CARNAVAL DE MARAGOGIPE: Um passo atrás

Luis Carlos Brasileiro
17/02/2013 às 18:58
Não pretendo aqui abordar as atitudes da atual gestão municipal para com o nosso Carnaval dentro da ótica da preferência partidária, mas sim apegando-me à uma avaliação técnica e, sobretudo, ao forte sentimento do “ser” maragojipano.

O comentário abaixo é um pouco longo, porém bastante informativo e esclarecedor sobre a “Polêmica do Carnaval 2013”.

Classifico a postura desta administração municipal como imatura e mesquinha em todas as situações envolvendo suas decisões sobre a organização/planejamento do Carnaval que é reconhecido pelo Brasil e pelo mundo como patrimônio cultural, construído e amado pelo povo de Maragojipe.

Foi evidente a falta de compromisso e até de sensibilidade em prestigiar uma das manifestações culturais mais importantes da nossa gente.

Em momento algum foi observada a sua preocupação em antecipar o procedimento de organização do Carnaval, que somente foi tratado a partir de 10 de janeiro [menos de 01 mês para o início do evento].

Desprezou-se inclusive o processo de transição que se iniciou na primeira semana de dezembro último, não se oficializando, em momento algum, a transferência de informações entre gestões. Houve somente uma abordagem informal com o antigo secretário de cultura e turismo, no qual passou as informações dos preparativos do Carnaval 2013 verbalmente.

Prevendo-se, por diversas circunstâncias, a dificuldade de captação de recursos para o evento, a antiga gestão mobilizou-se em conjunto com a AMMA – Associação de Músicos de Maragojipe, a fim de assegurar investimentos básicos, principalmente para a valorização das manifestações culturais e promoção do mesmo.

Nesse contexto, foram articulados cerca de 510 mil reais – 330 mil através do IPAC, 100 mil pela Petrobrás S/A e 80 mil pela Bahiatursa.

Em certo momento, a prefeitura reagiu como se a AMMA fosse sua inimiga, criando diversas situações de instabilidade e provocando intrigas, inclusive, ameaçando não realizar o próprio Carnaval.

Representantes da AMMA, temendo o risco do Carnaval de 2013 não existir - o que poderia acarretar numa grande perda de referência do evento como produto cultural e turístico - propôs uma construção conjunta do evento, mas a prefeitura insistia em deter toda a gerência sobre os citados recursos, sempre ameaçando não realizar o evento.

Foi cedida à prefeitura a gestão dos 80 mil reais patrocinados pela Bahiatursa [que se constituiu na contratação das bandas Paulinho Boca de Cantor, Motumbá e Walter Queiroz, além do patrocínio de 100 mil reais da Petrobrás, o qual não foi concretizado, desconhecendo-se os motivos.

Mesmo assim, a prefeitura ainda insistia em abocanhar os 330 mil reais do IPAC, propondo deixar de investir em atividades de valorização e difusão cultural, para investir na contratação de estrutura para o evento [sanitários químicos, segurança, palco, som, etc].

Vendo a impossibilidade legal de se fazer isso, a prefeitura acionou o Ministério Público, como forma de pressionar os representantes da AMMA em ceder recursos para suprir os interesses da prefeitura.

Em paralelo, houve o fatídico episódio da retirada dos out doors de promoção do Carnaval, previsto no convênio do IPAC, de forma extremamente arrogante e prepotente – as mesmas placas serviram recentemente para a promoção pessoal da atual gestora.

Por último, foi ajustado, sob a autorização do IPAC, o Plano de Trabalho do respectivo convênio, incluindo-se a locação do Palco Principal, com som, iluminação e gerador. Diminuiu-se o valor da decoração [prevista no convênio somente para a Praça Conselheiro Antonio Rebouças] de 40 mil para 26,5 mil reais. No ano passado, o valor investido na decoração do evento – elemento considerado fundamental para a conotação do Carnaval – foi de cerca de 110 mil reais.

Em 2012 foram investidos no Carnaval de Maragojipe aproximadamente 940 mil reais, sendo 40% desse montante de recursos da prefeitura municipal. Foi o maior investimento que o evento já teve em toda a sua história.

A previsão para 2013, levando-se em consideração toda a importância que o Carnaval tem como produto cultural e turístico, estava fixada em cerca de 1 milhão e 300 mil reais [orçamento compatível com o Carnaval do Pelourinho, promovido pela Governo do Estado], sendo a sua maioria em patrocínio, porém somente foram investidos cerca de 500 mil reais, sendo 330 através do convênio AMMA-IPAC e 80 mil da Bahiatursa.  Neste caso, a AMMA/Governo da Bahia foram responsáveis em bancar quase 80% do evento.

A gestão municipal, em todo o episódio, alegava a falta de recursos como fator impeditivo para a realização do Carnaval, porém, entre 01 de janeiro e 10 de fevereiro de 2013, a prefeitura de Maragojipe acumulou em suas contas correntes mais de 5,8 milhões de reais em valores líquidos, sendo 2,2 milhões somente da cota do FPM, segundo o site www.bb.com.br – Demonstrativo de Distribuição da Arrecadação aos Municípios Brasileiros e outras fontes.

O Carnaval vinha alcançando, a cada ano, um crescimento considerável, em todos os aspectos, mas, em 2013, de forma bastante perceptível, esse mesmo Carnaval deu um passo atrás.

Foram detectados diversos problemas estruturais/organizacionais de elementos estratégicos como preparação/interação com o receptivo e serviços turísticos, promoção mais ampla, iluminação pública ineficiente, pouca segurança, diminuição dos circuitos do evento, ausência de atrações musicais de referência da cultura carnavalesca baiana e brasileira, inexistência do Grito do Carnaval – com seus tradicionais concursos de marchinhas e escolha do Rei Momo e da Rainha do Carnaval, que no ano passado teve a transmissão ao vivo da TVE -, além da instabilidade grada pela indecisão e ameaça da prefeitura em não realizar o Carnaval, provocando desânimo na população.

O poder público foi bastante omisso e irresponsável em todo o processo. Digo, sem exageros, que sua participação foi patética. Provocou um processo de involução do Carnaval.

A “falta de brilho” da festa Momesca maragojipana foi percebida amplamente pelo povo e pelos comerciantes, foi percebida pelos turistas e visitantes.  Foi sentida em todos os corações.

Mas, mesmo diante de todo esse impasse, o povo maragojipano foi guerreiro, preenchendo as ruas com sua alegria e suas fantasias.

Perante toda essa “novela”, fica uma grande lição: não se brinca com o povo, não se menospreza seus sentimentos, suas emoções e expectativas.

O reflexo de tudo isso é o alto grau de rejeição que a atual gestão acumulou nesse pequeno período – há menos de completar dois meses de existência. Um recorde!
É necessária uma reação consistente e consciente a esse fatídico episódio da história cultural maragojipana: primeiro, o poder público municipal não é “dono” do Carnaval, ele é do povo – a prefeitura tem o papel importante de ser ordenadora do evento, cuidar das estruturas necessárias para garantir conforto e segurança ao público e assegurar meios para os investimentos nas políticas públicas de cultura; segundo, é necessário um pleno amadurecimento nas relações institucionais com os segmentos que fazem o carnaval: associações, grupos culturais, artesãos, produtores culturais, além dos empresários do ramo do turismo [hotéis, pousadas, bares, restaurantes e outros]. As instituições e segmentos precisam ser respeitados, independentes e fortes, o que fortalece o próprio evento, visto que o poder público não é onipresente e tem grandes dificuldades em atender a todas as demandas do evento; e terceiro, torna-se, mas do que nunca, importante a criação de instrumentos que democratizem as decisões sobre a realização do Carnaval [isso é por demais estratégico], como Estatuto e Conselho do Carnaval, já que esses episódios lamentáveis, de indecisão e falta de compromisso do poder público municipal, geraram elevada insatisfação na população e em toda a cadeia produtiva do evento, acarretando grandes prejuízos ao município [cultural, social, econômico e moral].

Num Carnaval menos brilhante e mais inseguro, faltaram as iniciativas concretas para continuar em fazê-lo um elemento de destaque do povo maragojipano para o Brasil e o mundo [para Jorge Portugal e Spike Lee] e sobraram arrogância, bacalhaus e abacaxis – trocadilho à parte, espero que tudo isso não se transforme num enorme abacaxi para o nosso povo.

 

LUIZ CARLOS BRASILEIRO DE ANDRADE