Cultura

POEMA DE LIVIA NATÁLIA é censurado pelo governo após repercussão

Deputados dizem que poema agride a PM
REDACION , Salvador | 15/01/2016 às 15:41
Poetas protestam contra a censura
Foto: DIV
    Depois que os deputados José Carlos Aleluia (DEM) e sgt Isidório criticaram o texto do poema “Quadrilha”, de Lívia Natália, integrante do projeto “Poesia nas Ruas”, aprovado pelo Fundo de Cultura do Estado da Bahia, o poema foi censurado pelo governo e deixou de ser veiculado.

   O “Poesia nas Ruas” tem também poemas de Nelson Maca, Alex Simões, Mel Adún. Os versos de Livia foram estampados em outdoors na cidade de Ilhéus, sul da Bahia. O poema de Lívia também recebeu críticas da Associação dos Policiais e Bombeiros Militares do Estado da Bahia (Aspra), e o outdoor foi removido, segundo o site Bahia Notícias.  

   A censura gerou manifestações de apoio à professora Lívia Natália nas redes sociais, sites e blogues. A poetisa desabafou no Facebook: “Este é mesmo o País que se diz fora do regime militar e sem censura? Eu e as pessoas que fizeram o projeto Poesia nas Ruas tivemos o nosso direito à liberdade de expressão vetado!”

  O poeta Jorge Augusto, em matéria no site Bahia Notícias, analisou o poema: “O poema propõe pensarmos a subjetividade interditada desse corpo negro, (quando rompe a cadeia amorosa que remete a intertextualidade com o poema de Drummond), sinaliza o abandono em que, muitas vezes, é condenada a mulher negra, denuncia, ao mesmo tempo, a violência com que a PM pratica seu genocídio contra o povo negro. É o amor, a subjetividade desse ser-negro, pensado, pelo Estado, sempre como um corpo suspeito que é tema. Maria não teve tempo de amar João. E o assassinato pela PM é apenas uma das formas pela qual essa subjetividade do negro brasileiro foi interditada, pela violência, e o poema usa dela para denunciar essa interdição, esse amor que não chegou a ser”. 

   Valdeck Almeida de Jesus, jornalista e poeta, postou em seu perfil no Face: “Meu apoio público a Lívia Natália e ao poema. Nada a retificar. Interditar o outdoor é interditar a livre expressãoE o poema não diz nada diferente do que as estatísticas já dizem há muito tempo. Ratifico o artigo do professor Jorge Augusto. É necessário que todos nós, poetas, escritores, artistas em geral, nos manifestemos contra a retirada do outdoor com o poema de Lívia Natália.”

   O projeto Fala Escritor postou “Eu apoio Lívia Natália! Vamos mostrar a força que a poesia, a literatura e a cultura baiana têm contra a truculência da PM. Cada um vai marcar cinco poetas ou pessoas ligadas à poesia, à literatura e à cultura, compartilhando essa postagem. Censurar Lívia Natália é censurar a poesia baiana. Compartilhem.”


Aqui o poema:

“Quadrilha

Maria não amava João. 
Apenas idolatrava seus pés escuros.
Quando João morreu,
assassinado pela PM,
Maria guardou todos os sapatos.”

(“Correntezas e Outros estudos Marinhos” (Editora Ogum's Toques Negros, Salvador-BA, 2015).

Resta a todos nós lutarmos contra esta censura. Com a palavra: escritores, poetas, jornalistas, ativistas culturais, pesquisadores, professores, mediadores de leitura, grupos e coletivos culturais, associações, academias de letras e o povo em geral