IMPRENSA:VIDA E MORTE DO JORNAL TABU DE CANAVIEIRAS, p WALMIR ROSÁRIO

WALMIR ROSÁRIO
07/05/2020 às 11:21
O ditado “se vira nos trinta”, que ficou famoso por ter sido um quadro do programa Fausto Silva (Faustão), na Rede Globo, explicar muito bem o árduo trabalho de editar e imprimir um jornal no interior. Pra começo de conversa, os pomposos títulos profissionais – quando existem – servem apenas para engrossar o expediente. O editor, por exemplo, tinha e tem que ser repórter, apurador, copy desk, revisor, diagramador, vendedor, e como não poderia deixar de ser: editor.

   E os jornais têm os seus colaboradores – uma verdadeira mão na roda – que trazem informações e artigos, publicidade e por aí afora. Não foi diferente em Canavieiras naquele 25 de maio de 1968, Dia da Cidade, quando circulou pela primeira vez o Tabu. E já baixou “saravando”, dando o que falar, como queria seu editor por 50 anos, Tyrone Perrucho, admirador do ditado “falem mal, mas falem de mim”.

   Em 25 de abril de 2018, conforme tinha prometido Tyrone, o Tabu circulou pela última vez em papel. Reclamava do cansaço de anos de trabalho e pretendia se libertar de vez. E tinha razão, afinal, estava aposentado da antiga Divisão de Comunicação da Ceplac há 24 anos e ainda batendo o ponto no Tabu. Em tempo de serviço só perdia para o ex-técnico do glorioso Sport Club Ypiranga de Camacan, Antônio Ribeiro de Castro (Santinho), que permaneceu no cargo por mais de 53 anos, sempre prestigiado pela direção e torcida.

   Passados dois longos anos sem circular, os saudosistas arranchados no Grupo “Apaixonados por Canavieiras”, promotor do resgate da história da cidade, resolveram fazer uma live no Facebook para lembrar e tirar a limpo algumas histórias contadas pelo Tabu. Para começar, recordaram de vários arranca-rabos da política e algumas indiscrições, como a de prefeitos que diziam renegar o jornal, embora constantemente tenham sido flagrados lendo-o às escondidas.

   Concebido para exercer o jornalismo paroquiano em 90 % das notícias, se algum evento nacional ou estadual fosse digno de merecimento seria incluído nas páginas de o Tabu, caso contrário Canavieiras, Santa Luzia, Camacã, quiçá Ilhéus e Itabuna seriam prestigiadas em suas páginas. Editorias variadas, seu conteúdo era o fato, devidamente esmiuçado na figura do “quem”, e que seria o alvo de polêmicas mil.

   Uma das editorias mais temidas por uns e objeto de chacotas por outros, Calhau ocupava uma página inteira de notinhas políticas e mundanas, elaboradas com muito esmero e uma narrativa com mil interpretações nas entrelinhas. Do comportamento de boêmios pelos bares e lupanares até as pesadas publicações do Diário Oficial do Município nada escapava aos olhares do editor do Calhau.

   A cada edição quinzenal, a redação do Tabu recebia uma comissão de pessoas indignadas com a ultrajante notinha. Não raro, era um padre que pulava o muro, um rapazote que aparecia com trejeitos, uma invasão conjugal, um deslise na tesouraria municipal. E não raras vezes essas interpelações eram feitas nas ruas, em bares e outros lugares públicos, como demonstração de força por ameaças, embora todas teriam respostas publicadas no próximo Calhau com o devido estilo ferino do editor.

   Não disse ainda, o que farei a seguir, que o Tabu nasceu da vontade de alguns jovens canavieirenses inquietos, como Tyrone Perrucho, e uns funcionários do Banco do Brasil (Durval França Filho – hoje historiador, Antônio Tolentino, Raimundo Tedesco, dentre outros, que geralmente assinavam matérias. As mais picantes não levava o nome dos autores, o que gerava dúvidas atrozes nos leitores.

   O cinismo era uma marca registrada dessa turma, que a cada questionamento sobre a autoria colocava a culpa – se é que tinha – em outro, criando mais celeuma sobre o verdadeiro pai da criança. Tanto foi assim que o maior número de perguntas enviadas durante a live realizada pelo “Apaixonados por Canavieiras” foi sobre a autoria do Calhau, finalmente confessada em público pelo próprio Tyrone, rompendo os 50 anos de anonimato.

   Certa feita, por falta de notícias alvissareiras, o ainda jornalista Tyrone nomeia uma comissão de alto nível para analisar o projeto Viva Jaqueira, que pretendia preservar a memória mundana de Canavieiras. Se reunirem em plena segunda-feira pela manhã num bar da cidade, sob o pretexto pesquisar e revigorar os bregas antes existentes na rua da Jaqueira, famosa pela quantidade de lupanares, nos quais somente se adentrava se trajando terno, gravata e chapéu.

   Reportagem principal do Tabu, o Viva Jaqueira ocupou a página cinco por inteira, com direito a manchete principal na primeira página. Foi um auê. Uma conhecida senhora da sociedade, moradora da antiga rua da Jaqueira (hoje Barão de Cotegipe) se encheu de coragem e interpelou o jornalista com altivez. 

  – Quer dizer, seu Tyrone, que o senhor pretende voltar a transformar minha rua num brega, como era antes?

   O jornalista desconversou, disse que não era bem assim e escapou de novas cobranças.

   Outra inconfidência foi a descoberta da autoria do colunista mundano e autor do horóscopo proibido Carlos de Carvalho, também o mesmo Tyrone Carlos de Carvalho Perrucho. 

  Em relação às cobranças sobre a volta da circulação de o Tabu, Tyrone Perrucho negou a possibilidade, porém garantiu que em 25 de abril de 2068 promoverá uma festa de arromba para comemorar os 50 anos da decretação da morte do brioso jornal. 

  Há quem acredite!