerada. Diante de tanto desencanto, talvez o povo sinta falta de ter alguém para chamar de seu e corre atrás da tocha, mesmo sem compreender direito os próprios motivos. 

Na Bahia, o fogo entrou pelo sul. E como tudo aqui vira festa, quando chegou a Salvador foi logo se aquecer ainda mais, com umas doses de cravinho e o batuque do Olodum no Pelourinho. 

Depois saiu pelo Centro Histórico e desceu para a Cidade Baixa. Na igreja do Bonfim, foi uma recepção à moda da casa, com baianas estilizadas e o velho afoxé Filhos de Gandhy, famoso arroz de festa afro-baiano. 

De tarde a tocha passou pela orla marítima e seguiu para o farol da Barra, onde teve show de rock, axé e pagode. Já era noite quando a chama encerrou sua passagem por Salvador, atravessando o Dique do Tororó, sobre as águas de Oxum. 

Dia seguinte a tocha seguiu viagem, se sacudindo toda, com os dedinhos para cima e a chama atiçada de batuque, cachaça e dendê. Mas o verdadeiro e puro espírito olímpico não baixou por aqui, nem mesmo nos terreiros de candomblé.