LEMBRANÇAS de João Ubaldo e da velha Bahia mundana

Tasso Franco
19/07/2014 às 10:12
A morte de João Ubaldo Ribeiro pegou todo mundo de calça curta. Ninguém esperava assim tão de repente. Parece até coisa de um dos seus inúmeros personagens. Mas, faz parte da vida. Há dois ou três anos visitei-o num quarto de hospital, em Salvador, depois de um susto que levou no veraneio na Ilha de Itaparica. Estava proibido de beber bebidas alcoólicas, mas, ainda fumava muito. - Teimo com o cigarro, me dizia.
 
   Ora, o jornalismo boêmio dos anos 1950/1970, em Salvador e no Brasil, era quase uma exigência beber e fumar. Muito. Nada era pouco. Quando cheguei no Jornal da Bahia, na Barroquinha, em 1968, ai daquele que não fosse ao Cabelinho e ao Cacique, não dancasse no Rumba e no Tabaris. E cantasse, entrasse noite à noite à beira de um violão, que poderia ser de João da Matança, de Rui Espinheira, de Tonicão ou de outro qualquer violeiro. 

   João Ubaldo Ribeiro era de uma geração um pouco mais velha do que a minha, de Joca, Zé Maria, Florisvaldo, Bananeira, Sobral e outros. Era cronista com Satyricon, no JBá. Nós éramos repórteres, ainda "focas", iniciando.

   Depois a roda do tempo foi passando, Ubaldo se envolveu com a publicidade, montou uma agência, mas, nunca deixou o jornalismo e chegou a Tribuna da Bahia como editor. Nas horas vagas tocava trumpete. A gente dava era risadas.
 
   Em 1976, eu editor chefe do Diário de Noticias, voltamos a nos encontrar na ABI, Afonso Maciel Neto como presidente e nós como diretores, eu, David Raw e Arthur Couto e participavamos de tertúlias e almoços. Evidente que regrados a uisque.

   Nunca fui amigo de João Ubaldo, na acepção da palavra, de nos encontramos com frequência e coisas do gênero. Tomamos alguns gorós juntos por conta do jornalismo.

   Depois ele viu que a Bahia já tinha lhe dado régua e compasso e foi morar no Rio de Janeiro. Ficamos órgãos do parceiro de boemia e do escritor. Ubaldo se transformou num personagem nacional, o maior escritor da Bahia pós Jorge Amado. Era amigo de Jorge e o admirava muito.Alguns personagens de Ubaldo se parecem muito com os de Jorge. Como não! São a Bahia, a cara da Bahia, a alma da Bahia.

   A Rede Globo, que de boba não tem nada, apadrinhou Ubaldo em sua telinha e ele chegou a todos os rincões brasileiros. Ficou famoso, mas, nunca deixou de ser o João da Bahia, João de Itaparica, o João apreciador de Old Eight. Suas crônicas no Buteco do Leblon mostram bem essa sua característica.

   Voltamos a nos ver com alguma frequência no inicio e meados deste século quando a Prefeitura de Salvador resolveu lhe prestar uma homenagem, no Carnaval de 2004, com o tema Viva o Povo Brasileiro. Roteirei com Eliana Dumet o tema carnavalesco. Imbassahy, então prefeito, aprovou tudo, nós que já tínhamos homenageado Jorge Amado com o Carnaval da Tieta.

   A dúvida era se Ubaldo viria ou não para o Carnaval. Nunca gostou de exposição. Mas ele veio. Foi uma maravilha e ele gostou muito. O Carnaval em que Daniela Mercury encantou em Maimbê Dandá.
Nessa época, Ubaldo me dizia: - Pôxa não conheço mais ninguém em Salvador. Até os lugares que eu ia desapareceram.  

   De fato, Ubaldo pouco vinha Salvador. Todos os anos passava suas férias na Ilha de Itaparica, terra natal, terra de Ubaldo Osório, seu avô, local que adorava e eternizou seus personagens, sobretudo Zeca Comunista.

   Então, voltamos a nos ver com mais frequência, a cada verão, quando Claudio Neves foi prefeito da ilha e com Eliana Dumet comemorava-se o aniversário de João com toda pompa, em praça pública, com seus personagens em cena, desde o Caboco Capiroba ao Negão.

    Antes, passávamos na casa de Ubaldo pra prosar. Dar risadas e ele contar seus casos e lembranças. Nos últimos anos, só bebia guaraná.

    Pronto, lá se foi Ubaldo e ficamos nosotros com essas lembranças de tempos que não voltam jamais, mas, que estão registrados para sempre.